sexta-feira, 27 de julho de 2012

O lulismo e os salários federais

O Estado de S. Paulo - 26/07/2012
O governo federal vai inflar de novo os gastos salariais, com aumentos generosos para professores das universidades e também para servidores do Executivo. Mais uma vez a presidente Dilma Rousseff recuou, depois de tentar, por um breve período, exibir uma imagem de austeridade. Agravou-se a crise internacional, a economia brasileira está em marcha lenta e a previsão da receita fiscal foi reduzida. Todos esses fatos bem conhecidos e inegáveis tornam aconselhável um manejo muito cauteloso das finanças públicas. O governo tentou argumentar com base nesses dados, mas sem sucesso. Acostumado à política de mão aberta do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o funcionalismo civil - incluído o pessoal das universidades - rejeita qualquer ideia de parcimônia governamental.
O movimento dos professores é apenas o mais barulhento. Também há paralisação em outros setores da administração, com elevados prejuízos para empresas e para os cidadãos pagadores de impostos. A operação-padrão da Receita Federal e a greve do pessoal da Anvisa têm dificultado seriamente a liberação de mercadorias em portos e aeroportos e até a movimentação de navios recém-chegados ao Brasil. Empresas recorreram à Justiça e conseguiram liminares para facilitar a liberação de mercadorias em alguns portos.
O governo propôs aos professores, inicialmente, um reajuste salarial escalonado a partir de 12%. Diante da resistência dos grevistas, a presidente autorizou uma proposta muito mais amigável, com variação de reajustes entre 25% e 40%. O governo conseguiu resistir pelo menos à pretensão de mudança no plano de carreira. O esquema em vigor, já muito generoso, deve ser mantido. Pelas regras atuais, um docente federal pode chegar ao quarto nível, o de professor associado, sem mestrado ou doutorado. Só o quinto e último nível, o de professor titular, é reservado a doutores. Na Universidade de São Paulo, nem o doutorado permite o acesso à posição de professor associado. É necessário passar por mais um exame, o de livre-docência.
O governo deve ceder ainda mais para pacificar o funcionalismo. Segundo fontes da administração federal, um aumento linear para servidores de categorias básicas do Executivo será proposto nas próximas semanas, provavelmente depois da apresentação de mais um pacote de estímulos econômicos. O benefício, de acordo com a primeira informação, será destinado preferencialmente a categorias com vencimentos "mais achatados". Falta ainda conferir se as demais categorias aceitarão um aumento restrito a alguns grupos. Afinal, o funcionalismo foi acostumado, durante longo tempo, a uma farta distribuição de vantagens salariais.
Entre 2003 e 2011, a despesa média com os funcionários ativos do Executivo federal aumentou 123,2%, em termos nominais, enquanto a inflação chegou a 52%. Houve, portanto, um enorme ganho real para os servidores, muito maior que o obtido no setor privado pela maior parte das categorias profissionais. O crescimento da despesa total foi maior porque houve contratações e o número de funcionários passou de 809,9 mil em 2002 para 984,3 mil em 2011.
O governo enfrentará dificuldades muito sérias, no próximo ano, se a economia crescer menos que o previsto e a arrecadação federal decepcionar. Essa hipótese é perfeitamente razoável, apesar das projeções de reativação econômica neste semestre e de expansão do Produto Interno Bruto (PIB) igual ou superior a 4% em 2013.
Em junho, a arrecadação de impostos e contribuições - R$ 81,1 bilhões - foi 6,5% menor que a de um ano antes. Pouco antes de divulgado esse número, o Ministério do Planejamento havia anunciado uma nova revisão, para baixo, da receita estimada para 2012. Ao mesmo tempo, foi oficializada a nova projeção de crescimento econômico - 3% em vez dos 4,5% anteriormente calculados. O Banco Central, menos otimista, prevê 2,5%. Mesmo com perspectiva de alguma reativação econômica, muito mais prudente seria evitar novos aumentos de salários. Mas a prudência é posta em xeque por dois fatores - os interesses eleitorais e o peso da herança lulista, ainda dominante em Brasília.

quinta-feira, 26 de julho de 2012

Economia chinesa faz 'pouso suave', diz FMI

Valor Econômico - 26/07/2012

A economia da China está realizando um "pouso suave", mas ainda há riscos significativos, avaliou o Fundo Monetário Internacional (FMI) em relatório divulgado ontem. "A economia da China parece estar procedendo a um pouso suave, mas as turbulências globais estão aumentando", de acordo com o relatório do Fundo.
O yuan, na avaliação do FMI, continua "moderadamente subvalorizado" em comparação a outras moedas, embora o Fundo tenha ressalvado que essa subvalorização foi reduzida.
O FMI comentou também que o governo chinês deve realizar reformas no sistema financeiro de forma a assegurar opções de investimento aos consumidores fora do setor imobiliário. "Eliminar o potencial de bolhas no mercado imobiliário requer reformas que canalizem as poupanças das famílias, do setor de habitação para outros tipos de ativos financeiros", avalia o FMI.
Segundo Il Houng Lee, principal autoridade do Fundo na China, o país já não precisa acelerar suas medidas de estímulo monetário ou aumentar os gastos, porque as ações em vigor no momento são suficientes para dar suporte ao crescimento do país. Para ele, as autoridades vão provavelmente manter o "status quo", após já terem alterado sua política monetária para um nível "mais neutro ou acomodativo".
Os comentários de Lee refletem a confiança do FMI de que a expansão da economia chinesa se acelerará no segundo semestre. Porém, na semana passada, o Fundo havia cortado suas estimativas para o PIB da China.
O governo do premiê Wen Jiabao promoveu dois cortes de juros em um mês e acelerou a aprovação de planos de investimentos para reverter seis trimestres de desaceleração seguidos na segunda maior economia do mundo.
"De maneira bem ampla, o que eles [o governo chinês] têm feito tem sido adequado para assegurar que a economia está se recuperando", disse Lee.

Permanece o mito de que os servidores públicos são mal pagos. Trata-se, obviamente, de uma piada.

Comentários: De fato existe uma questão que pulverizou-se pela sociedade. Parece uma espécie de demagogia maquiada. Não resta dúvida que existem classes que sofrem com disfunção salarial, como alguns servidores estaduais de Sergipe de nível técnico que possuem acima de 20 anos de serviço ou os motoristas do SAMU, seus salários sequer atingem o mínimo vigente, seja por falta de estruturação de carreira, seja por falta de competência do governo ou por defasagem não observada dos gestores. Para esses é valida a luta, a reinvidicação e a disputa por melhorias e adequações.
Ocorre que, na esteira de exemplos como esses milhares de servidores públicos como professores universitários, servidores do judiciário, etc, adentram na seara das questões salariais com as mais absurdas alegações. Veja, não estou discutindo merecimento. Por merecimento todo mundo merce ganhar mais, sobretudo professores, médicos, enfim. Mas um professor que ganha R$ 8 mil reais iniciais acha ruim?! E o servidor público, que tem os maiores salários do país pleitea aumento de 53%?! Parece piada de mau gosto! É muita grana e muita gente querendo se aproveitar.
A greve, que deve ser instrumento último de reinvidicação, está sendo o 1º.
Por fim, todas as classe tem o direito de lutar por melhores salários, condições de trabalho, etc, mas nós, contribuintes e que pagamos a conta, temos também o direito de discordar.
Os sindicalistas dizem que há 350 mil servidores federais em greve. Talvez seja menos. De todo modo, são milhares. A negociação com o governo tem um aspecto um tanto estranho. Parece não se tratar de uma relação entre partes distintas. Ao contrário até: os líderes se referem a Dilma como alguém da turma que os estivesse traindo ou falando, de súbito, uma linguagem estranha: a das contas públicas. Sabem o que é isso? Boca torta pelo uso do cachimbo. No governo Lula, era pedir e levar. Em alguns casos, levavam até sem pedir. Em nove anos de petismo, a despesa média por servidor, informou ontem o Globo Online, cresceu 120%. A inflação do período foi de 52%. Brasília já tinha a renda per capita mais alta do país antes disso. Depois então… Mesmo assim, permanece o mito de que os servidores públicos são mal pagos. Trata-se, obviamente, de uma piada.
Enquanto as vacas estavam gordas, luzidias, Lula ignorou o impacto sobre as contas públicas e abriu as burras do dinheiro. Frequentemente, os gastos cresceram mais do que a economia e do que a arrecadação. Mas chegou o inverno, o pasto está seco, e não há mais a cornucópia de dinheiro. Ocorre que a clientela está mal acostumada e pretende manter o ritmo dos ganhos reais — como vocês viram acima, aquilo é ganho real.
Então aparece a pobre ministra Miriam Belchior — digo “pobre” porque é aquela obrigada a falar de dinheiro, do desembolso mesmo — para afirmar que não há grana para alimentar as reivindicações. “Desde 2003, houve aumentos reais em todas as categorias. Estamos refazendo todas as nossas contas diante do agravamento da crise internacional e esperamos que até o início de agosto tenhamos o cenário das propostas que possam ser atendidas. A soma das demandas é de R$ 92 bilhões, ou 50% da folha atual, 2% do PIB e o dobro do PAC deste ano. Isso indica, com clareza, que é um número que não é factível de o governo atender”, quase implora Miriam. Ninguém quer saber. “Tivemos um conjunto de reestruturações de 2008 a 2010. Só no Poder Executivo civil, o impacto foi de R$ 35,2 bilhões”, lembra o secretário de Relações de Trabalho no Serviço Público, Sérgio Eduardo Arbulu Mendonça. Dão de ombros pra ele.
A greve não esta sob o comando da CUT, mas de setores à esquerda. A central do petismo era muito ativa no governo FHC. Depois, apelegou-se, mas também não pode ser hostil ao movimento. Então fica parada, pedindo negociação. A essa altura, é evidente que o ministro de Trabalho já deveria ter comparecido para o debate e o embate. Quem é mesmo? Ah, sim, trata-se do blogueiro Brizola Neto, que está mais por fora do que dedão de franciscano. A pasta é só um cartório do PDT. Não serve pra nada.
Gilberto Carvalho, o sedizente responsável pelo diálogo com “os movimentos sociais”, está sumido. Ele sempre é muito buliçoso quando se trata de acirrar os ânimos contra governos de oposição. No caso do Pinheirinho ou da ação na Cracolândia, por exemplo, sempre tinha algo a dizer. Um assessor seu chegou a participar de uma incrível patuscada, dizendo-se atingido por uma bala de borracha. Não fez exame de corpo de delito, não exibiu o ferimento, não comprovou a “denúncia”. Mas se deixava fotografar com uma bala não disparada na mão. Cadê Carvalho? Pois é… A coisa agora envolve dinheiro, o caixa. Não se trata mais apenas de jogar as hostes do partido contra governos tucanos… Nesse caso, ele não tem o que dizer.
O governo apresentou, por exemplo, um plano de reestruturação da carreira e de reajuste para os professores. Em três anos, representa um desembolso de quase R$ 4 bilhões. Para atender o que pedem, a conta vai para mais de R$ 9 bilhões. Entre outras coisas, recusam a promoção por mérito. Aprenderam isso com os sindicatos petistas, com Lula. “Meritocracia é coisa de neoliberal”, eles rezam. E estão lá: ou é reajuste em linha, pra todo mundo, independentemente das diferenças, ou greve.
Pois é… O PT, sempre tão maquiavélico, é agora refém da raposinha de O Pequeno Príncipe: tornou-se responsável por aqueles que cativou. E eles tomaram balda. Aprenderam a levar tudo. Aqui e ali, o governo ameaça com o desconto dos dias parados, promessa que nunca cumpre. Os grevistas dão de ombro porque sabem que, lá no Planalto, ninguém tem peito — quero dizer, pulso — para isso.
Quem paga o pato? Ora, quem depende dos serviços feitos pelos servidores: a população.
Enquanto fazer ou não fazer greve for irrelevante; enquanto não trabalhar for tão vantajoso quanto trabalhar; enquanto a paralisação não implicar — o que é, em si, uma imoralidade — nenhum sacrifício nem dos grevistas nem do governo; enquanto a população for a única prejudicada pelo movimento, o Planalto pode ir cozinhando o galo, e os grevistas podem radicalizar à vontade nas reivindicações.
Encerro lembrando que não pode haver nada mais indecoroso num movimento sindical do que a reivindicação para que não se descontem os dias parados. Isso é quase uma jabuticaba; não existe em nenhum país do mundo — nem no grevismo do ABC, que resultou no PT, era assim, como Lula sabe muito bem. Quando uma categoria para de trabalhar, ela está ciente do prejuízo que impõe ao outro lado, mas sabe que corre riscos também. Sem esses riscos, então não se trata de greve, mas de negociação cartorial.
As perspectivas mais realistas dizem que a economia não cresce nem 2% neste ano. Para o ano que vem, fala-se aí em algo em torno de 3,5%… Vai saber. Uma coisa é certa, se o governo ceder ao que pedem os grevistas, não vai sobrar um tostão para investir — na verdade, vai faltar dinheiro. E aí a coisa vai mesmo para o buraco. É a herança maldita de Lula, que Dilma ajudou a construir porque, afinal, nunca se cansou de dizer, era a “gerentona” do governo, certo? Pois é… Quando sobra pão, ninguém precisa gritar porque leva a prebenda, tendo ou não razão. Quando a demanda é maior do que a oferta, aí é preciso saber dizer “não”.
E agora, Dilma?
Por Reinaldo Azevedo

quarta-feira, 25 de julho de 2012

O que restará do mensalão no Brasil?

Autor(es): Fernando Filgueiras
Valor Econômico - 25/07/2012

Quando em 1988, o Brasil cumpriu com a Constituição um primeiro estágio de construção da democracia. Mesmo que isto tenha ocorrido por meio de um processo de transição sem rupturas com o regime autoritário anterior, o primeiro passo para a democratização ocorreu com a universalização dos direitos políticos, com o início de um processo de reconhecimento dos direitos sociais e com o reconhecimento da publicidade como um dos marcos normativos do Estado e da administração pública.
O processo de transição, desde então, desencadeou uma série de transformações na política brasileira. Em primeiro lugar, iniciou um processo de consolidação das regras democráticas, estabelecendo as eleições como ritual político para a definição das autoridades tanto no plano do Poder Legislativo, quanto no plano do Poder Executivo. Não há, hoje, espaço para golpes e viradas de mesa. Em segundo lugar, a política brasileira passou a conviver cada vez mais com a expansão e a institucionalização da participação da sociedade civil. Por meio de conselhos gestores, conferências, orçamentos participativos e por novos repertórios de ação dos movimentos sociais, a sociedade civil tem influenciado e colaborado com a gestão da coisa pública, aproximando Estado e sociedade. Em terceiro lugar, e talvez o mais importante, a transição para a democracia tem modificado o perfil da elite política, inserindo novos grupos e temas no processo da representação.
Passados quase 24 anos da Constituição de 1988, podemos dizer que existe uma consolidação das regras eleitorais e um processo de mudança ainda em curso e que tem impactado a organização das instituições do sistema político. Ao reconhecer a publicidade como um dos seus princípios fundamentais, a Constituição de 1988 erigiu um processo de mudança marcado por conjunturas críticas ditadas pela corrupção. Desde 1988 a sociedade brasileira tem convivido com escândalos de corrupção em sequência, promovendo mudanças tanto no sistema político quanto na administração.
A ideia de corrupção está ligada à ideia de degeneração, putrefação ou destruição. No caso da política, trata da degeneração ou apodrecimento das instituições. Para Aristóteles, escrevendo sobre o assunto no século IV a.C., a corrupção representaria um processo de degeneração das instituições. Mas, por outro lado, segundo estagirita, ela coloca em movimento a ordem política. Nesse sentido, ela representa uma potência na ordem política, porquanto a coloca em movimento, no sentido de sua transformação.
A sequência de escândalos de corrupção tem colocado a ordem política brasileira em movimento, especialmente no que tange ao desenvolvimento das instituições de controle. Todas estas conjunturas críticas que desencadearam processos de desenvolvimento institucional do controle no Brasil têm sido marcadas pela presença de um escândalo de corrupção. A primeira delas foi o impeachment do presidente Collor de Melo. Naquela ocasião, o impeachment de Collor representou um momento para desencadear uma agenda de reforma política. Em sequência, o escândalo do Orçamento da União possibilitou a mudança do regimento do Tribunal de Contas da União, o aprimorando para o exercício do controle das contas públicas. A criação da Controladoria Geral da União e a maior autonomia investigativa da Polícia Federal também vieram na esteira da permanência da corrupção no discurso político. Iniciamos, assim, uma corrida do cachorro atrás do próprio rabo.
Nesse contexto, a transformação das instituições de controle é inegável. O papel delas na construção da publicidade e da transparência coloca o Brasil na vanguarda de uma parte muito importante da gestão pública. Mas de todos os escândalos de corrupção que nos assolaram desde 1988, o mensalão representa um outro tipo de conjuntura crítica, que não necessariamente está relacionada ao desenvolvimento das instituições de controle, mas ao desenvolvimento dos valores democráticos.
O mensalão, dentre todos os escândalos que surgiram no Brasil, tem um apelo de valores. Não porque se diferencie substancialmente de outros escândalos, mas por ter colocado o tema da ética pública no interior do debate e pelo momento no qual estamos. Da conjuntura do mensalão não resultará novos desenvolvimentos institucionais e nem sobreposição de outras instituições. Restará um debate ainda em aberto a respeito dos valores que devem pautar a gestão da República.
O julgamento no Supremo Tribunal Federal encerrará um ciclo em que as instituições de controle passaram a funcionar a contento, mas ainda não avançamos no que respeita aos valores republicanos. A mídia denunciou o mensalão, a Polícia Federal apurou e investigou o papel dos envolvidos, a Procuradoria Geral da União denunciou os acusados e, agora, o Supremo julgará tal escândalo. Será uma encruzilhada histórica que deixará marcas, para o bem ou para o mal, no Brasil. Independentemente de qual juízo seja feito no Supremo, o mensalão deixará marcas profundas na construção ética da República. Por isso corremos ainda atrás do próprio rabo. Para além das instituições, necessitamos de uma cultura democrática. Apenas no entrelaçamento das instituições com uma cultura política democrática é que será possível superar esta conjuntura crítica e andarmos para frente.
O estágio de desenvolvimento da democracia brasileira faz com que hoje tenhamos uma cultura política ambivalente em relação ao interesse público. Mas a ambivalência desta cultura política, em que o cidadão comum denuncia a corrupção praticada pelos políticos sem olhar para o modo como ele próprio trata a coisa pública, pode avançar para valores virtuosos ou degenerar para a mais mesquinha corrupção dos valores. Se houve avanço no que tange ao desenvolvimento das instituições, será que elas sobreviverão sem o alicerce de uma ética pública sólida? Com a palavra, o Supremo.
Fernando Filgueiras é professor do Departamento de Ciência Política da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), coordenador e pesquisador do Centro de Referência do Interesse Público (Crip) e colunista convidado do "Valor". Rosângela Bittar volta a escrever em agosto

terça-feira, 24 de julho de 2012

O coração podre do Brasil

                 



 Mais de dez anos já estou pensando e pesquisando onde está o centro dos problemas que faz que o Brasil não anda como podia. Claro, primeiro se olha para a política e se olha para a economia e para a educação. Mas, na verdade, mesmo a política do Brasil não é tão ruim e bastante democrático e moderno e a economia e a educação estão melhorando passo à passo. Assim onde está o coração dos problemas? Cada vez mais minha atenção dirige-se para a justiça como o problema central do Brasil e recentemente ainda mais ganho a convicção que o sistema jurídico é o coração podre do Brasil.


Fonte: Antony Mueller, Prof. na Universidade Federal de Sergipe, Doutor pela Universidade de Erlangen-Nuremberg

O neo-patrimonialismo sergipano

Comentários: Que coisa interessante não?! E todo mundo quer ganhar mais! Tem lógica, mas quem realmente não ganha bem? E quem realmente trabalha para ganhar mais?

Afonso Nascimento
-- Advogado e Professor de Direito da UFS

Se alguém me perguntar qual o traço mais saliente e permanente do Estado em Sergipe, eu direi sem pestanejar: o patrimonialismo. Este é um conceito elaborado pelo jurista e economista alemão Max Weber para cobrir práticas no funcionamento da máquina estatal que não fazem distinção entre o público e o privado. Para exemplificar, remeterei o leitor a ideias populares como nepotismo, emprego para não ir trabalhar, trem da alegria, ausência de concurso público, privatização dos cargos públicos etc. Sergipe mudou para melhor desde a sua emancipação até hoje? Certamente, sobretudo desde o fim da ditadura militar e com a Constituição de 1988, mas esse problema que é o patrimonialismo permanece. É por isso que, para esses tempos recentes, vou chamá-lo de neo-patrimonialismo.

Entre os sergipanos, a forma mais antiga de patrimonialismo são os cartórios privados. Esses cartórios, com funções públicas, são doações feitas pelos governantes monárquicos e republicanos de Sergipe e do Brasil. Nasceram como presentes, sinecuras, para alguém próximo do poder político por algum serviço prestado ou simplesmente para alguém que precisa de uma mordomia para viver, passada de pai para filho até recentemente. Os proprietários desses cartórios públicos constituem um dos lobbies mais importantes do país - especialmente aqueles dos cartórios que ganham fortunas com o movimento da construção civil. Para encurtar essa conversar, cartório sempre foi exemplo de dinheiro fácil: uma fotocópia, uma autenticação de assinatura, um carimbo, um selo, uma assinatura e dinheiro! O dinheiro mais fácil do mundo. Felizmente, com o Conselho Nacional de Justiça, o quadro melhorou consideravelmente, mas ainda tem estrada para aperfeiçoar essas instituições.

Para justificar o que escrevi no primeiro parágrafo, é necessário dar mais exemplos. Vamos a eles então. Até recentemente, promotores públicos estaduais também trabalhavam como advogados privados. Uma coisa aberrante. O mesmo pode ser dito em relação aos membros da Defensoria estadual também até pouco tempo Mas se alguém quer mesmo um bom exemplo de patrimonialismo, tome o caro da Procuradoria Geral do Estado. Aqui está a forma mais exagerada da indistinção entre o público e o privado em Sergipe. Pelo que sei, para ser procurador é preciso fazer concurso público. Adota-se então o critério meritocrático moderno de acesso a um emprego de advogado público para as causas estatais. O procurador seria então um funcionário público como qualquer outro. Mas não é.

Além de receber seu salário de funcionário público, também tem direito aos honorários de sucumbência, ou seja, nas causas ganhas, as seis dezenas de procuradores também recebem uma porcentagem relativa ao valor delas. Vou trocar isso em miúdos. Recebem dois “salários”, um para trabalhar como qualquer burocrata e outro “porque trabalhou”. Neste caso, todos os contribuintes sergipanos pagam a esse funcionário público duas vezes. O leitor quer mais? Pois bem, não bastasse essa beleza de emprego, o procurador estadual também pode advogar como qualquer advogado privado, disputando com este o mercado de causas e de clientes. Errado? Claro que sim, sem falar que, competindo de novo com o advogado privado, pode concorrer a uma vaga no Tribunal de Justiça pelo quinto constitucional. Uma aberração.

No momento atual, os procuradores estaduais estão em campanha salarial. Querem aumentar os seus salários já altíssimos. Como justificam a sua demanda? Dizem que, através de seu trabalho, recuperaram para os cofres públicos milhões de reais, ou seja, cumpriram a sua obrigação de servidor público. Como as cifras são altas, as pessoas desinformadas podem ficar impressionadas. Essa informação deveria ser complementada com respostas a algumas perguntas. No período de quanto tempo esse dinheiro foi recuperado? Quais os números milionários das causas perdidas, cujo dinheiro, portanto, não voltou aos cofres públicos? Do total dos valores milionários coletados em causas ganhas, quantos milhares de reais deixaram de ir para os cofres públicos porque foram para as contas privadas dos procuradores na forma de honorários de sucumbência? E mais duas. Quantos milhares ou milhões de reais ganharam esses procuradores em sua advocacia privada nesse mesmo período? Se os procuradores têm tempo livre para advocacia privada, por que fazer concursos para contratar mais gente? Verdade ou não, o que se diz nos meios jurídicos é que bom número dos procuradores é mais zeloso com suas causas privadas do que com as públicas.

Em minha opinião, é preciso acabar com os privilégios dessa categoria de funcionário público. Os legisladores estaduais precisam ter coragem republicana para enfrentar esse estamento que é sinônimo de atraso e estabelecer alguma forma de controle externo sobre a sua produtividade e seu tempo de trabalho, como qualquer servidor público. Ah, só para não esquecer, tudo o que foi dito vale para os procuradores dos municípios sergipanos em que eles são servidores públicos.

Fonte: Blog Primeira Mão

domingo, 22 de julho de 2012

Grêmio carimba a estreia do Seedorf

O Grêmio conseguiu 3 pontos importantíssimos fora de casa contra a ótima equipe do Botafogo.
Os alvinegros vieram com o costumeiro 4-2-3-1 "à Corinthians", com Elkson de falso 9 e Vítor Júnior, Fellype Gabriel e o Seedorf, estreante da noite, conferindo muita movimentação na frente. Claro que até por uma questão de adaptação podemos e devemos esperar bem mais do holandes, tanto com relação ao futebol dele quanto com relação ao próprio esquema do Botafogo, era melhor ataque da competição (agora atrás do Galo e do Flu), de muita movimentação, infiltração, velocidade e trocas de posições. Mesmo assim Seedorf chegou a apresentar um bom futebol.

Pelo lado do Grêmio parece que o Luxemburgo fez a lição de casa, estudou bem o adversário, e comprou a proposta do time de General Severiano, de defender e ganhar os contra-ataques, fechando a equipe num 4-4-2 meio à inglesa, com Zé Roberto aberto pela esquerda e Elano do lado inverso, quando sem a bola. Com a bola os bons volantes gremistas Souza e Fernando se apresentavam para a articulação junto com Elano e Zé Roberto, que também tinha liberdade de aparecer como uma espécie de elemento surpresa, Leandro tentando cair nas costas de Márcio Azevedo e Moreno no comando.
O Botafogo foi superior, até pela proposta de jogo das 2 equipes, mas não quer dizer que o Grêmio não foi merecedor da vitória, ao contrários, teve muitos méritos: souber marcar forte, congestionou o miolo do campo, foi compacto e teve relativa segurança na defesa, exceto pelo sufoco que passou em meados e no final do 2º tempo, quando ficou inclusive sem os contra-ataques . Fora isso, aproveitou bem as chances que teve, que foram poucas, mas mais agudas que as do Fogão, o que resultou no um a zero do final.
Olho nas duas equipes, postulantes a vagas na Libertadores sem dúvida.

Futebol - O Jogo dos espelhos


O time do Flamengo apresentou um futebol muito melhor do que o do jogo do meio de semana, mas ainda sofre com a má fase de Vagner Love, que perdeu gols incríveis e pela falta de um meia clássico - organizador de jogadas - que poderia ser função de Adrian, mas Joel prefere escalar o moleque como 2º atacante.
Tanto Cruzeiro quando Flamengo jogam como se fossem um reflexo do outro, duas linhas de 4 jogadores na marcação, muita correria, a faixa central de campo congestionada e a má fase dos seus jogadores.
O Cruzeiro abusou nas jogadas pela sua direita, já que o lado de Léo Moura estava muito bem guardado por Luís Antonio e Amaral, mas o lado esquerdo não havia marcação dobrada, o que facilitava as descidas de Wellington Paulista e Ceará, além de Marllon ter enorme dificuldade de antecipar essa bola dos atacantes. Resultado: gol dos celestes. Ainda assim  pecaram por jogar com Wellington Paulista caindo pelos lados, já que este rende muito mais jogando enfiado e é impressionante como Montillo não consegue render nesse esquema de contra golpes e virilidade do Celso Roth. Talvez precise atuar mais centralizado e chegando mais de trás.
O Flamengo pressionou muito no 2º tempo e continuou alternando bem as jogadas pelo lados  e pelo centro de campo e se mostrou relativamente seguro nos contra ataques. Ibson não foi bem, Renato também não e Luís Antonio foi pior ainda. Tal qual o o técnico do Cruzeiro, Joel também parece escalar mal o Flamengo ao manter Renato em má fase e Adrian fora do setor de criação. Para manter um esquema bem protegido seria interessante um 4-4-1-1.
Ao que parece Joel não vai resistir a mais essa derrota

quinta-feira, 19 de julho de 2012

As prisões reduzem o crime?

Autor(es): Gláucio Soares
Correio Braziliense - 19/07/2012
Pesquisador do Instituto de Estudos Sociais e Políticos da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Iesp/Uerj)
Na Grã-Bretanha, um grupo de pesquisadores da Universidade de Birmingham chegou a conclusões que reforçam os defensores de políticas criminais mais duras. Primeiro, quando a polícia deslinda mais crimes, há a tendência de o crime (em geral) declinar. Ora, como a capacidade de a polícia resolver os crimes depende, direta e indiretamente, dos orçamentos das polícias, o assunto arranha o calcanhar de aquiles dos conservadores, que favorecem a linha-dura.
Cria-se uma contradição entre o conservadorismo da política criminal e o conservadorismo da política fiscal. A redução dos crimes depende de gastar mais com a prevenção e a repressão, e os conservadores não gostam de gastar, são minimalistas. Querem reduzir os gastos públicos.
A pesquisa acompanhou a detecção, julgamento e histórias prisionais ao longo de 16 anos em 43 forças policiais da Inglaterra e do País de Gales. Manter os presos na prisão era especialmente importante nos crimes contra a propriedade.
Equacionando os dados, concluíram que aumentar a média das sentenças em um mês (de 15,4 para 16,4 meses) produziria redução de 4.800 roubos e furtos no ano seguinte %u2014 cerca de 5% do total. No caso de fraudes, calcularam que um mês de aumento nas sentenças reduziria o total em 4.700.
Questão relacionada, mas não idêntica à anterior se refere à percentagem do tempo da sentença que os criminosos efetivamente passam na prisão. Na maioria dos países que estudei, há %u201Cprogressão de pena%u201D. Os criminosos passam de regime de encarceramento total a semiaberto, aberto, à liberdade condicional.
Segundo os autores, aumentar a percentagem do tempo efetivamente passado nas prisões reduziria o crime de maneira significativa. A lógica do argumento é facilmente compreensível: criminosos dentro da prisão não cometem crimes fora da prisão %u2014 direta e pessoalmente.
Claro para todos é que criminosos coordenam atividades criminais de dentro da prisão. Atualmente, na Grã-Bretanha, os criminosos passam apenas a metade da sentença na cadeia. Se a proporção fosse aumentada para dois terços, haveria 21 mil roubos e furtos a menos, assim como 11 mil fraudes a menos. Essas simulações estatísticas impressionam e os grupos contrários às prisões sabem que o combate não prescinde da crítica aos dados e aos métodos estatísticos usados.
Talvez a conclusão mais importante se refira aos criminosos reincidentes. Cerca de 100 mil %u201Cprofissionais%u201D cometem uma percentagem alta dos crimes. Na visão de muitos analistas, a proteção da cidadania requer que esses criminosos profissionais não fiquem em liberdade, que permaneçam presos.
A administração (trabalhista) anterior gastou mais com a segurança pública, o que terminou determinando aumento no número de criminosos nas prisões. Essa relação é do conhecimento dos pesquisadores e das administrações com pessoal qualificado.
O relatório argumenta que é fundamental reduzir a impunidade %u2014 aumento de 1% nos crimes deslindados reduziria os furtos em 85 mil por ano, as fraudes em 1.800, e muito mais. Acompanhar o debate mostra que chutes e afirmações vazias, sem dados, não são aceitáveis na Grã-Bretanha. O papel da pesquisa científica na formulação das políticas públicas é central nos países que conseguiram controlar o crime e proteger os cidadãos.

quarta-feira, 18 de julho de 2012

Eurocéticos têm melhores argumentos

Autor(es): Wolfgang Münchau
Valor Econômico - 17/07/2012
Existem paralelos assustadores entre os debates sobre o euro feitos no Reino Unido no fim dos anos 90 e os feitos hoje no norte da região do euro. Naquela época, o grupo dos antieuro no Reino Unido ressaltava as deficiências na construção da região da nova moeda - uma análise que acabou se revelando acertada - e também previa corretamente que a união monetária exigiria também uma união política para ser bem-sucedida no longo prazo. Também havia questões emocionais, como a figura da rainha estampada nas notas de dinheiro. Foi, no entanto, uma posição com coerência interna.
Não compartilho dessa ideia, mas lembro-me de admitir na época que se não se aceitasse uma união política, logicamente não se deveria aceitar o euro. Nunca houve uma justificativa puramente econômica para a moeda.
A ideia de que se pode resolver a crise da região do euro sem transferências de qualquer tipo é ilusória. Como o sistema bancário alemão é relativamente mais forte que o espanhol, uma união bancária, naturalmente, implicaria perdas para a Alemanha.
A campanha favorável ao euro no Reino Unido, em contraste, foi patética. Era baseada na noção de que a campanha contrária ao euro era exagerada e que uma moeda única não era algo tão complicado assim. De qualquer forma, argumentavam os partidários do euro, era de interesse da Grã-Bretanha continuar no centro da Europa, seja lá o que for que isso significasse. Contestei um jovem parlamentar pró-euro na época. Sua resposta foi que defender uma união política na Grã-Bretanha era algo impossível; portanto, uma campanha para minimizar a importância das implicações seria a melhor opção.
Avance 13 anos. Na semana passada, mais de 200 economistas assinaram petição organizada por Hans-Werner Sinn, diretor do instituto alemão de pesquisas econômicas Ifo e maior voz eurocética entre os economistas do país. Ele ainda não defendeu a saída do euro, mas suas recomendações não são consistentes com a continuidade da região do euro em sua forma atual. A petição concentrou-se na união bancária e em por que isso abriria a porta para a união fiscal e o compartilhamento dos encargos fiscais em larga escala.
Outros economistas, então, lançaram uma contrapetição argumentando que uma união bancária é um prolongamento lógico de uma união monetária. Isso, por si só, está correto. Assim como os partidários pró-euro no Reino Unido na década de 90, no entanto, eles minimizaram a importância das implicações. Dizem que uma união bancária não é nada a se temer; não haverá transferências; não se trata de uma questão de a Alemanha vir a assumir as dívidas bancárias dos outros.
Discordo das opiniões do professor Sinn e de seu grupo. Tenho de admitir, contudo, que sua posição tem coerência interna. Opõe-se a transferências e, em última análise, aceita o desmembramento da região do erro.
A posição do assim chamado movimento pró-euro, entretanto, é bem menos coerente. Uma união bancária estruturada adequadamente implicaria, é claro, transferências permanentes, da mesma forma que uma união fiscal bem definida. A ideia de que se pode resolver a crise da região do euro sem transferências de qualquer tipo é ilusória. Como o sistema bancário alemão é relativamente mais forte que o espanhol, uma união bancária, naturalmente, implicaria perdas para a Alemanha. Se houver garantia conjunta para os depósitos e uma recapitalização bancária conjunta, certamente haverá transferências - da mesma forma como ocorre hoje dentro dos próprios países.
Assim como no Reino Unido há 13 anos, os que agora fazem campanha pró-Europa na Alemanha, fingem ser pragmáticos. É por isso que concordam com a rejeição, pela primeira-ministra alemã, Angela Merkel, a bônus conjuntos da região do euro. A ideia não é uma proposição possível de ser vendida na Alemanha, dizem. Da mesma forma, concordam que o ajuste econômico da região do euro não pode ser simétrico, também sob o argumento que não é uma proposição vendível. Pelo mesmo motivo, apoiam todas as regras para os déficits, apesar do fato de nunca terem funcionado. Também rejeitam mudanças nos poderes do Banco Central Europeu (BCE). Com pró-europeus como esses, quem precisa de eurocéticos? De forma hilária, muitos professores assinaram ambos os documentos.
A proposta do conselho alemão de assessores econômicos para o chamado fundo para resgatar dívidas cai na mesma categoria. É outro tributo ao santuário do pragmatismo. Parece ser pró-europeu, mas olhando de perto, não vai resolver a crise das dívidas. Um fundo de resgate de dívidas é um instrumento para agrupar uma porção dos títulos de cada país em troca da emissão de um bônus conjunto da região do euro. A ideia, no entanto, é que as dívidas sejam pagas, portanto, a emissão de bônus teria de ser honrada no vencimento. Isso pode funcionar para valores relativamente baixos, mas a dívida em "excesso" da Itália gira em torno a €1 trilhão. A ideia de que Roma possa pagar suas dívidas em excesso em 25 anos é insana, a menos que se presuma uma milagrosa recuperação sustentável no crescimento econômico.
Como no Reino Unido dos anos 90, os pró-europeus de hoje são incapazes de defender a ideia de que uma união monetária exige uma união bancária, uma união fiscal minimamente suficiente com poderes para elevar impostos e uma união política com mandato legislativo independente dos países-membros. Os eurocéticos estão dizendo que não querem nada disso. Os pró-europeus querem obscurecer a situação.
Embora odeie admitir, o grupo do professor Sinn é intelectualmente mais consistente do que o grupo cujos objetivos principais compartilho. (Tradução do Sabino Ahumada).
Wolfgang Münchau é editor do FT, especialista em União Europeia.

A maldição do vencedor

Autor(es): João Paulo da Silveira Ribeiro
O Globo - 18/07/2012
Em 2007, o Governo federal deu início à segunda etapa do programa de concessões rodoviárias com uma grande novidade. Enquanto, anteriormente, o vencedor da licitação era aquele que oferecesse o maior pagamento pela outorga no leilão, na segunda etapa o licitante que propusesse a menor tarifa dentre todos os outros seria considerado o vencedor. Essa alteração geraria tarifas consideravelmente mais baixas sem comprometer a qualidade.
Os leilões confirmaram essa presunção teórica. Mais do que isso, os resultados superaram as expectativas mais otimistas com significativos deságios em relação às previsões iniciais. Foram concedidas algumas das mais importantes rodovias do país, como a Fernão Dias e a Régis Bittencourt.
Contudo, a realidade dos fatos demonstra que a segunda etapa está distante dos objetivos almejados inicialmente.
Embora grande parte das praças de pedágios esteja funcionando, as obras estruturantes, como a ampliação do número de faixas e a construção de contornos que desatariam engarrafamentos, estão atrasadas. Como se não bastasse, os índices de acidentes em algumas concessões aumentaram expressivamente, e, mesmo com pouco tempo de execução, a maioria dos contratos já sofreu amplas renegociações.
Analisando os fatos destacados acima e considerando a abrangência dos pedidos de renegociação feitos até o momento, bem como o curto espaço de tempo em que foram pleiteados, uma das hipóteses que pode ser aventada é a incidência da winner"s curse (maldição do vencedor).
Tal fenômeno ocorre quando a licitação é vencida pela empresa que realiza as projeções mais otimistas e não por aquela que é a mais eficiente. Posteriormente, nesses casos, é comum a ocorrência de renegociações com o propósito de evitar os riscos de quebra e viabilizar a exploração da concessão.
Isto não é novo e nem raro. Pelo contrário, a maldição do vencedor é retratada na teoria econômica desde a década de 70.
A principal maneira de inibir essa prática se dá com a criação de mecanismos que dificultem ao máximo os pedidos de renegociação oportunistas. A renegociação deve ser exceção e considerada - a princípio - improvável pelos concessionários, devendo ocorrer apenas nos casos em que o particular sofra prejuízos decorrentes de riscos assumidos pelo Estado no contrato de concessão. Isto só é factível com editais e contratos bem elaborados e com suporte político para resistir a possíveis pressões.
Contudo, a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) tem admitido renegociações na grande maioria das concessões da segunda etapa, sobretudo com a prorrogação dos prazos das obras previstas inicialmente. A ANTT argumenta que houve erros na modelagem dos editais, pois a maioria das obras de grande porte estava prevista para os primeiros anos das concessões, o que seria economicamente inviável.
Sem entrar no mérito de tais alterações, o que precisa ser enfatizado é que, quando as renegociações se tornam prováveis, o processo licitatório tende a selecionar o proponente que reúne as melhores condições para renegociar os contratos, e não aquele que exploraria a concessão com maior eficiência. Isto incentiva e potencializa projeções excessivamente otimistas no curso da licitação.
Por isso, a cultura das renegociações esvazia o processo licitatório e reduz os ganhos de eficiência que a competição propicia. Nas renegociações o concessionário não está sujeito a pressões concorrenciais possuindo melhores condições para impor sua vontade.

segunda-feira, 16 de julho de 2012

Dissertação - você tem de fazer uma! E agora?

Autor(es): Alexandre Barros
O Estado de S. Paulo - 13/07/2012
Escrever uma tese ou dissertação para um curso de pós-graduação é um dos processos mais desgastantes da vida de uma pessoa. Primeiro, orientadores costumam ser vaidosos e autoritários: fazem demandas desnecessárias, trabalhosas e desgastantes para gente que só quer cumprir seus requisitos e seguir com a vida. Segundo, a preocupação com a dissertação permeia todo o curso e todos os orientadores dizem ao candidato que tem de fazer uma dissertação, raramente explicam como chegar lá.
Alguns dizem: "Vá à biblioteca, olhe algumas teses e você verá como é". Orientação tão útil quanto dizer a qualquer um de nós que pergunte a alguém como fazer um computador e receber esta resposta: "Tire a tampa, olhe lá dentro e você saberá como fazer um computador". É claro que tais respostas não levam a nada. Ver um produto pronto não nos diz como aquele monte de metal ou de plástico virou um automóvel ou como uns pozinhos químicos misturados e comprimidos viram remédios que curam desde uma dor de cabeça até uma complexa hepatite C.
Depois de ver o sofrimento de inúmeros estudantes com esses processos e tentar ensinar-lhes o pulo do gato, descobri que o alcance que eu podia ter era muito limitado. Durante a vida posso ter influenciado algumas centenas de estudantes, mas não acredito ter chegado ao primeiro milhar.
Conversei com alunos de várias universidades do mundo e lhes perguntei: "Alguém ensinou a vocês como fazer uma dissertação?" Resposta unânime: "Não, disseram-nos que nós tínhamos de fazer uma, mas nunca ninguém nos explicou como chegar lá".
Há algum tempo eu só conhecia o YouTube (que tem só 7 anos de idade) de referências, ou de receber links para gatos que tocavam piano ou violino, ou bebês fazendo acrobacias que rivalizam com Carlitos. Um dia me perguntei: por que não? Se escrever um livro gastarei muito tempo e, com muito sucesso, venderei 5 mil exemplares, mas só com muita sorte. O impacto que o livro poderá ter será minúsculo. Que tal testar o YouTube? Gravei um vídeo simples, há pouco mais de dois anos. Será que isso compete com gatos que tocam piano? Claro que não. Agora completou 20 mil exibições. Nada comparado a bebês acrobatas, mas, certamente, muito mais do que um livro. Benefícios adicionais: é grátis, todos podem ver, é infinitamente repetível. Não gasta papel nem tinta.
Recebi muitas mensagens, a maioria de estudantes agradecidos porque o vídeo lhes tirou um grande peso das costas. Nem todos gostaram. Uma moça me disse que punha o vídeo para adormecer seu bebê, de tão chato que era. Serendipity: feito para facilitar a vida de quem tinha de escrever uma dissertação, servia também para adormecer bebês! Como tudo o que se diz, escreve ou publica, cada um lê, ouve ou usa como bem lhe parece.
Após um ano, resolvi fazer um segundo. O primeiro era sobre como se relacionar com o orientador. O segundo, sobre como organizar ideias e material, enfatizando principalmente que quem ia escrever a dissertação tinha ideias e elas eram boas, o que raros orientadores dizem a seus estudantes. O propósito era duplo: ensinava e dava uma injeção de otimismo e segurança psicológica.
Também dei aulas sobre o método. Durante uma aula, um estudante me disse: "Professor, do jeito que o senhor ensina fica tão fácil que parece até conto do vigário". Respondi: "É fácil mesmo. Os orientadores complicam para resolver problemas psicológicos deles, pouco importando o dano que isso possa causar aos alunos".
Testei outra ideia: muitas cabeças pensam melhor e mais criativamente que poucas. O método era baseado em livre associação de ideias. Um aluno questionou: "Professor, o senhor acha que funcionaria se cada um de nós, perante a turma, dissesse sobre o que pretende fazer a sua dissertação e ouvisse as ideias dos colegas?" Ponderei que nunca tinha tentado, mas não custaria experimentar. Foi um sucesso. Cada um chegava lá, dizia seu tema e os colegas eram convidados a escrever em diversos papéis soltos os vários aspectos que abordariam se tivessem de fazer uma dissertação sobre aquele tema. Cada aluno saiu com uma pilha de ideias fornecidas pelos colegas e o trabalho dali para a frente era pôr todas aquelas ideias em ordem, usar as importantes e descartar as supérfluas.
Todos os estudantes fizeram isso e a produtividade aumentou muito. Princípio básico do capitalismo: se cada um contribuir um pouco, o produto final pode ser melhor e maior.
Tecnologias modernas podem ser um complemento para tecnologias antigas. Testar inovação, sobretudo se o preço for barato ou tender a zero, como é o custo de fazer e colocar um vídeo no YouTube, vale. Esta é a beleza do mercado: milhares de pessoas tomarão decisões independentemente de procurar, achar, decidir se vão ou não ver um vídeo, gostar ou não gostar, aproveitar ou não. Cada uma verá com os seus olhos, através de suas lentes, e fará o uso que bem entender.
Guttenberg não estava fazendo uma revolução quando inventou a imprensa, apenas produzindo um modo diferente de disseminar ideias. Outros usaram como bem entenderam e a imprensa trouxe progresso. James Watt também não estava fazendo uma revolução quando descobriu que o vapor podia ser usado para tocar máquinas. O mercado adaptou, para melhor. Depois chamou aquilo de Revolução Industrial, um nome mais elegante para um conjunto de técnicas que tornaram a vida das pessoas melhor.
Não tenho essa ambição, apenas fico feliz por saber que alguns estudantes estarão sofrendo menos porque decidi testar uma tecnologia nova para um propósito que me pareceu razoável. Se deu certo, tanto melhor, reforça o meu sentimento de ser um otimista a respeito do futuro da humanidade

sexta-feira, 13 de julho de 2012

'É doce morrer no mar'

Autor(es): Monica Baumgarten de Bolle
O Estado de S. Paulo - 13/07/2012
MONICA BAUMGARTEN DE BOLLE, ECONOMISTA, PROFESSORA DA PUC-RJ, DIRETORA DO IEPE/CASA DAS GARÇAS

Escarpas rochosas, entrecortadas e pontiagudas. Escarpas que se elevam do mar, seu relevo marcado por penhascos íngremes e ameaçadores. Ribanceiras dramáticas, despenhadeiros alcantilados. Há muitas formas de descrever essas formações geológicas, talhadas pela erosão, de aspecto áspero e sedutor. As escarpas estão na moda. Nos EUA, por exemplo, não se fala de outra coisa. O "penhasco fiscal" é a imagem usada para descrever os ajustes que estão programados para 2013 e que incluem cortes vultosos de gastos sociais e militares, além da extinção de benefícios. Um dos mais importantes e que tem ajudado a tépida "recuperação" americana é a redução de impostos da era Bush, que Obama quer prorrogar para sustentar a renda da classe média. O presidente não quer fazer o mesmo pelos ricos. Ao contrário, quer seguir a linha de François Hollande, que propôs, recentemente, a instituição de um tributo sobre as grandes fortunas para sustentar as combalidas contas públicas. Este pleito de Obama promete ser uma das principais frentes de batalha com os Republicanos ao longo da campanha eleitoral.
Mas as ribanceiras fiscais e os despenhadeiros que ameaçam o crescimento não são um privilégio das encostas americanas. Os países que margeiam o Mar Mediterrâneo têm lá a sua paisagem de falésias rochosas, quiçá fonte de inspiração para os seus infindáveis pacotes de austeridade. A cidade de Ronda, no sul da Espanha, tem um dos mais incríveis e belos precipícios, de quase 750 metros de profundidade, que divide o gracioso vilarejo em duas partes. A belíssima Costa Amalfitana, na Itália, é marcada por altíssimas escarpas que mergulham repentinamente no verde azulado do Mediterrâneo.
Tanto a Itália quanto a Espanha acabam de anunciar mais uma rodada de ajustes para tentar reconquistar a confiança dos investidores, que, entre idas e vindas, têm mantido os rendimentos dos títulos dos dois países em níveis que dificultam sobremaneira o financiamento dos governos. A mais recente promessa fiscal do primeiro-ministro Mariano Rajoy, da Espanha, teve contornos dramáticos. Embora os líderes europeus tenham recentemente concordado em conceder ao país mais tempo para alcançar suas metas - originalmente, a Espanha deveria reduzir o déficit de 2012 para 5,3% do PIB, após alcançar quase 9% no ano passado, além de convergir para 3% até o fim de 2013 -, as autoridades acabam de anunciar um pacote de ajustes que soma € 65 bilhões nos próximos dois anos. Esse é o quarto pacote em apenas sete meses de governo de Rajoy. Pior. Ao desvendá-lo, o primeiro-ministro teve de renunciar a uma de suas mais caras promessas de campanha, a de que não aumentaria os impostos, ao contrário do que fizeram seus adversários socialistas, os supostos "culpados" pela crise que assola o país. Cambaleante, Rajoy caminha na beira do precipício político. Sobretudo ao "assegurar" um socorro aos bancos do país, com os recursos dos fundos de resgate europeus, que envolverá perdas consideráveis aos acionistas e credores destas instituições. Como em alguns casos os acionistas e credores são os governos locais, as perdas recairão, de uma forma ou de outra, sobre o contribuinte.
Na Itália, a situação é um pouco melhor. Mas não muito. O primeiro-ministro Mario Monti, que periclitava no alto de uma falésia amalfitana, foi ligeiramente afastado do perigo devido ao seu suposto ato de bravura durante a última reunião de cúpula europeia, aquela em que enfrentou a chanceler Angela Merkel para que ela concordasse com o uso dos recursos dos fundos de resgate europeus, ainda que estes não disponham de um montante suficiente para auxiliar a Itália e a Espanha simultaneamente. Contudo, a economia está em recessão, o desemprego não dá trégua e mais um pacote de ajuste acaba de ser anunciado. Sem alternativa, Itália e Espanha caminham para a ribanceira. Talvez sejam capazes de driblar a morte. Talvez tenham de se contentar com os belos versos de Dorival Caymmi, perecendo docemente nas ondas verdes do Mediterrâneo.

quinta-feira, 12 de julho de 2012

O crédito e a armadilha da dívida

Comentários: Outra questão comumente pautada pela mídia e por muitos é a da inadimplência. Bom, num ambiente de emprego em alta e estável, ganhos reais de renda e estabilidade macroeconômica, nada mais natural do que haver alguma oscilação na inadimplência com o aumento do crédito. É fato que o Brasil está longe de esgotar o modelo de expansão de crédito, crédito esse que é possívelmente a principal alavanca do capitalismo contemporâneo e é natural também que as famílias, sobretudo as menos favorecidas e com menos (acesso ao) conhecimento façam algumas "loucuras", ou sejam ludibriadas por bancos e instituições financeiras na aquisição de crédito.
Contudo, isso se dá mais ou menos como a questão da democracia no Brasil: incipiente, essa forma de governo trouxe sérios problemas pela falta de cancha das pessoas, sobretudo as gerações que vivenciaram a fase ditatorial, resultando na eleição de algumas dessas desgraças que vemos no cenário político. Como não há mal que dure para sempre e a maioria das pessoas aprendem com seus erros e com os dos outros, é certo que veremos mais e mais o amadurecimento das gerações, principalmente as vindouras, para a evolução da democracia.
Com o crédito deve ser semelhante, com as pessoas habituando-se, com o passar do tempo, a lidar com esses troços. A gerações vindouras, já nascidas nesse ambiente, terão com certeza bem mais traquejo com o tema, o que provavelmente nos levará a patamares mais interessantes de desenvolvimento social e econômico.




Autor(es): Luiz Fernando de Paula
Valor Econômico - 12/07/2012
O setor bancário das economias avançadas tem passado por intensas transformações em função da liberalização financeira que diluiu as fronteiras entre os diferentes segmentos do sistema e os fluxos financeiros entre países, e também em função dos avanços tecnológicos das telecomunicações e informática, que permitiram maior processamento de informações.
Os bancos comerciais, em especial, passaram a sofrer a concorrência de outras instituições financeiras, acarretando uma redução na sua margem de intermediação financeira. Os bancos reagiram adquirindo outras instituições financeiras, dando início a uma onda de fusões e aquisições bancárias, e ao mesmo tempo buscando diversificar suas atividades para além da intermediação financeira.
Outro aspecto da conglomeração financeira é a busca de segmentação da clientela, com incorporação de uma base ampla de clientes. Para clientes de alta renda, os bancos oferecem uma gama de produtos diferenciados para atender a demanda por serviços sofisticados; para clientes de baixa e média renda oferta-se serviços padronizados e de massa.
A democratização dos serviços financeiros vem geralmente na companhia de situações de exploração financeira
A aparente democratização dos serviços financeiros vem frequentemente acompanhada de situações de exploração financeira: clientes de mais baixa renda pagam relativamente mais tarifas bancárias e taxas de juros de empréstimos bem mais elevadas do que as dos demais clientes, e se vêm em situações caracterizadas como de "armadilha da dívida": se endividam pagando taxas de juros elevadas, comprometendo crescentemente sua renda.
De modo geral, o Brasil acompanhou a tendência internacional de conglomeração financeira: desde 1997 houve uma onda intensa de fusões e aquisições bancárias, ao mesmo tempo em que as instituições financeiras passaram a diversificar suas atividades. Contudo, há algumas especificidades no comportamento recente do setor bancário: em primeiro lugar, a relação crédito e Produto Interno Bruto (PIB) tem sido historicamente baixa por conta de um passado de forte instabilidade macroeconômica; em segundo, os bancos nacionais participaram ativamente da onda de aquisições bancárias, e são hoje os líderes do mercado.
O fato de haver uma baixa relação entre crédito e PIB fez com que a atividade de intermediação se constituísse no "filão" de negócios a ser explorado.
De fato, a retomada do crescimento do produto a partir de 2004 propiciou as condições básicas para um boom do crédito no Brasil. Até então os bancos obtinham elevadas receitas derivadas de suas aplicações em títulos públicos indexados à Selic e de empréstimos a curtíssimo prazo com spreads elevadíssimos. A possibilidade de aplicação em títulos públicos livres de risco e boa rentabilidade fazia com que os bancos embutissem um elevado prêmio de risco nas suas taxas de juros.
Assim, houve um crescimento contínuo da relação entre o crédito com recursos livres e o PIB de 15% em janeiro de 2004 para 32% em abril de 2012. Até meados de 2007, esse crescimento foi puxado fundamentalmente pelo crédito para pessoa física, com destaque para o crédito pessoal, estimulado pela criação do crédito consignado. A partir de 2007 há um forte crescimento dos empréstimos para pessoa jurídica, puxado principalmente pelo crédito para capital de giro.
Com a mudança na composição da dívida pública federal - a participação da dívida indexada a taxa Selic caiu de 61% em dezembro de 2003 para 33% em dezembro de 2007 - os bancos tiveram que buscar nas operações de crédito a possibilidade de manutenção de uma lucratividade elevada.
No que se refere ao spread bancário das principais modalidades de crédito livre, houve uma acentuada queda nos spreads para pessoa física, o que entretanto não foi acompanhado de uma redução mais acentuada no spread para pessoa jurídica até 2008. A partir de 2008 há um movimento inverso: os spreads para pessoa jurídica diminuem, de 30,5% em abril de 2011 para 26,5% em abril de 2012, enquanto que o spread para pessoas físicas, em parte devido ao aumento da inadimplência, cresceu em 2010.
Assim, os bancos compensaram a perda dos ganhos de tesouraria com uma gradual expansão na oferta de crédito mantendo um spread elevado. Ou seja, auferem receitas tanto no volume das operações quanto no preço. Duas das principais modalidades de crédito - crédito consignado e aquisição de veículos - têm garantias, sendo relativamente de baixo risco. Assim, os bancos adotam uma estratégia conservadora na expansão de suas atividades, com "turn-over" e juros elevados.
Por fim, o ciclo expansivo do crédito veio acompanhado de um aumento no endividamento das famílias, que cresceu de 18% em janeiro de 2005 para 43% em março de 2012, segundo dados do BC, atingindo em particular os segmentos de baixa-média renda. A expansão do crédito tem ocorrido de forma concentrada em algumas modalidades de crédito, como capital de giro, crédito pessoal e aquisição de veículos, que mostram algum grau de saturação. Isto decorre do fato de que a taxa de crescimento do crédito tem se situado bem acima da taxa de crescimento da renda. Em um cenário de desaceleração econômica é provável que os grandes bancos varejistas venham manter spreads mais baixos mas ainda elevados, em que pese a queda na taxa de juros de curto prazo.
Luiz Fernando de Paula é professor titular da Faculdade de Ciências Econômicas da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (FCE/UERJ) e pesquisador do CNPq. É presidente da Associação Keynesiana Brasileira (AKB). É autor do livro "Financial Liberalization and Economic Performance: Brazil at the Crossroads" (Routledge).

quarta-feira, 11 de julho de 2012

OCDE prevê mais freada, exceto para o Brasil

Autor(es): Por Paul Hannon | Dow Jones Newswires
Valor Econômico - 10/07/2012

A maioria das principais economias deverá desacelerar nos próximos meses. Apenas o Brasil deverá registrar uma aceleração, segundo os indicadores antecedentes compostos da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).
Os indicadores, que se mostraram confiáveis no passado, representam um golpe a qualquer esperança que ainda havia entre as autoridades do mundo inteiro de uma rápida saída de um período de atividade anêmica. Eles aumentam também a probabilidade de os bancos centrais adotarem novas medidas destinadas a respaldar o crescimento.
O instituto de análise e pesquisa sediado em Paris disse ontem que seu indicador antecedente do nível de atividade econômica dos 34 países desenvolvidos que o compõem caiu para 100,3 pontos em maio, em relação aos 100,4 pontos de abril. Os números, segundo a OCDE, apontam para um "crescimento declinante".
Seus indicadores antecedentes das economias em desenvolvimento foram ainda mais pessimistas, ao sinalizar "desacelerações" - ou um crescimento inferior à taxa tendencial de longo prazo - para China, Índia e Rússia.
"Os indicadores antecedentes compostos apontam para uma diminuição da atividade econômica na maioria das principais economias da OCDE e para uma desaceleração mais marcante na maioria das principais economias não filiadas à OCDE", afirmou a organização.
Entre os países desenvolvidos, o principal foco de fragilidade continua sendo a zona do euro, para a qual o indicador antecedente aponta para a persistência da desaceleração. No entanto, as perspectivas das principais economias em desenvolvimento também se enfraqueceram significativamente nos últimos meses.
O indicador antecedente para a China caiu por todos os meses deste ano e voltou a diminuir em maio, para 99,2 pontos, a partir dos 99,4 pontos de abril. Os indicadores antecedentes de Índia e Rússia também estão em persistente trajetória descendente.
Em mais um sinal de que a segunda maior economia mundial está desacelerando, os dados divulgados ontem mostraram que a taxa anual de inflação da China caiu em junho para seu nível mais baixo de quase dois anos e meio.
Os indicadores antecedentes da OCDE são concebidos para fornecer antecipadamente indícios de pontos de inflexão entre a expansão e a desaceleração do nível de atividade econômica. Eles têm como base uma ampla variedade de séries de dados que têm um histórico de indicar modificações do nível de atividade econômica.
A principal exceção à tendência declinante geral foi o Brasil, que teve seu indicador antecedente elevado de 99,0 pontos de abril para 99,2 pontos em maio, o que, segundo a OCDE, é sinal de que o crescimento do país vai se acelerar.

terça-feira, 10 de julho de 2012

Europa teme criar geração perdida de desempregados

Comentários: A Europa terá sorte se perder apenas uma década. Apesar do inverso ser plausível, como no pós 2º guerra, que a Europa mostrou força para se recuperar, a probabilidade maior é que os europeus entrem numa estagnação parecida com a que ocorre com os nipônicos a mais de 20 anos.


Autor(es): Por Paul Wiseman e David McHugh | Associated Press, de Bruxelas
Valor Econômico - 10/07/2012

Irene Fernández perdeu seu emprego nos correios da Espanha há cinco meses, vítima dos cortes de gastos do governo. Desde então, ela vem sobrevivendo com dinheiro emprestado da mãe e dos € 530 que consegue por mês cuidando dos cachorros dos vizinhos. Fernández, 24, fez até agora apenas uma entrevista de emprego.
"Nunca tive um ano tão difícil", diz ela. "Começo a perceber que as coisas serão muito mais difíceis para mim do que foram para a geração de minha mãe."
A crise econômica na Europa está atingindo mais duramente jovens como Irene Fernández. A taxa de desemprego entre os jovens está perto de 53% na Grécia, 51,5% na Espanha e 35% na Itália. Nos 17 países que usam o euro, o desemprego entre os jovens está no patamar recorde de 22%, duas vezes a taxa geral de desemprego da zona do euro, de 11%, que por sua vez já é a maior desde a criação da moeda comum em 1999.
A admirável exceção é a Alemanha, onde a taxa de desemprego entre os jovens está em apenas 7,9%, graças a um sistema de ensino vocacional. Nos EUA, a taxa de desemprego entre os jovens - aqueles com idades entre 16 e 24 anos - ficou em 16,5% no mês passado. As estatísticas econômicas europeias contam aqueles entre os 15 e os 24 anos como jovens.
Os economistas temem que anos de desemprego poderão produzir uma versão europeia da "Geração Perdida" do Japão - os adultos jovens que procuraram emprego em vão na década de 1990 e hoje estão permanentemente incapacitados de seguir boas carreiras. Quanto mais tempo os adultos jovens ficam desempregados, por mais tempo eles não contribuem para o crescimento econômico, consomem ajuda do governo e aumentam o risco de instabilidade social.
Os trabalhadores jovens frequentemente são os últimos a serem contratados, de modo que são os primeiros a serem demitidos. E eles têm dificuldades para conseguir ocupações - tabeliões na Itália e motoristas de táxi na Grécia, por exemplo - onde trabalhadores mais velhos e estabelecidos são protegidos da competição por leis e regulamentações.
Mas os problemas econômicos da Europa - que começaram com a crise financeira em 2008 e continuam, com os governos lutando contra endividamentos excessivos - pioraram muito as coisas. Os países estão adotando programas de austeridade e reduzindo os números de servidores públicos. Companhias vêm anunciando demissões ou congelando contratações para enfrentar a queda da demanda.
O colapso dos mercados imobiliários também eliminou empregos no setor da construção, muitos dos quais eram mantidos por trabalhadores jovens. E os trabalhadores mais velhos, cujas finanças foram arruinadas pela recessão e a crise financeira, estão se aposentando mais tarde.
Como resultado, ondas sucessivas de jovens vêm se formando no ensino médio e superior com poucas chances de conseguir emprego, elevando ainda mais a taxa de desemprego entre os jovens a cada ano.
As perspectivas são de pouca melhoria. Mais de metade dos países da zona do euro estão em recessão e a economia do bloco como um todo deverá encolher 0,3% este ano, segundo o Fundo Monetário Internacional (FMI).
Os líderes dos 27 países da União Europeia concordaram no mês passado com um plano audacioso para injetar dinheiro nos problemáticos bancos europeus e ajudar governos a resolver os problemas com suas dívidas e com os altos custos dos empréstimos. Mas o plano deverá proporcionar pouco alívio imediato para os jovens da Europa. O que eles precisam é de crescimento econômico que produza empregos. "Essa é a verdadeira urgência", afirma John Springford, pesquisador do Centro para a Reforma da Europa.
A falta de esperança é especialmente alta nos países da Europa que estão mais encrencados - Espanha, Itália e Grécia, entre outros - e está afetando até mesmo os mais instruídos.
Os jovens europeus, incapazes de conseguir empregos, também vêm buscando asilo nos campi universitários. Esse é um dos motivos de o percentual de jovens europeus que fazem parte da força de trabalho - que têm um cargo ou estão em busca de uma vaga - ter caído de 52,9% em 2000 para 48,7% no ano passado.
Os pesquisadores britânicos Paul Gregg e Emma Tominey constataram em um estudo de 2005 que os homens britânicos que ficaram desempregados por pelo menos um ano entre os 16 e os 23 anos ainda sofriam com uma "perda salarial" aos 42 anos: eles ganhavam na época de 13% a 21% menos do que estariam ganhando se não tivessem ficado desempregados.

segunda-feira, 9 de julho de 2012

O poder da China no novo mundo

Autor(es): Jean-Pierre Lehmann
Valor Econômico - 09/07/2012
Não há como questionar as tendências. A China está com tudo.
O paradoxo é que embora o Ocidente tenha impulsionado a globalização na era moderna, os países ocidentais cada vez mais se enredam em torno a políticas isolacionistas. Os principais motivos são a ansiedade, medo e mal-entendidos sobre a China. Os tempos incertos também se refletem na volatilidade dos mercados. Estamos claramente em um novo mundo, cada vez mais orientado em direção à China. É vital entender de que ponto a China saiu para que seja possível ajustar-se ao desafio da globalização do século XXI.
Entre aproximadamente os séculos II a.C. e XV d.C., durante cerca de 1.700 anos, a "globalização" - a integração dos mercados por meio de fluxos entre fronteiras de bens, capital (seja qual for a forma), pessoas e conhecimento - foi dominada pela Rota da Seda, que se estendia por terra do Leste da China até o Mediterrâneo Ocidental e foi posteriormente complementada pela Rota das Especiarias, de Java, pelo Oceano Índico, até Veneza e, pela costa Africana, até a Somália. Entre os agentes da globalização estavam os chineses, indianos, mongóis, centro-asiáticos, persas, árabes, egípcios e, na ponta final receptora, os europeus.
Há 20 anos, os países da OCDE eram o centro da economia mundial com outras regiões girando a seu redor. Hoje, a maior parte do comércio exterior e dos fluxos de investimentos internacionais se dá dentro ou entre as regiões outrora periféricas do mundo.
Com o passar do tempo e as invenções científicas, houve consideráveis melhoras na cartografia, construção naval e navegação. No início do século XV, a China parecia ostensivamente estar no comando e, a priori, encaminhada a tornar-se senhora do universo. O grande almirante Zheng He fez viagens no período de 1405 a 1433 navegando pelo Mar do Sul da China, Mar de Java, Oceano Índico até a Baía de Bengala, Mar Árabe, Golfo Pérsico, Mar Vermelho e pela costa da África até Mombasa. Alguns acreditam que ele teria chegado até a América. No que continua sendo uma notável mudança de rumo, logo quando a China tinha os recursos para expandir-se pelos mares, os imperadores Ming decidiram suspender as expedições e proibir a navegação pelos mares, com o que os navios da frota da Zheng He foram destruídos e toda a construção de embarcações para grandes viagens marítimas foi proibida.
À medida que a China se fechava em si mesma, a Europa avançava. O Império Ultramarino Português emergiu e estendeu-se pelo Atlântico (com a descoberta da América e a colonização do Brasil em 1500) e pelos oceanos Índico e Pacífico, incluindo postos avançados em Malaca, Goa e Macau. Iniciou, portanto, a ascensão inexorável do domínio global pelo Ocidente. As potências europeias podem ter ascendido e decaído isoladamente - como foi caso dos impérios português e espanhol -, mas, então, outros assumiram o domínio global, mantendo-o firmemente nas mãos do Ocidente, como a Holanda, Grã-Bretanha e França; quando a Europa passou o bastão, por assim dizer, os Estados Unidos o pegaram.
A história realmente importante entre o início dos séculos XVI e XXI foi a transferência de riqueza e poder da Ásia para o Ocidente. Entre 1500 e 1600 a Ásia era responsável por mais de 65% do Produto Interno Bruto (PIB) mundial; em 1700, à medida que o impacto da ascensão das grandes empresas holandesas e britânicas no Leste Asiático começou a ser sentido, a participação começou a declinar, embora ainda mantendo-se em 60%. No início do século XIX a Ásia ainda parecia estar mais ou menos se mantendo por conta própria. De fato, só a China era responsável por 33% do PIB mundial. Então, os diques da industrialização e imperialismo ocidental estouraram. Em 1950, a Ásia tinha 60% da população mundial e 17% do PIB. A Ásia estava pobre, muito pobre. Em 1975, 25 anos depois, havia aumentado a participação no PIB mundial para 22%.
Estamos testemunhando hoje uma mudança tão profunda quanto a ocorrida há meio milênio, com a ascensão do Império Ultramarino Português. Em razão da tecnologia, no entanto, esta era de transformações na qual vivemos vem fluindo ao longo de um período de tempo muito comprimido; a situação vem mudando a uma velocidade alucinante - tão alta, que muitos, especialmente no Ocidente, as pessoas não percebem.
O que é esse "novo mundo"? Para começar, é um mundo que não é mais dominado pelo Ocidente. Há 20 anos, a participação do mundo em desenvolvimento no PIB era de 35%; hoje é de 50% e segue em alta. Há 20 anos, os países da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) eram o centro da economia mundial com outras regiões girando a seu redor passivamente. Hoje, a maior parte do comércio exterior e dos fluxos de investimentos internacionais se dá dentro ou entre as outrora regiões periféricas do mundo. O comércio entre China e Brasil multiplicou-se mais de 20 vezes entre 2000 e de 2010. A China, que estava à margem das relações econômicas da maioria dos países do mundo em desenvolvimento, hoje ultrapassou os Estados Unidos e União Europeia (UE) e se tornou o maior parceiro comercial do Brasil. Uma tendência similar pode ser vista nos laços econômicos da China com outros países da Ásia, África e América Latina. Os laços e a influência chinesa não estão limitados aos países em desenvolvimento. Pequim possui cerca de US$ 1,8 trilhão investidos em bônus do Tesouro dos EUA; a China é, como Hillary Clinton admitiu recentemente, o banqueiro dos EUA.
O novo mundo está cada vez mais sinocêntrico. A China tornou-se o centro de produção industrial mundial, o centro da cadeia de fornecimento mundial. Superou os EUA e Alemanha como maior potência comercial do mundo. Superou o Japão e tornou-se a segunda maior economia do mundo e quase certamente passará os EUA, em termos de PIB agregado, antes do fim da década. Naturalmente, em PIB per capita, a China ainda continua relativamente pobre; de acordo com o Fundo Monetário Internacional (FMI), em termos nominais, a China ocupava a 88ª posição (entre 183 países). Ainda assim, a China viu 600 milhões de pessoas saírem da linha da pobreza nos últimos 20 anos; uma crescente urbanização e a ascensão meteórica da classe de "renda média", atualmente estimada em 350 milhões de pessoas, com projeções de que poderá chegar a 1 bilhão em 20 anos.
Desde o abandono das expedições marítimas de Zheng He até recentemente, a China estava voltada para dentro. Fracassou (ao contrário do Japão) em adaptar-se aos desafios da industrialização e imperialismo que emanavam do Ocidente no século XIX. Embora Mao tenha conquistado a independência política da China, seu regime seguiu um regime de autarquia econômica.
Em 1978, a liderança chinesa, sob o comando de Deng Xiaoping, decidiu, nas palavras do economista Zheng Bijian, acolher a globalização. O resto, como se costuma dizer, é a história dos últimos 30 anos e é algo que marcará as próximas décadas. A revolução mundial sinocêntrica realmente está apenas em seu início. (Tradução de Sabino Ahumada).
(*) Angus Maddison, The World Economy: a Millennial Perspective.

As razões da impunidade

O Estado de S. Paulo - 06/07/2012
Levantamento da Estratégia Nacional de Justiça e Segurança Pública (Enasp), divulgado recentemente, mostra que a polícia vem prendendo mais, mas os inquéritos não são conclusivos, os crimes mais violentos continuam não sendo esclarecidos e a maioria das investigações é arquivada. A Enasp é uma parceria entre o Ministério da Justiça, o Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) e o Conselho Nacional de Justiça (CNJ).
Até a formação dessa parceria, o Executivo, o Ministério Público e o Judiciário não tinham conhecimento do número de inquéritos criminais existentes no País. Após a criação de um banco nacional de dados, a Enasp passou a estabelecer metas de produtividade para as procuradorias-gerais de Justiça e para as varas de execução criminal.
No ano passado, foram fixadas cinco metas. O relatório recém-divulgado trata da Meta 2, cujo objetivo era concluir, em abril de 2012, todos os 92 mil inquéritos sobre assassinatos instaurados no País até 31 de dezembro de 2007 e ainda pendentes. O levantamento da Enasp revela que só 32% da meta foi atingida. Mesmo assim, o resultado foi comemorado pelo Ministério da Justiça, pelo CNMP e pelo CNJ. Antes da Meta 2, o índice de conclusão dos inquéritos de homicídio doloso abertos até 2007 variava entre 5% e 8%.
Segundo o levantamento, dos 135 mil inquéritos relativos a homicídios dolosos instaurados até dezembro de 2007, apenas 43 mil foram concluídos. Destes, só pouco mais de 8 mil foram convertidos em processos judiciais. O estudo também mostra que mais de 80% dos inquéritos relativos a homicídio doloso - em que há intenção de matar - foram arquivados. O arquivamento decorreu da prescrição dos crimes, da falta de identificação de autoria, da falta de provas e da morte dos assassinos. "Muitos inquéritos incluídos na Meta 2 sequer tinham o laudo cadavérico feito. Colocá-los para andar já é motivo de comemoração", diz Taís Ferraz, conselheira do CNMP, coordenadora do Grupo de Persecução Penal da Enasp e uma das responsáveis pelo aperfeiçoamento do Inquerômetro 2.0. Trata-se de um sistema eletrônico desenvolvido pelo Ministério Público de Rondônia e pelo CNMP que permite o acompanhamento, em todo o País, do andamento, das diligências pendentes e da conclusão dos inquéritos criminais. Com um banco de dados alimentado mensalmente por informações enviadas pelos Estados, o Inquerômetro 2.0 também divulga um ranking estadual com relação ao cumprimento de metas de produtividade fixadas pela Enasp.
Graças a esse sistema se pode verificar que em Alagoas foi extraviado mais de mil dos 4.180 inquéritos instaurados entre 1990 e 2007. "A Polícia Civil não conseguiu informar onde estão e qual o destino que tomaram", diz a promotora Karla Padilha. Segundo o Mapa da Violência do Ministério da Justiça, Alagoas é o Estado mais violento do País, com 66,8 homicídios por 100 mil habitantes.
Pelas estatísticas do Inquerômetro 2.0, Alagoas também é o Estado nordestino com pior desempenho em matéria de conclusão de inquéritos criminais. Durante a Meta 2, a polícia alagoana só conseguiu concluir 14,9% dos inquéritos desse tipo instaurados até 2007. O Estado que registrou a produtividade mais baixa foi Minas Gerais, onde foi concluído apenas 1,9% dos inquéritos relativos a esse tipo de crime. Somente o Acre atingiu os 100% da meta fixada pela Enasp. Em São Paulo, o índice foi de 46,7%.
Segundo os coordenadores da Enasp, o alto índice de arquivamento dos inquéritos sobre homicídio doloso se deve a vários fatores. Por exemplo, 12 Estados não preenchem há anos os cargos vagos da Polícia Civil; em 14 faltam equipamentos para perícia; em 15 as delegacias não têm condições mínimas de trabalho; e em 5 elas não têm computadores e acesso à internet, o que obrigou o CNMP a fazer contagem manual dos inquéritos parados em delegacias. O próximo relatório da Enasp, que será divulgado em outubro, versará sobre as metas relativas à pronúncia dos réus e ao julgamento das ações penais..

sábado, 7 de julho de 2012

Finlândia ameaça deixar a zona do euro

AE - Agência Estado

A ministra de Finanças da Finlândia, Jutta Urpilainen, afirmou que o país pode considerar deixar a zona do euro para não ter de pagar pelas dívidas de outros membros do bloco. "A Finlândia está comprometida a continuar sendo um membro da zona do euro, e nós achamos que o euro é útil para a Finlândia. Mas não vamos nos agarrar ao euro a qualquer custo e estamos preparados para todos os cenários", comentou ela em uma entrevista para o jornal econômico Kauppalehti.


A ministra destacou que a Finlândia, um dos poucos países da zona do euro que ainda tem o rating máximo triplo A, não vai concordar com um modelo de integração no qual os países sejam coletivamente responsáveis pelas dívidas e riscos uns dos outros. Ela também afirmou que uma união bancária na região não vai funcionar se for baseada em compartilhamento de dívidas. "Responsabilidade coletiva pela dívida, economia e riscos de outros países; não é para isso que nós deveríamos estar preparados".

Em outra entrevista, para o jornal Helsingin Sanomat, Urpilainen reconheceu que a Finlândia "representa a linha dura" quando se trata dos resgates econômicos na zona do euro. "Nós somos construtivos e queremos resolver a crise, mas não sob quaisquer termos", comentou.

Nos últimos dias a Finlândia informou que vai começar a negociar com a Espanha para obter colaterais pela sua participação no resgate para os bancos espanhóis, que será liberado pela União Europeia. O país também se mostrou contra a proposta de usar o Mecanismo de Estabilidade Europeu (ESM, na sigla em inglês) para comprar bônus de governos problemáticos do bloco.

No ano passado, a Finlândia criou uma grande dificuldade durante as negociações para a liberação do segundo pacote de resgate para a Grécia. O país só aceitou participar do socorro internacional quando conseguiu que o governo grego lhe oferecesse garantias. As informações são da Dow Jones..

sexta-feira, 6 de julho de 2012

Capitalismo (de novo) em crise

Autor(es): Samuel Brittan
Valor Econômico - 06/07/2012
"As pessoas da mesma profissão raramente se reúnem, seja para festejos ou diversão, mas quando isso ocorre, a conversa sempre termina em uma conspiração contra o público ou em algum artifício para aumentar preços. É, de fato, impossível impedir tais reuniões com qualquer lei que possa ser executada e que, ao mesmo tempo, seja consistente com a liberdade e justiça. Mas, embora a lei não possa impedir as pessoas da mesma profissão de se reunirem de vez em quando, não deve fazer nada para facilitar tais encontros e muito menos torná-los necessários." Adam Smith, A riqueza das nações
Sendo um dos poucos comentaristas que sempre defendeu o capitalismo de mercado competitivo, preciso perguntar-me algumas questões. Além dos escândalos como o da manipulação da taxa interbancária do mercado de Londres (Libor), tivemos o comportamento dos bancos antes da grande recessão; a tendência a uma concentração muito maior de renda e riqueza, espremendo os padrões de vida dos cidadãos comuns; e seria possível continuar com muito mais. Se alguém, no entanto, estiver esperando que eu faça uma convocação a favor de uma maior participação e supervisão do Estado, ficará desapontado.
Encabeçando os argumentos pelos mercados competitivos está a promoção à liberdade de escolha. Também ajudaram a gerar o maior aumento de riqueza na história da humanidade. Em sua forma ideal, têm uma tendência igualitária. Não uma igualdade literal de condições ou mesmo de oportunidades, mas uma tendência a que rendas excepcionalmente grandes sejam corroídas por novos participantes e a criar escadas que os mais ambiciosos podem subir. Isso, às vezes, é chamado de "o sonho americano", mas sua atratividade não é limitada geograficamente. Existiram vários esboços para uma economia de mercado não capitalista, mas apesar de alguns êxitos de cooperativas de trabalhadores, enquanto sistemas econômicos, eles continuaram apenas como esboços.
A "reforma" financeira com a lei Dodd-Frank tinha 2.139 páginas e ficou conhecida como a "Lei do Pleno Emprego para Advogados e Consultores". A complexidade serve para esconder as lacunas. E não se pode esperar que políticos gostem de abolir todos os subsídios
O que, então, saiu errado? Em termos gerais, é difícil ir além de Adam Smith. Poucos de nós gostam de concorrência; e a tendência a formar grupos coesos para manter forasteiros à margem é tão antiga quanto a raça humana. Como exemplo pré-capitalista, basta lembrar-se das guildas medievais, seja de artesãos ou de mestres-cantores. Mais sutis são as práticas de banqueiros, já que vêm disfarçadas como serviços para os clientes. Em resumo, o sucesso depende mais de quem se conhece e não do que se conhece. Daí os termos "capitalismo clientelista ou de compadres".
Um exemplo pungente é mostrado por Luizi Zingales, em seu recente livro, "A Capitalism for People" (Um capitalismo para as pessoas, em inglês). Ele foi aos Estados Unidos para escapar do capitalismo de compadres em sua Itália natal, onde as perspectivas dependiam quase inteiramente de ter os contatos adequados e de não perturbar as autoridades. Depois de 24 anos nos Estados Unidos, no entanto, ele está angustiado por ter encontrado uma nova versão de capitalismo clientelista alcançando-o lentamente. Os negócios modernos são complexos demais para permitir que muitos outros Henry Ford ou Bill Gates conquistem seu caminho. Também está a "captura" dos órgãos de regulamentação por aqueles que supostamente deveriam ser fiscalizados. Tudo isso, contudo, é auxiliado e instigado pela corrupção do sistema político, com um dos exemplos mais graves sendo a recente decisão da Suprema Corte dos EUA de conceder direitos quase ilimitados para intervenções de empresas no processo eleitoral.
Vou me arriscar a entrar em polêmica ao destacar que vejo processos similares, embora mais sutis, na União Europeia (UE). Um grupo, de políticos e autoridades que selecionam a si próprios, promoveu uma forma de integração burocrática e intrusiva, na qual os integrantes raramente consultam seus eleitorados. O que todas as formas de clientelismo têm em comum é a paixão pelo sigilo e o ódio pelas discussões abertas. A primeira vez que vi isso foi com as tentativas oficiais para abafar as discussões sobre a possibilidade de desvalorização no Reino Unido antes de 1967, ano em que isso acabou acontecendo. Mais recentemente, no entanto, me deparei com o mesmo quando um diretor de um dos vários órgãos bancários da UE, em geral, muito sensato, me disse sob completo sigilo que qualquer ruptura do euro era inimaginável e indiscutível.
A mais interessante das reformas sugeridas por Zingales é a redução em complexidade. A "reforma" financeira com a lei Dodd-Frank nos EUA em 2010 tinha 2.139 páginas e ficou popularmente conhecida como a "Lei do Pleno Emprego para Advogados e Consultores". A complexidade serve para esconder as lacunas. E não se pode esperar que nenhum político goste da proposta de Zingales de abolir todos os subsídios a setores produtivos. Medidas para limitar os grupos lobistas são tão importante quanto.
O maior obstáculo para a reforma é que os envolvidos podem devotar tempo e energia para manter suas posições. Para os cidadãos comuns, a reforma política é um espetáculo secundário que dificilmente compensa esses esforços. Os protestos nos centros financeiros têm boas intenções, mas são tentativas mal direcionadas para anular essa propensão.
Ainda assim, "nil desperandum", nunca se desespere. As "leis do milho" no Reino Unido foram derrubadas e as leis antitruste nos EUA, aprovadas; e, com o tempo, tanto financistas como "eurocratas" serão derrubados. (Tradução de Sabino Ahumada)
Samuel Brittan é comentarista econômico do FT desde 1966. Foi condecorado cavaleiro em 1993 por "serviços ao jornalismo econômico", mesmo ano em que se tornou "Chevalier de la Legion d"Honneur"..

A herança maldita na Petrobras

Autor(es): Sérgio Guerra
O Globo - 05/07/2012
Primeiro plano de negócios (2012-2016) divulgado pela atual presidente da Petrobras, Graça Foster, não deixa margem para qualquer dúvida: o desempenho da estatal vem retrocedendo desde que o PT chegou ao poder, em 2003.
Depois de verificar que a empresa não vinha cumprindo as metas de produção estabelecidas, Graça Foster decidiu rever esses números para um patamar que definiu como mais "realista", deixando clara sua reprovação em relação à herança - por que não dizer maldita - recebida de seu antecessor, Sérgio Gabrielli.
Ao reconhecer o atraso em mais de um ano na operação de novas plataformas, a presidente da estatal baixou em 700 mil barris de petróleo por dia a estimativa de aumento da produção até 2020.
Essa parece ser a primeira de uma série de mudanças na gestão da estatal, que ao longo dos dois mandatos do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva sofreu forte pressão política e acabou tendo parte de seus cargos técnicos e diretorias dividida entre aliados da base governista.
A interferência política na gestão da Petrobras ficou bastante clara em 2007, após a descoberta do campo de Tupy no pré-sal e da decisão do governo Lula de alterar o marco regulatório do petróleo - de comprovado sucesso formulado e implementado no governo do PSDB - em meio a uma intensa campanha publicitária vinculada ao projeto eleitoral do PT, em 2010, que acabou garantindo a eleição de Dilma Rousseff.
O resultado desta "reforma da reforma" foi um desastre para o setor e para a Petrobras.
Aos poucos os prejuízos estão sendo percebidos e contabilizados. Graça Foster tenta consertar a irracionalidade e o aparelhamento partidário dentro da empresa na medida do possível, mas o setor foi desorganizado e o modelo institucional perdeu bastante credibilidade.
Sob a batuta de Fernando Henrique, com a flexibilização do monopólio da Petrobras, uma atuação firme da Agência Nacional do Petróleo (ANP) e a realização de leilões anualmente, o Brasil viu sua produção de petróleo crescer em 150%.
Com a suspensão dos leilões desde 2008, deixamos de arrecadar algo em torno de R$ 15 bilhões nos últimos quatro anos.
Além disso, a área exploratória sob concessão, que alcançou um máximo de 341 mil km² em 2009, será reduzida para 114 mil km² no final de 2012, em razão da falta de novos leilões, o que deverá comprometer ainda mais a produção futura de petróleo no país.
Os investimentos privados definham, as empresas estrangeiras vão embora e a Petrobras e a OGX se desvalorizam.
Só na semana passada, os acionistas da Petrobras amargaram uma perda de R$ 22,3 bilhões.
Esse processo de desvalorização começou em 2009, quando o governo iniciou uma operação de capitalização da Petrobras que se mostrou desastrosa para o acionista minoritário.
Além de demorar mais de um ano, devido a uma série de indefinições e de uma total politização de todo o processo, provocou uma desvalorização de 43% nas ações da empresa desde então.
Com isso, fica cada vez mais distante o sonho da autossuficiência na produção de petróleo.
Os números falam por si: a importação de gasolina, por parte do Brasil, passou de nove mil barris diários em 2010 para 80 mil, de acordo com as estimativas previstas para este ano.
Se não bastasse, estamos também importando diesel e etanol..

Vitória no Chiqueiro!!!

O Palmeiras esteve bastante apático no jogo de hoje. Não conseguiu se organizar defensivamente, tampouco articulou-se ofensivamente. O Coritiba por sua vez levava bastante perigo, mas pecava ao finalizar.
A defesa palmeirense sofria nas descidas de Rafinha e Everto Ribeiro. Thiago Heleno e Maurício Ramos batiam cabeça sem parar e Marcos Assunção precisou de táxi para fazer a cobertura, e junto com o restante do meio campo não ganhava as 2ºs bolas. O ataque não conseguia se articular, com Valdívia tentando as escassas jogadas de criatividade e o Coxa exercia uma boa marcação pressão. Quando a bola chegava ao ataque Betinho não conseguia segurar a bola e Mazinho ficou encaixotado na marcação.
O 2º tempo do Palmeiras foi melhor, mais compacto, marcando mais a frente e distribuido de forma mais consciente em campo tentando aproveitar os contra-ataques quando o Coritiba se abriu com Tcheco e Linconl em busca do gol já na 2º etapa. Bem a cara do copeiro do Felipão.
Everton Ribeiro descia em facão da esquerda para o meio e Rafinha pela direita estavam à vontade na Arena Barueri. O grande problema é que uma equipe não pode, sob hipótese alguma, perder tantos gols como o Coritiba perdeu, mais ainda em se tratando de uma final de campeonato nacional. Pecar nessa hora costuma ser fatal.
E foi.
A volta pode ser diferente, mas o Palmeiras carrega consigo boa vantagem para o Couto Pereira.