segunda-feira, 30 de abril de 2012

Espanha tenta conter expectativa ruim

Pode ser só um devaneio meu, mas a Espanha pode estar dando o 1º dos muitos necessário para se tornar uma economia competitiva!


Autor(es): Por Jonathan House e David Román | The Wall Street Journal, de Madri
Valor Econômico - 30/04/2012
 

A Espanha tomou tomou medidas para sustentar a confiança na debilitada economia local após a divulgação de dados que mostraram que a taxa de desemprego está no patamar mais alto dos últimos 18 anos, no vácuo do rebaixamento em dois graus da nota de dívida do país pela agência de classificação de risco Standard & Poor"s.
O desemprego no país subiu para 24,4% no primeiro trimestre, após ficar em 22,9% no quarto trimestre do ano passado, atingindo o nível mais alto já registrado. Mais de metade dos trabalhadores com menos de 25 anos estão sem emprego. A última vez que o desemprego na Espanha bateu nesse patamar foi em 1994, quando chegou a 24,6% no primeiro trimestre.
"A situação está terrível para todos e terrível para o governo", disse o ministro das Relações Exteriores, José Manuel Garcia-Margallo, em entrevista de rádio. "A Espanha tem estado, e está, em uma crise de enormes proporções."
O mercado de trabalho espanhol foi fortemente atingido pelo colapso de setor imobiliário, após uma década de forte crescimento, e pelos cortes no orçamento que tiraram dezenas de bilhões de euros da economia. Além disso, rígidas leis trabalhistas tornam mais fácil demitir funcionários do que reduzir seus salários ou rever suas funções. A taxa de desemprego espanhola é mais que o dobro da média da zona do euro, de 10,7%, e afeta cerca de 5,6 milhões de pessoas.
Como reação à piora do cenário econômico e financeiro da Espanha, a S&P rebaixou na noite de quinta-feira a dívida do governo espanhol de A para BBB+. A S&P citou a piora além do esperado da trajetória do orçamento do país desde o ano passado e o aumento do risco de o governo ter de socorrer o setor bancário, atingido por perdas do setor imobiliário.
O governo do premiê Mariano Rajoy tem lutado, desde que assumiu, em dezembro, para sanear a quarta maior economia da zona do euro, por meio de cortes draconianos no orçamento, reforma do mercado de trabalho e uma limpeza nos bancos em dificuldades.
Apesar da expectativa de que as medidas estimulem a economia no longo prazo, muitos analistas creem que elas causam prejuízos no curto prazo, prejudicando a produção, piorando a confiança dos investidores e elevando o risco de o governo tenha de recorrer a um resgate internacional.
O rebaixamento da S&P e as más notícias do desemprego inflaram o temor dos investidores com a Espanha, desencadeando a liquidação de débitos do governo. O rendimento do título de dez anos do governo espanhol fechou a 5,87%, 0,07 ponto acima de quinta-feira, segundo dados da Tradeweb. Os swaps de crédito de cinco anos estavam 11 pontos-base maiores, a 480 pontos base, segundo o serviço financeiro Markit. Apesar de investidores também terem inicialmente vendido ações espanholas, a bolsa conseguiu fechar em alta.
O vice-ministro das Finanças espanhol, Fernando Jiménez Latorre, disse que a ação da S&P "focou apenas nos efeitos imediatos" das reformas, que não serão positivos. "A S&P não está levando em conta o total impacto das reformas que estamos fazendo", acrescentou.
Na Alemanha, o ministro das Finanças, Wolfgang Schäuble, deu apoio à Espanha, criticando a mudança na nota da S&P. Disse que ela prejudica os esforços do governo espanhol para ajustar suas finanças. "A decisão torna ainda mais crítica uma situação que já é crítica", disse Schäuble à rádio WDR.
Em entrevista, o ministro das Finanças espanhol, Luis de Guindos, citou o forte crescimento das exportações do país e a redução do historicamente alto déficit em conta corrente como evidências de melhora na competitividade da Espanha. "Isso mostra que a economia espanhola é competitva, ao contrário de algumas outras economias europeias", disse. "Esse é o mais importante elemento de otimismo para o futuro."
Analistas dizem que empresas espanholas estão começando a se tornar mais competitivas à medida que reduzem seus níveis de pessoal e obtêm mais sucesso nos acordos salariais com sindicatos.
Guindos falou após reunião na qual o governo assinou o relatório econômico anual que deve ser submetido à União Europeia. O chamado Programa de Estabilidade prevê que o PIB da Espanha vai crescer 0,2% em 2013 e 1,4% em 2014, após recuar 1,7% em 2012, e que o desemprego cairá para 24,2% em 2013. O crescimento será puxado principalmente pela exportação, com a demanda doméstica ainda sob pressão, já que empresas e famílias tentam administrar a enorme dívida acumulada na década de boom imobiliário.
O relatório estima que a dívida pública atingirá o pico de 82,3% do PIB em 2013, caindo a 81,5% em 2014. Guindos disse que o governo quer ainda elevar impostos indiretos em 2013, o que gerará uma arrecadação adicional de € 8 bilhões.

quinta-feira, 26 de abril de 2012

Recessão britânica põe austeridade na berlinda

Valor Econômico - 26/04/2012
 

O Reino Unido entrou tecnicamente em uma nova recessão ontem, no momento em que cresce o temor com o agravamento da crise na Europa e com suas consequências sobre as políticas de austeridade dos países da região.
Segundo números divulgado ontem pelo Escritório Nacional de Estatísticas do país, o economia britânica apresentou contração de 0,2% no primeiro trimestre deste ano, em comparação ao período anterior. Nos últimos três meses de 2011, a economia britânica já havia encolhido 0,3%. Uma queda do PIB por dois trimestres consecutivos configura recessão.
O mau desempenho da economia dá munição a opositores das contra as medidas de austeridade promovidas pelo ministro das Finaas, George Osborne. Essas medidas incluem um programa agressivo de elevação de impostos e corte de gastos, com o objetivo de reduzir o déficit público.
Também aumentam as pressões por mais medidas de estímulo tanto do Banco da Inglaterra (o BC britânico) como do Banco Central Europeu (BCE), para ajudar as debilitadas economias da zona do euro - importantes parceiros do Reino Unido e cuja crise foi apontada pelo governo britânico como um dos motivos para a retração de seu PIB.
Ao comentar a possibilidade de mais estímulo, o presidente do BCE, Mario Draghi, mencionou a possibilidade de apoiar um pacote que promova reformas estruturais e aumente a competitividade. Ele disse, porém, que os governos devem se manter fiéis aos seus planos de austeridade fiscal.
O premiê britânico, David Cameron, por sua vez, afirmou que abandonar a política de austeridade causaria uma perda de confiaa nos investidores internacionais, levando o país a pagar juros mais altos por empréstimos. "Nós estamos lidando com uma situação muito complicada que, francamente, ficou ainda mais complicada", disse. "Mas a solução para uma crise da dívida não pode ser mais dívida."
Em discurso ao Parlamento britânico ontem, Cameron disse que a contração de 0,2% do PIB no primeiro trimestre, "muito decepcionante", é resultado do peso dos níveis históricos de endividamento sobre a economia.
Somada ao desempenho de outros países, a notícia de recessão no Reino Unido sugere que as economias europeias ainda estão longe de encontrar um caminho para o crescimento sustentável, após um período de leve recuperação, classificada como "frágil" pelo FMI (Fundo Monetário Internacional).
Nesta semana, a Espanha anunciou que também entrou em recessão, após seu PIB ter se contraído 0,4% no primeiro trimestre e 0,3% no período anterior. Indicadores regionais da indústria, como o Índice de Gerentes de Compras (PMI, em inglês), sugerem que toda a zona do euro pode estar novamente entrando em recessão.
A última vez em que o Reino Unido havia entrado em recessão foi no auge da crise financeira global, em 2008, da qual saiu no terceiro trimestre de 2009, depois de cinco trimestres consecutivos de contração

Desindustrialização e a ortodoxia

Autor(es): José Luis Oreiro
Valor Econômico - 26/04/2012
 

Recentemente alguns expoentes do pensamento ortodoxo ainda prevalecente no Brasil trouxeram à baila a velha cantilena de que a injustiça social reinante em nosso país é resultado das políticas desenvolvimentistas em voga desde a era Vargas, que protegeram o setor industrial, atuando assim como catalizador de um processo injusto de redistribuição de renda da maioria da sociedade para alguns poucos setores privilegiados da economia brasileira. O governo da presidente Dilma Rousseff estaria, portanto, reeditando os erros do passado ao adotar medidas de proteção da indústria nacional, as quais só irão gerar ineficiência na alocação de recursos e piora na distribuição de renda.
Ainda segundo os representantes de nossa ortodoxia, a industrialização só se justificaria com base na tese da "deterioração secular dos termos de troca", ou seja, num contexto em que os preços dos bens primários apresentam uma tendência secular de redução comparativamente aos preços dos bens industriais. Como nos últimos anos os preços dos bens agrícolas têm aumentado relativamente aos preços dos bens industriais, então a indústria teria perdido a sua funcionalidade para o desenvolvimento de países como o Brasil.
Por fim, os paladinos da ortodoxia argumentam que a desvalorização cambial requerida para devolver a competitividade da indústria brasileira, se factível, levaria a uma redução permanente do salário real dos trabalhadores, sendo assim incompatível com os interesses das classes trabalhadora.
Essa argumentação da ortodoxia é falaciosa, pois se baseia em premissas incorretas e/ou em interpretações equivocadas a respeito dos fundamentos do pensamento desenvolvimentista.
Primeiramente, devemos ressaltar que atribuir à industrialização a culpa pela péssima distribuição de renda prevalecente em nosso país é, no mínimo, desconhecer a história do Brasil. Para vergonha de todos os brasileiros, nosso país foi o último lugar do mundo a acabar com a escravidão, ao final do século XIX, e isso por uma iniciativa pessoal do imperador D. Pedro II e de sua filha, a princesa Isabel (o que lhes custou o fim da monarquia). Além disso, a estrutura fundiária prevalecente no Brasil, definida desde os tempos das capitanias hereditárias, era (e ainda é) altamente concentrada.
Num contexto em que a propriedade era concentrada nas mãos de poucos e onde até quase o final do século XIX a esmagadora maioria da força de trabalho não recebia qualquer tipo de remuneração, não é de estranhar que a distribuição de renda seja altamente concentrada na forma de rendimentos de propriedade (lucros, aluguéis, renda da terra) e, portanto, nas mãos de uma pequena minoria da população.
Ainda que desconsideremos as causas históricas da concentração de renda no Brasil, deve-se ter em conta que nas fases iniciais do processo de desenvolvimento econômico, quando a mão de obra é transferida dos setores de baixa produtividade (agricultura e mineração) para os setores de alta produtividade (indústria), os salários reais tenderão a crescer abaixo da produtividade do trabalho devido ao excesso estrutural de força de trabalho.
Nessas fases iniciais do processo de desenvolvimento, a participação dos salários na renda tende a permanecer estagnada ou a cair, o que gera uma tendência a concentração da distribuição pessoal da renda. Essa tendência à concentração de renda será revertida quando a economia alcançar o chamado "ponto de Lewis", ou seja, quando o "exército industrial de reserva" for esgotado devido ao desenvolvimento das forças produtivas do capitalismo industrial. Isso requer o término do processo de migração rural-urbano e a absorção da mão de obra existente pelos setores modernos da economia.
Em segundo lugar, a defesa da industrialização não depende unicamente da validade da "tendência a deterioração dos termos de troca". Com efeito, a indústria é o motor de crescimento de longo-prazo das economias capitalistas por ser a fonte das economias estáticas e dinâmicas de escala, o setor que possui os maiores encadeamentos para frente e para trás na cadeia produtiva e ser a fonte ou o principal difusor do progresso técnico para o restante da economia. Nesse contexto, abrir mão da indústria significa condenar o país a um crescimento medíocre, se tanto, no longo prazo.
Em terceiro lugar, é verdade que a desvalorização da taxa real de câmbio produz uma redução do salário real, mas essa redução é apenas de caráter temporário. Isso porque se a desvalorização cambial for bem-sucedida, ela será capaz de, a médio e longo prazo, restaurar a dinâmica da economia, acelerando o crescimento do produto e da produtividade do trabalho. Se o ponto de Lewis tiver sido alcançado isso permitirá um crescimento mais rápido dos salários reais, fazendo com que, num intervalo curto de tempo, os trabalhadores mais do que compensem as perdas salariais.
Por fim, a desvalorização cambial não requer unicamente um aumento do superávit primário como afirmam os expoentes de nossa ortodoxia. Como boa parte da apreciação cambial brasileira deve-se à doença holandesa, a introdução de um imposto sobre a exportação de commodities, à semelhança do que a Austrália fez recentemente, atuaria de forma decisiva na eliminação da sobrevalorização cambial.
José Luis Oreiro é professor do departamento de economia da Universidade de Brasília

quarta-feira, 25 de abril de 2012

Recessão mais profunda dificultará ajuste grego

A maioria das pessoas deve sentir um misto de pena e descrença no que está ocorrendo com os gregos. Chega a ser inacreditável. 5 anos de duras contrações econômicas e sem o menor sinal de melhoras nos anos vindouros.
Nunca vi um paciente terminal agonizar por tanto tempo...

Autor(es): Por George Georgiopoulos | Reuters, de Atenas
Valor Econômico - 25/04/2012

A economia grega vai se contrair 5% este ano, mais do que se esperava, disse ontem o presidente do banco central do país. Isso deve pressionar ainda mais a população, já afetada por cortes de gasto público e desemprego recorde.
A projeção superou a previsão anterior do BC, de março, de um contração do Produto Interno Bruto (PIB) de 4,5%, após uma queda de 6,9% em 2011. A Grécia, socorrida duas vezes, está em seu quinto ano consecutivo de recessão.
Falando na assembleia anual do BC, George Provopoulos, também membro do Conselho Diretor do Banco Central Europeu, exortou o cumprimento rigoroso das reformas e do ajuste fiscal que a Grécia acertou com seus parceiros da zona do euro, afirmando serem necessários para a economia voltar a um crescimento sustentável.
Atenas está sob pressão por mais austeridade fiscal, para fortalecer suas finanças, como parte do novo pacote de socorro acertado este ano com os parceiros da zona do euro e com o FMI para evitar um calote caótico. A manutenção do financiamento ao país no âmbito do pacote € 130 milhões depende do cumprimento das metas.
Provopoulos advertiu que a participação da Grécia na zona do euro estará em jogo caso o país não cumpra suas promessas, especialmente após as eleições nacionais no próximo mês. "Se, após a eleição, surgirem dúvidas sobre o novo governo e o empenho da sociedade para implementar o programa, as atuais perspectivas favoráveis serão revertidas", disse ele.
A Grécia deverá eleger um novo governo em 6 de maio. Os dois principais partidos da atual coalizão não parecem em condições de assegurar uma maioria no Parlamento, segundo as últimas pesquisas. Quem vencer terá de concordar com cortes adicionais de gastos equivalentes a 5,5% do PIB, ou cerca de € 11 bilhões, para 2013-14, e arrecadar mais € 3 bilhões em impostos para continuar recebendo ajuda, disse o FMI.
Em 2011, a Grécia reduziu o seu déficit público em 1,2 ponto, para 9,1% do PIB, e tem como meta um déficit de 6,7% este ano. Medidas de austeridade, como aumento dos impostos de renda e sobre propriedades, elevação de alíquotas do imposto sobre valor agregado e corte de salários e aposentadorias, ajudaram a baixar o déficit, que chegou a 15,6% em 2009.

Muito antes de Keynes

Autor(es): José Luís Fiori
Valor Econômico - 25/04/2012
 

O "milagre econômico inglês", que deu origem ao capitalismo moderno, começou no século XVII, muito antes da chamada "revolução industrial". De forma aproximada, se pode dizer que seu início ocorreu entre a "República de Cromwell" (1649-1659) e o reinado de Guilherme III, o "rei holandês", que governou a Inglaterra entre 1689 e 1702. Cromwell aumentou o poder naval da Inglaterra, fez guerra e venceu a Holanda (1652-1654) e a Espanha (1654-1660), as duas grandes potências marítimas do século XVII, e conquistou a ilha da Jamaica, em 1655, criando a primeira colônia do futuro Império Britânico. Além disso, Cromwell editou, em 1651, o 1º Ato da Navegação, que fechou os portos ingleses aos navios estrangeiros e se transformou no primeiro ato mercantilista agressivo da Inglaterra, fechando as fronteiras de sua economia nacional.
Três décadas depois, Guilherme III enfrentou e venceu a França na Guerra dos 9 Anos (1688-1697), iniciou a Guerra da Sucessão Espanhola (1702-1712) e conquistou e submeteu Irlanda e Escócia. Ao mesmo tempo, no campo econômico, promoveu uma "fusão revolucionária" das instituições financeiras holandesas - que eram mais avançadas - com as finanças inglesas, criando o Banco da Inglaterra e um novo sistema de financiamento da dívida pública inglesa, atrelado à bolsa de valores e ao sistema de crédito da banca privada. Uma "revolução financeira" que deu à Inglaterra um poder de fogo econômico e militar - em qualquer lugar do mundo - muito superior ao das demais potências europeias.
Foi nesse período que William Petty (1623-1687) - o pai da economia política clássica - escreveu dois ensaios que revolucionaram o pensamento econômico do século XVII: o "Tratado sobre Impostos e Contribuições", publicado em 1662, e a "Aritmética Política", publicado depois da sua morte, em 1690. No momento em que Petty publicou sua obra, a Inglaterra ainda era uma potência de segunda ordem e se sentia cercada pela Holanda, Espanha e França. Essa era sua preocupação fundamental, quando formulou o conceito de "excedente econômico", e estabeleceu uma relação direta entre o tamanho desse "excedente" e o poder internacional de cada país.
O que Petty não propôs nem previu, foi que a Inglaterra virasse uma potência agressiva, e que seu expansionismo se transformasse num motor fundamental para o próprio crescimento do "excedente interno" da economia inglesa, consagrando uma estratégia desenvolvimentista pioneira na história do capitalismo.
Basta dizer que a Inglaterra participou de 110 guerras - entre 1650 e 1950 - dentro e fora da Europa, e financiou esse seu expansionismo bélico, depois da "revolução financeira" de 1690, com a sua "dívida pública" que cresceu de 17 milhões de libras em 1690, para 700 milhões em 1800, sem perder, em nenhum momento, a sua "credibilidade" nacional e internacional.
Resumindo e apressando a história, já é possível identificar alguns traços fundamentais e específicos desse "desenvolvimentismo inglês":
1) O desenvolvimento inglês foi ligado umbilicalmente à expansão do poder internacional da Inglaterra, e essa expansão foi muito importante para o aumento da "produtividade" e do "excedente" da economia inglesa.
2) Nesse contexto, pode se entender porque as guerras e a "preparação para a guerra" ocuparam um lugar tão importante no desenho estratégico do desenvolvimentismo do estado e dos capitais ingleses.
3) O expansionismo inglês nunca foi liderado pela indústria ou pela burguesia industrial, e sim pelas suas elites ligadas à terra, às armas e às finanças.
4) A estratégia de desenvolvimento da Inglaterra seguiu sendo basicamente a mesma, antes e depois da crítica ao mercantilismo, da economia política clássica, e também, antes e depois da "revolução industrial".
5) O próprio protecionismo de Cromwell se manteve até o século XIX, e só foi abandonado depois que a Inglaterra já era a maior potência militar e econômica mundial.
6) A finança, a dívida pública e a imposição progressiva da libra como moeda do "território econômico supranacional" da Inglaterra, foram os principais instrumentos de poder responsáveis pelo sucesso internacional do capitalismo inglês.
7) Por fim, o desenvolvimentismo inglês não teria sido o mesmo sem a complementaridade dos EUA, que foi sua principal fronteira de expansão financeira, e depois se transformou no herdeiro direto desse mesmo modelo inglês de desenvolvimento e expansionismo contínuo.
Agora bem: esse "desenvolvimentismo inglês" é o único caminho possível de sucesso? Não. Ele pode ser seguido por qualquer país? Também não. De qualquer forma, o importante é entender que este foi o caminho seguido pelas duas maiores potências liberais da economia capitalista internacional.
(Vide: P.J. Cain and A.G. Hopkins, "British Imperialism, 1688-2000", Longman, London, 2001)
José Luís Fiori é professor titular do Programa de Pós-Graduação em Economia Política Internacional da UFRJ, e autor do livro "O Poder Global", da Editora Boitempo, 2007. Escreve mensalmente às quartas-feiras.

terça-feira, 24 de abril de 2012

A queda do Império Catalão!!!

O Barcelona veio com uma nova proposta, como era de se esperar do criativo Pep Guardiola. Veio num 3-4-3 numa espécie de losango: Piqué no miolo de zaga marcando possíveis bolas aéreas para Didier Drogba e a sobra, Mascherano e Puyol completando a defesa, o meio com Busquets, Fabregas a direita, Xavi a esquerda e Messi como homem de ligação do meio com o ataque e Cuenca pela direita, Iniesta pela esquerda e Sanchez no comando, os três últimos do ataque. As variações do jogo mandavam Fábregas inverter com Xavi, Sanchez passar para ponta esquerda, Messi ocupar o comando de ataque lançado do meio com Iniesta ocupando o lugar de meia de ligação que era do próprio Messi.
O Chelsea veio com uma formação rigorosamente igual ao outro jogo, um 4-5-1 em linhas, espremendo o meio campo do Barcelona entre as suas linhas de defesa.
Messi esteve apagado, mas o problema maior não foi ele ter perdido o penalti. A meu ver o problema maior do pequeno gênio é a falta de repertório de suas jogadas. Além das tabelas e triangulações na boca da área e da entrada em facão da direita para o meio, com ou sem a bola, para chute ou lançado, parece não restar outra jogada ao argentino. O catalães também mostraram que seu time é desse planeta cometendo um dos mais comuns dos erros de uma equipe que precisa do resultado: atacar desordenadamente!
Claro que o Barça desorganizado é bem mais organizado do que muitos times, mas os diversos chuveirinhos e Carles Puyol como centroavante ao final me surpreendeu negativamente, e o resultado disso foi o 2º gol dos blues. Não é que não possa se vencer na raça, mas sem organização as chances de vitória são menores que com ela. Vi em muitos jogos na temporada o Barcelona girar a bola e voltar até o seu goleiro para sair novamente jogando, com intuito de chamar a equipe adversária um pouco ao seu campo, descompacta-la e abrir um pouco mais de espaço. Dessa vez nãofez isso.
O time espanhol também pouco buscou as jogadas de linha de fundo e sua zaga novamente bateu cabeça (no gol de Ramires) e bateu também na cabeça, do Piqué.
Ao Chelsea restam os méritos de, mesmo com a bobagem de Terry, conseguir vencer uma equipe que cravou (e ainda pode continuar a escrever) seu nome na história do futebol.

O dia de hoje pode ser lembrado como o dia em que o Barcelona sucumbio, ou como o dia em que Ramires foi uma mistura de Daniel Alves na lateral e Messi naquele belíssimo gol por cobertura, marca registrada do argentino!!!

Lendas urbanas

Antonio Delfim Netto
Valor Econômico - 24/04/2012
 

Para dar a dimensão adequada a algumas lendas urbanas que dominam certas análises da situação atual da economia brasileira, é preciso, de início, combinar algumas coisas:
1) que o desenvolvimento social e econômico não se faz sem um Estado constitucionalmente controlado, com instituições adequadas e capacidade para regular os mercados, particularmente, o financeiro;
2) que o desenvolvimento econômico depende da quantidade e qualidade dos fatores de produção que o país dispõe, e que, em condições normais de pressão e temperatura, a importação é, também, um fator de produção;
3) que a velocidade do crescimento depende do volume e da qualidade do investimento e, portanto, da distribuição do PIB produzido entre consumo presente e o que se destina ao investimento, ou seja, ao emprego e ao consumo futuros;
4) que no regime democrático essa distribuição não é um fato econômico determinado pelo mercado. É um fato político determinado pela urna. No regime de sufrágio universal, as duas instituições se autocontrolam e determinam a velocidade do crescimento econômico e da inclusão social civilizatória;
5) que devido à finitude dos fatores de produção internos e do limite do crédito para financiar as importações, não é permanentemente possível maximizar, ao mesmo tempo, o crescimento econômico e a inclusão social sem produzir ou um aumento da taxa de inflação, que anula e torna uma ilusão a inclusão social, ou um déficit em conta corrente não financiável, que acaba matando ao mesmo tempo o crescimento e a inclusão. O problema é físico e não ilidível por mágicas monetárias, fiscais ou cambiais; e
6) que os atuais modelos econômicos, como confessou o ex-presidente do Banco Central Europeu Jean-Claude Trichet (em conferência feita em março, na Harvard´s Kennedy School), não lhe deram o menor conforto (e não nos dão!): "o estado da arte da macroeconomia foi praticamente inútil para lidarmos com a crise que se iniciou em 2007". Isso significa que devemos ter muito cuidado e grande humildade quando declaramos que as ações da política econômica e social do governo produzem "distorções" medidas com relação a modelos abstratos, dos quais obviamente não podemos extrair recomendações normativas.
A primeira lenda urbana é a frequente afirmação que "não há nada de errado com nossa taxa de câmbio, pois ela reflete apenas o resultado natural das nossas vantagens comparativas". No exemplo do livro escolar, cada país se especializa: o Brasil, por hipótese, em produtos agrominerais, e a China em produtos industriais. É esse o futuro que queremos para o Brasil? Os países podem construir vantagens comparativas, como foi o caso do Brasil no passado e é hoje na China.
Quem tem dúvida sobre isso não deve perder o WP/12/79, do FMI, "The Global Welfare Impact of China", de Giovanni, J.-Levchenko e Zhang, J., onde se afirma que "o mundo, inclusive os países desenvolvidos, fica muito melhor quando o crescimento chinês favorece os atualmente desvantajosos setores competitivos".
A segunda lenda urbana é que nosso BC teria abandonado a política de metas inflacionárias, o que, "dado à experiência histórica vivida até 1994, pode colocar-nos numa rota hiperinflacionária". É claro que num regime de câmbio flutuante, quando a taxa de juro real interna é igual à externa, a taxa de inflação mais conveniente é a que for igual à de nossos competidores. Mas não há qualquer evidência empírica sólida que uma taxa de inflação acidentalmente acima da meta de 4,5%, que continua a ser perseguida pelo BC, seja prejudicial ao crescimento e ao emprego.
A terceira lenda urbana, que perturba o sono de alguns ingênuos adoradores da religião da plena liberdade de comércio, é a que leva a sério a OMC e jura que toda taxa de câmbio é de equilíbrio. O que mais poderia ser, se é o mercado quem a determina? E ainda se atribui ao Brasil a prática de "terrível surto protecionista que, se seguido por outros países, colocará em risco o crescimento mundial".
Essa afirmação é desmontada com os dados do "Trade Tensions Mount: The 10th GTA Report", do Global Trade Alert, de novembro de 2011, que incluem as medidas de intervenção no comércio de 19 países. As "tensões no comércio internacional crescem", mas o Brasil não é um caso especial ou notório, como revela a tabela abaixo. Na coluna A, estão registrados os números de 11 países cujas medidas contrariam o interesse do país, e na coluna B, o número de países afetados por suas medidas, exclusive medidas antidumping, antissubsídios e de salvaguarda.
Vemos que o Brasil (até o terceiro trimestre de 2011) havia sido atingido por medidas tomadas em 66 países e, por sua vez, tomado medidas que atingiram 131 países. No caso da China, os números são, respectivamente, 75 e 193. Os números mostram que não há nada que possa nos incriminar como "poderosos destruidores do equilíbrio mundial"...
Antonio Delfim Netto é professor emérito da FEA-USP, ex-ministro da Fazenda, Agricultura e Planejamento. Escreve às terças-feiras

segunda-feira, 23 de abril de 2012

A Argentina tem razão


Esse texto é bastante interessante para fazermos uma análise de como funciona o discurso, a demagogia e a defesa pouco fundamentada. Existem diversos fios soltos no texto. É um risco natural que se corre ao tentar defender temas polêmicos. Vamos começar a destruir os argumentos?

1 - Não resta dúvida que é não só interessante, mas primordial para o crescimento de qualquer país, sobretudo numa conjuntura de preços das commodities disparados, que se domine setores considerados chaves, e sem dúvida que o petróleo é um deles. Ocorre que isso não credencia nenhum país a fazer isso "na mão grande". São diversas as questões prejudicadas, quase todas desembocando em insegurança jurídica. E o respeito aos contratos? o que vale então? É, por que o que impede o governo de sob pretextos cada vez menos plausíveis tome medidas parecidas? E agora, quem terá coragem de colocar dinheiro?
2 - Já se foi o tempo em que um país desenvolvido derrubava regimes democráticos, mas parece que chegamos ao tempo em que os governos democráticos derrubam questões consoliodadas na democracia. Salvaguardadas as proporções, qual a diferença entre os ocorridos?
3 - Qual país que conseguirá sobreviver competitivamente sem multinacionais numa economia ultraglobalizada? E, qual desses sobreviventes conseguirá tal façanha sem ser uma EUA da vida, supreprodutor de tecnologia, com altíssima produtividade por fator agregador de valor?
4 - O PIB brasileiro cresceu metade do que o da Argentina cresceu em dado período? Eu gosto muito do Bresser Pereira, mas isso chega a subestimar o leitor! Um pigmeu de 1m crescerá 100% e seu tamanho irá para 2m. Um gigante de 10m crescerá 10% e crescerá o mesmo 1m aumentando em 1/10 do percentual do outro!!!! Estatística simples e básica...
5 - Por fim, de tudo se precisa quando para tudo não se tem escala. Capital é um desses "tudo". As demais questões resvalam no que eu falei da tecnologia, e, longe de ser algo simples, mas é sim possível se trabalhar para transformar ações em reações.
A física ensina...

 São Paulo, segunda-feira, 23 de abril de 2012Mundo

Luiz Carlos Bresser-Pereira
A Argentina tem razão
Não faz sentido deixar sob controle estrangeiro um setor estratégico para o desenvolvimento do país
A Argentina se colocou novamente sob a mira do Norte, do "bom senso" que emana de Washington e Nova York, e decidiu retomar o controle do Estado sobre a YPF, a grande empresa petroleira do país que estava sob o controle de uma empresa espanhola. O governo espanhol está indignado, a empresa protesta, ambos juram que tomarão medidas jurídicas para defender seus interesses. O "Wall Street Journal" afirma que "a decisão vai prejudicar ainda mais a reputação da Argentina junto aos investidores internacionais". Mas, pergunto, o desenvolvimento da Argentina depende dos capitais internacionais, ou são os donos desses capitais que não se conformam quando um país defende seus interesses? E, no caso da indústria petroleira, é razoável que o Estado tenha o controle da principal empresa, ou deve deixar tudo sob o controle de multinacionais?
Em relação à segunda pergunta parece que hoje os países em desenvolvimento têm pouca dúvida.
Quase todos trataram de assumir esse controle; na América Latina, todos, exceto a Argentina.
Não faz sentido deixar sob controle de empresa estrangeira um setor estratégico para o desenvolvimento do país como é o petróleo, especialmente quando essa empresa, em vez de reinvestir seus lucros e aumentar a produção, os remetia para a matriz espanhola.
Além disso, já foi o tempo no qual, quando um país decidia nacionalizar a indústria do petróleo, acontecia o que aconteceu no Irã em 1957. O Reino Unido e a França imediatamente derrubaram o governo democrático que então havia no país e puseram no governo um xá que se pôs imediatamente a serviço das potências imperiais.
Mas o que vai acontecer com a Argentina devido à diminuição dos investimentos das empresas multinacionais? Não é isso um "mal maior"? É isso o que nos dizem todos os dias essas empresas, seus governos, seus economistas e seus jornalistas. Mas um país como a Argentina, que tem doença holandesa moderada (como a brasileira) não precisa, por definição, de capitais estrangeiros, ou seja, não precisa nem deve ter deficit em conta corrente; se tiver deficit é sinal que não neutralizou adequadamente a sobreapreciação crônica da moeda nacional que tem como uma das causas a doença holandesa.
A melhor prova do que estou afirmando é a China, que cresce com enormes superavits em conta corrente. Mas a Argentina é também um bom exemplo. Desde que, em 2002, depreciou o câmbio e reestruturou a dívida externa, teve superavits em conta corrente. E, graças a esses superavits, ou seja, a esse câmbio competitivo, cresceu muito mais que o Brasil. Enquanto, entre 2003 e 2011 o PIB brasileiro cresceu 41%, o PIB argentino cresceu 96%.
Os grandes interessados nos investimentos diretos em países em desenvolvimento são as próprias empresas multinacionais. São elas que capturam os mercados internos desses países sem oferecer em contrapartida seus próprios mercados internos. Para nós, investimentos de empresas multinacionais só interessam quando trazem tecnologia, e a repartem conosco. Não precisamos de seus capitais que, em vez de aumentarem os investimentos totais, apreciam a moeda local e aumentam o consumo. Interessariam se estivessem destinados à exportação, mas, como isso é raro, eles geralmente constituem apenas uma senhoriagem permanente sobre o mercado interno nacional.

sexta-feira, 20 de abril de 2012

Contradições do ativismo keynesiano brasileiro

Se as proposituras do ilustríssimo Nassif são razoavelmente interessantes, o mesmo não pode ser dito com relação a aplicabilidade. É fato que existem diversos teóricos, dos mais toscos aos mais elegantes, que explanam sobre medidas econômicas. A questão é o encaixe técnico na prática. Muita coisa é demagogia e muita coisa carece de melhorias teóricas, ou alguém pode ainda afirmar que o déficit previdenciário não existe?!?!?!

Autor(es): André Nassif
Valor Econômico - 20/04/2012
 

Não há dúvida de que a adoção da Política Industrial, Tecnológica e de Comércio Exterior (2004), da Política de Desenvolvimento Produtivo (2009) e do Plano Brasil Maior (2011) marcou a tentativa de resgate da política industrial no Brasil, depois de mais de uma década de difusão da ideia de que reformas econômicas liberalizantes per se seriam condição suficiente para restabelecer o desenvolvimento econômico brasileiro.
Apesar de repetida à exaustão a ideia da inexistência de argumentos para a defesa de políticas industriais setoriais na década de 1990, a verdade é que há uma abundante literatura teórica e empírica defendendo a tese contrária. O economista Dani Rodrik, de Harvard, procurou dar cabo à controvérsia utilizando a expressão "política industrial, não me perguntem por que, mas como", que pode ser interpretada em dois sentidos: primeiro, não basta apenas justificar a necessidade, mas é preciso contar com um diagnóstico preciso dos gargalos e setores prioritários, além de uma eficiente execução e acompanhamento dos resultados; segundo, a política industrial deve ser adotada nas instâncias micro, meso e macroeconômicas, que se encarregam de sua coordenação com as políticas tecnológica, de comércio exterior, monetária, fiscal e cambial.
Ainda que o atual governo venha fazendo um enorme esforço, por enquanto sem sucesso, para consolidar tal coordenação, desde 2004 o real tem mostrado tendência persistente de excessiva sobrevalorização. Embora a política monetária ultraexpansionista praticada nos países desenvolvidos em resposta à crise de 2008-2009 tenha agravado o problema do desalinhamento cambial no Brasil, convertendo a enorme liquidez internacional pré-crise no atual "tsunami monetário", o fato é que a questão cambial não é apenas um problema externo, mas principalmente doméstico.
Da mesma forma que os países ricos têm adotado medidas radicais para defender o crescimento e o emprego, nós também deveríamos encontrar meios igualmente radicais, se necessário, para deter o processo de semiestagnação que nos acompanha desde o início da década de 1980.
Dependendo dos conceitos utilizados para definir a taxa de câmbio real mais adequada para o desenvolvimento, os estudos empíricos apontam que o dólar deveria estar entre R$ 2,40 e R$ 2,90. Tamanho nível de desalinhamento cambial evidencia que os incentivos governamentais divulgados no início de abril, cujos impactos podem conceder apenas algum alívio temporário à indústria, não serão capazes de deter o processo em curso de desindustrialização no Brasil e muito menos assegurar taxas de crescimento significativamente superiores e sustentáveis no curto ou no longo prazo. Com efeito, os empresários sempre considerarão elevados os custos de oportunidade para ampliar os investimentos se observarem que as taxas de juros reais continuam muito superiores às internacionais e a moeda doméstica com tendência persistente à sobrevalorização.
Embora o problema cambial não seja recente, o Brasil tem sido fortemente afetado pelas expectativas negativas do cenário internacional adverso, que refreia a demanda privada por novos projetos, situação agravada pela avalanche de capitais externos de curto prazo que reafirmam a tendência à sobrevalorização. Os incentivos governamentais adotados no início do mês, por focarem basicamente o lado da oferta, só seriam efetivos para acelerar o crescimento se o contexto macroeconômico corrente fosse favorável à demanda privada orientada para projetos de investimento, de inovações e de exportações. Mas como o problema é de expectativas negativas e de fraca coordenação entre as políticas monetária, fiscal e cambial, a agenda prioritária deveria estar localizada na esfera da política macroeconômica, e não da política industrial.
O Banco Central (BC) tem procurado melhorar a coordenação com a Fazenda no sentido de reduzir as taxas de juros e reverter a convenção dos agentes com respeito às expectativas futuras das taxas de juros. A equipe econômica, por sua vez, tem tentado impor medidas ad hoc e homeopáticas de controle de capitais, mesmo sabendo que estas só podem impor um piso para a moeda brasileira apreciada, mas não são capazes de restaurar um nível de taxa de câmbio real pró-crescimento.
Embora autoridades do governo relembrem que possuem um arsenal bélico à disposição para deter o "tsunami monetário", é preciso sangue frio e coragem para dispará-lo. Afinal, dado o contexto de expectativas negativas e com um déficit em conta corrente projetado para cerca de US$ 69 bilhões em 2012 (em torno de 3% do PIB), dificilmente teremos uma saída organizada para o realinhamento cambial, com ou sem nova crise global.
Então, a agenda da política macroeconômica deveria priorizar dois alvos: primeiro, o fiscal, no sentido de reduzir temporariamente as metas de superávit primário, direcionando maior parcela do orçamento público para investimentos em infraestrutura (além dos já previstos para a Copa do Mundo e Olimpíada). Ainda que estes não tenham a pretensão de compensar a baixa taxa de investimento privado, poderiam induzir à decisão de investimento dos empresários por meio do efeito multiplicador de renda keynesiano e pela melhoria do estado de confiança futura, que impulsiona o animal spirits empresarial; e, segundo, o cambial. Neste caso, o arsenal bélico deve ser corajosamente ativado: adoção de "quarentena" de um ano a todo novo influxo de capital, seja de curto, médio ou longo prazo. Muitos poderiam afirmar que essa medida acarretaria forte depreciação da moeda brasileira e inflação.
No entanto, enquanto a depreciação do real seria a solução definitiva para realinhar os preços relativos em direção ao crescimento e ao aumento das exportações e aí, sim, tornar efetivas as medidas de política industrial já adotadas, não há qualquer razão teórica ou empírica para esperar que o efeito inflacionário decorrente seja permanente, desde que mantida a atuação do Banco Central no sentido de inverter a antiga convenção das expectativas inflacionárias. Se isso implicará a mudança ou mesmo a eliminação do regime de metas de inflação, as autoridades econômicas melhor dirão.
André Nassif é professor de economia internacional da Universidade Federal Fluminense e economista do BNDES. O artigo reflete a visão pessoal do autor, sem relação com a posição do governo brasileiro ou do BNDES.

quinta-feira, 19 de abril de 2012

Onde o Barcelona perde e onde o Chelsea ganha

Eu ouvi muito ontem na academia. A reclamação, quase generalizada, era de que o Chelsea fez um jogo feio, foi dominado, etc. Existem verdades e meias verdades em muitas das colocações e vale esclarecer.
O único jogo feio no futebol é o rodízio de faltas, o resto é valido. Existe a beleza na inteligência de um técnico que conhece as peças do seu time e os põe da melhor maneira possível.
O Chelsea jogou com uma linha de cinco: Mata, Meireles, Mikel, Lampard (que invertei com Meireles para caças o Messi), e Ramires, da direita para esquerda, de ponta a ponta. O Barcelona veio com um 4-3-3 meio lá meio cá, com Fábergas a esquerda e Xavi a direita, Iniesta a esquerda do ataque com Messi fazendo o facão da direita para o meio ou Iniesta fechando o losando do meio campo e Messi como flecha para área.
Messi joga no costado dos volantes e Lampard saiu "na captura" do meliante após alguns minutos do 1º tempo. Anulou Lionel. É natural que em certos esquemas de forte marcação alguns jogadores sumam em detrimento de alguma função tática, o que não quer dizer que estão jogando mal, muito ao contrário, como vimos ontem. A linha de 5 dos blues espremeu o ataque grená entre o meio e a defesa, e apesar das chances que o Barça teve (cerca de 5) o índice de erros dos catalães foi enorme, fruto da marcação cirúrgica recebida.
Os contragolpes do Chelsea ficavam restritos. Não é possível que o jogador de criação chegue tão ao meio partindo da ponta (Mata) para articular um time, então chegava o Ramirez infernizando o Daniel Alves e o Mascherano vai sonhar com o Drogba uma semana! A zaga do Barça bateu cabeça na hora do gol, marcaram a bola (veja que Puyol e Mascherano saem na mesma cobertura e deixam Drogba livrinho) e o resultado todos sabem.
Vi muitos comentários também, na tv e na rua, que isso não é jogo, para o Chelsea sair para jogar e tudo mais. Na globo, Casagrande falava sobre suas utopias, enquanto o surpreendente Belleti mostrava como funcionam as coisas do futebol e explicava o quanto faceiro é o time dos Blues.
O fato é que o Barcelona perdeu para a Inter de Milão (Mourinho) quando ficou trancada no "ferrolho suiço" e é esse um dos jeitos, até agora o melhor, de vencer o Barcelona.
Meu irmão me disse que não adianta colocar muitos zagueiros, improvisa-los, lembrando o caso dos Santos: "Tem que sufocar, marcar em cima". Concordo, mas a prática é mais complexa, o Barça é executor da marcação pressão e mestre em sair dela, com passes de 1º e nas constas do marcador imediato, e quando se passa a 1º da pressão o adversário está escancarado. É mais difícil do que parece...
O Chelsea fez o que deveria, jogou por 1 gol em casa para obter vantagem e joga agora por um gol no Camp Nou para tirar o pino da granada.
Para quem quiser se juntar ao Casagrande minha indicação é o seguinte: dirija qualquer time do mundo e jogue atacando o Barcelona, marcando pressão e indo para cima e seu time entrará na coleção de goleadas aplicadas pelos grenás.
O Barcelona joga com a bola. Resta aos outros time aceitarem essa prerrogativa e fazerem o certo: jogarem sem ela.

terça-feira, 17 de abril de 2012

Argentina reestatiza YPF e torna petróleo de 'interesse público'

Comentários: A Argentina está partindo para o esculacho. A situação está complexa de muitos lados. Problemas econômicos e das Ilhas Malvinas colocaram o governo em xeque. Parece que, infelizmente, a Argentina quer se tornar o mais venezuelano dos páises sulamericanos!



Argentina estatiza a YPF e abre crise com a Espanha
Autor(es): Por Matt Moffett e Taos Turner | The Wall Street Journal, de Buenos Aires
Valor Econômico - 17/04/2012

A presidente argentina Cristina Kirchner, em decisão que marca um divisor de águas na expansão do controle do Estado sobre a economia, vai estatizar a maior empresa de petróleo do país, a YPF, que pertence à espanhola Repsol. Projeto de lei enviado ao Congresso dispõe que 51% da empresa pertencerão aos governos federal e provinciais e que o setor de hidrocarbonetos é de "interesse público nacional". É praticamente certo que o projeto será aprovado.
O governo não perdeu tempo para afirmar seu controle. Uma fonte a par da situação disse que executivos espanhóis foram impedidos de entrar na sede da YPF, em Buenos Aires. Depois do discurso de Cristina, o governo publicou decreto de emergência anunciando uma "intervenção" nas operações da companhia, que ficará sob a autoridade do ministro do Planejamento, Julio de Vido.

A presidente argentina Cristina Kirchner, numa decisão que marca um divisor de águas na expansão do controle do Estado sobre a economia, disse que enviará um projeto de lei ao Congresso para estatizar a maior petrolífera do país, a YPF. A medida põe mais lenha na batalha com a controladora da empresa, a espanhola Repsol.
A decisão acirrou uma batalha com os acionistas da Repsol e com o governo espanhol.
Segundo a proposta, que declara o setor de hidrocarbonetos de "interesse público nacional", os governos federal e provinciais da Argentina terão 51% da empresa. É praticamente certo que o projeto será aprovado pelo Congresso argentino, onde o partido peronista de Cristina detém a maioria.
O projeto diz que o governo obterá sua fatia somente com ações em poder da Repsol, o que deixaria a empresa espanhola com 6% da YPF, em vez dos atuais 57%.
A nacionalização marca o ápice de uma batalha de mais de um mês entre a YPF e o governo de Cristina. O governo culpa a YPF pela queda na produção petrolífera, o que obrigou a Argentina a gastar muito com a importação de combustível, num momento em que o país sofre uma escassez de dólares devido a uma fuga de capitais.
A YPF, que afirma que as próprias políticas econômicas intervencionistas do governo são a razão da crise energética, não quis comentar. Na tarde de ontem, o porta-voz da YPF passou a sugerir a imprensa contatasse o Ministério do Planejamento da Argentina com suas questões, dizendo que o governo já estava no comando da empresa. Em um comunicado, a Repsol disse que acredita que a decisão do governo argentino é "manifestadamente ilegal e gravemente discriminatória" e que está estudando todas as medidas legais que pode tomar em resposta.
O governo espanhol afirmou que vai tomar medidas claras e fortes contra a Argentina. "Esta é uma decisão terrível", disse o ministro de Relações Exteriores, José Manuel García-Margallo, em entrevista coletiva. O ministro da Indústria, José Manuel Soria, disse que a Espanha vai tomar medidas legais contra a Argentina nos próximos dias, mas não deu mais detalhes.
Cristina, que na semana passada foi advertida por líderes espanhóis e europeus devido aos rumores de estatização, adotou um tom desafiador ao fazer o anúncio em discurso em cadeia nacional. "Esta presidente não vai responder a ameaças, nem a frases insolentes."
Parece certo que a nacionalização vai desencadear uma intensa batalha jurídica entre o governo e a Repsol, e abalar a relação com a Espanha, um grande investidor e parceiro comercial do país. Além disso, a decisão deve prejudicar ainda mais a reputação da Argentina entre investidores internacionais e adiciona tensão à relação da Argentina com a União Europeia.
"Isso envia um sinal real negativo para praticamente o mundo inteiro no que se refere às regras do jogo e investimentos na Argentina", disse Mark Jones, cientista político da Universidade Rice. "Este é um sinal de alerta que diz: "Investidores, cuidado." " De fato, analistas questionam como a Argentina vai obter o capital e os conhecimentos necessários para explorar as reservas significativas de xisto da YPF, após essa disputa com a Repsol.
O governo não perdeu tempo para afirmar seu controle. Uma pessoa a par da situação disse que executivos espanhóis foram impedidos de entrar na sede da YPF em Buenos Aires. Depois do discurso de Cristina, o governo emitiu um decreto de emergência anunciando uma "intervenção" nas operações da companhia, que ficará sob a autoridade do ministro do Planejamento, Julio de Vido.
O decreto de Kirchner determina que os acionistas da YPF sejam compensados num valor a ser definido por um tribunal federal. Funcionários da Repsol haviam dito anteriormente que o governo teria de pagar perto de US$ 18 bilhões para assumir controle total da YPF, de acordo com os estatutos da YPF e leis pertinentes da Argentina. O governo teria que fazer uma oferta por todas as ações da YPF mesmo que quisesse obter só 51% delas, segundo os estatutos da companhia.
A YPF responde por mais de 50% da produção diária consolidada da Repsol. Em 2011, representou cerca de 35% do lucro consolidado antes de custos financeiros, impostos, depreciação e amortização.
A YPF foi criada como uma companhia estatal em 1922 e foi parcialmente privatizada em 1993. A Repsol assumiu o controle da empresa em 1999.
A Bolsa de Valores de Buenos Aires suspendeu as transações com as ações da YPF depois do anúncio. Os recibos depositários da YPF em Nova York caíram 11%, para US$ 19,50, e já despencaram 43% até agora no ano, em meio a rumores sobre a estatização. As ações da companhia caíram 31% na Bolsa de Buenos Aires este ano, enquanto as da Repsol perderam 26% do seu valor na Espanha.
O governo espanhol disse que terá o apoio do resto do continente para contestar essa decisão. "Nossos parceiros europeus estão conosco", disse numa entrevista coletiva Maria Dolores Cospedal, a segunda principal líder do Partido Popular, que governa o país.
Cristina culpa a YPF pela queda na produção de petróleo e gás e diz que a companhia é em grande parte responsável por forçar a Argentina a depender de petróleo e gás importados, pela primeira vez em 17 anos. E que a falta de investimento no setor levou o país a incorrer num déficit de energia que superou os US$ 3 bilhões no ano passado. "Esta situação quase nos tornou um país inviável", disse ela.
A Argentina é o único grande país da América Latina que não tem uma presença estatal significativa na indústria do petróleo, disse ela. México, Chile, Brasil, Venezuela, Peru, Colômbia, Bolívia e mesmo o pequeno Uruguai, todos ostentam empresas estatais que são atores importantes nas suas respectivas indústrias de óleo e gás. "Nós somos o único país na América Latina que não controla sua própria política de energia."
Embora a Repsol tenha 57% da YPF, é a família argentina Eskenazi, que tem uma participação de 25,5%, a responsável pela gestão diária da empresa. O restante das ações da YPF é negociado nas bolsas de Buenos Aires e Nova York.
A discrepância na Argentina entre o rápido aumento do consumo de energia e uma declinante produção de petróleo e gás, depois de uma década de crescimento econômico acelerado, parece estar por trás da posição agressiva do país em relação à YPF. O consumo de óleo e gás cresceu 38% e 25%, respectivamente, de 2003 a 2010, mas a produção de óleo e gás diminuiu 12% e 2,3% no mesmo período, segundo o Barclays Capital.
Seguindo os sinais de Kirchner, os governos das províncias argentinas rescindiram, nas últimas semanas, mais de uma dezena de concessões de produção da YPF e desencadearam uma onda de acusações contra a companhia.
A Argentina certamente tem grande potencial. De modo geral, o país é o terceiro do mundo, atrás da China e dos EUA, em reservas potencialmente recuperáveis de gás de xisto, com 2,2 trilhões de metros cúbicos, segundo estudo feito em 2011 por um órgão do governo americano.
Mas críticos e representantes do setor dizem que as políticas do governo, tais como imposto alto, controle de preço e mudanças imprevisíveis nas regras (como a suspensão de incentivos fiscais em gastos com produção) desencorajaram novos investimentos.
"O governo agora está num círculo vicioso em que acha que precisa adotar medidas cada vez mais extremas para tentar resolver problemas que suas próprias políticas estão criando", disse Aldo Abram, economista de Buenos Aires. "Isso não vai resolver o problema de energia da Argentina."
Desde a moratória de sua dívida externa, em 2001, a Argentina tem sido considerada uma espécie de nação marginalizada pela comunidade financeira internacional. Mas analistas dizem que a estatização da YPF leva o controle estatal da economia a um novo nível. "Já demonstramos que projetos estatais podem ser administrados muito bem", disse Cristina em resposta a críticos que têm argumentado que o governo não tem expertise nem dinheiro para tocar a YPF.
A estatização combina com recentes ações intervencionistas desde a reeleição de Cristina em outubro, quando ela impôs novos controles de capital e apertou as restrições sobre importações. Ela ainda deu um tom mais nacionalista às relações diplomáticas, ressuscitando a dormente reivindicação das Ilhas Malvinas como propriedade argentina, e não britânica.

Uma bolha pode estar em formação :: Mary Anastasia O'Grady

Valor Econômico - 17/04/2012
 

Juntamente com a Rússia, a Índia e a China, aponta-se o Brasil como um tigre econômico do século XXI. Então, como se explica que tenha crescido míseros 2,7% no ano passado?
Segundo a presidente Dilma Rousseff, é a política de juros baixos do Federal Reserve (Fed, banco central dos EUA) que está tornando seu país não competitivo e, portanto, "prejudicando o crescimento". Ela disse isso em uma visita a Washington na semana passada.
Não é uma acusação nova. O Brasil tem se queixado há algum tempo da política de dinheiro fácil do presidente do Fed, Ben Bernanke. Ao ministro da Fazenda brasileiro, Guido Mantega, é creditado o termo "guerra cambial" para descrever a vantagem exportadora de um país mediante desvalorização de sua moeda nacional.
A saída dessa armadilha é aproveitar o real forte e as vantagens comparativas do país. Permitir que a indústria de transformação planejada centralmente se reestruture não será indolor. Mas é melhor fazê-lo agora do que esperar a crise.
Sem dúvida, a "flexibilização quantitativa" do Fed e a política de juros quase nulos implicam haver muitos dólares em busca de melhores retornos nos mercados de energia. Isso alimentou uma corrida ao Brasil, onde foram descobertas abundantes reservas petrolíferas no mar que, em contraste com reservas nos EUA, têm sido alvo de exploração. Ao contrário do que ocorre no México, o Brasil está permitindo que empresas estrangeiras participem do processo. Também na agricultura, o Brasil emprega a mais sofisticada tecnologia disponível e a usa para tornar-se um produtor de classe mundial numa época de preços crescentes dos alimentos.
Quando os investidores colocam seu dinheiro nesses ativos rentáveis no Brasil, o valor do real sobe. Nesses termos, Dilma tem razão em que Bernanke, ao "jogar dinheiro do helicóptero", está desempenhando um papel fundamental na economia brasileira. Os investidores também têm razão em serem cautelosos num jogo envolvendo commodities fortemente dependente da política de crédito fácil do Fed.
Uma bolha pode estar em formação. Se a produção não for rentável a preços mais baixos, um estouro de bolha poderá acontecer.
Mas, uma moeda forte torna os brasileiros mais ricos, algo que a presidente deveria comemorar. Então, por que ela está se lamentando? A resposta está no poder político dos industriais nacionais.
Pense o que aconteceria se os responsáveis pela política monetária permitissem uma valorização do real. À medida que os dólares afluíssem para o país e fossem usados para comprar reais, a taxa de câmbio apreciaria. A valorização do real daria aos brasileiros maior poder de compra em todo o mundo para modernizar suas instalações produtivas, melhorando a produtividade e, assim, a competitividade.
Esse seria um processo de acumulação de riqueza. Mas os planejadores centrais brasileiros têm outras ideias. Eles sempre imaginaram o país como um gigante industrial, e o governo vem, de longa data, subsidiando os produtores nacionais - a teoria das indústrias nascentes - e oferecendo proteção contra a concorrência estrangeira. Isso era mais fácil quando a moeda local era fraca. Os brasileiros não conseguiam pagar as importações do país e as exportações pareciam mais atraentes para os compradores estrangeiros.
Hoje o real forte está expondo a debilidade da indústria brasileira, que mesmo antes do "boom de Bernanke" estava diminuindo em importância econômica. De acordo com o economista brasileiro Raúl Velloso, a indústria de transformação, como percentual do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro é agora metade do que no fim de 1980. Um total de 65% da economia corresponde, hoje, ao setor de serviços, e esse setor emprega quatro vezes mais brasileiros do que a indústria de transformação.
Mesmo assim, os produtores nacionais continuam politicamente poderosos e eles estão exercendo pressão sobre Brasília para impedir a valorização do real. Para fazer isso, o Banco Central tem de comprar o afluxo de dólares, emitir novos reais e, em seguida, emitir títulos para remover esses reais de circulação para que não gerem inflação. O banco tem agora mais de US$ 400 bilhões em reservas e as emissões de títulos têm empurrado os juros para cima.
Taxas de juros mais altas atraem mais compradores de reais em busca de rendimentos mais elevados. Assim, ao invés de enfraquecer a moeda, a intervenção do banco a torna mais forte. Juros mais altos também encarecem manter as reservas. Outro problema é que pode ser mais provável que os investidores coloquem seu dinheiro em títulos do governo, em vez de convertê-los nos investimentos necessários para aumentar a capacidade produtiva.
O governo também está devorando a poupança necessária para investimentos fomentando o consumo em uma diversidade de maneiras. O impulso ao consumo, inclusive a expansão de crédito subsidiado do BNDES, o banco nacional de desenvolvimento, é perigoso.
À medida que a demanda se aquece, a baixa taxa brasileira de investimentos em relação ao PIB (18%) em comparação com a chinesa (50%) implica a necessidade de importações. O protecionismo bloqueia as importações, de modo que os preços dos produtos comercializáveis sobem. Os preços dos serviços, que não são importados, também sobem.
Maior consumo sem a correspondente capacidade produtiva provoca inflação, elevando os custos salariais para os fabricantes nacionais que o governo deseja ajudar. O banco central precisa apoiar-se em juros elevados para controlar a situação. O crescimento sofre.
A saída dessa armadilha é aproveitar o real forte e as vantagens comparativas do país em serviços e commodities. Permitir que a indústria de transformação planejada centralmente se reestruture não será indolor. Mas é melhor fazê-lo agora, ao lado de reformas pró-crescimento nas áreas tributária e de regulamentação, do que esperar a inevitável crise

terça-feira, 10 de abril de 2012

Crescem apostas em Selic abaixo de 9%

Autor(es): Eduardo Campos | De São Paulo
Valor Econômico - 10/04/2012
 

A semana é outra, mas o tom do mercado de juros permanece o mesmo. As taxas futuras seguem apontando para baixo, reforçando a tese de Selic inferior a 9% ao ano.
O tema não é novo. De fato, ele estava em voga até a divulgação da ata do Comitê de Política Monetária (Copom) de março, na qual o colegiado acenou que a Selic poderia cair para próximo das mínimas históricas. Com isso, criou-se o consenso de um "piso" de curto prazo em 9%, tendo em vista que a mínima história é de 8,75%.
Tal convicção começou a cair na semana passada, e segundo o vice-presidente de tesouraria do Banco WestLB, Ures Folchini, a piora de cenário externo, que tem grande peso na composição do modelo do Banco Central, aliada à inflação corrente em queda - agora com expectativas declinantes - abre espaço para redução de juros.
O limitador natural à queda da Selic, segundo o especialista, é a fórmula de remuneração da caderneta de poupança.
No entanto, diz Folchini, independentemente dessa e de outras limitações estruturais, a estratégia de redução da Selic é a mais correta dentro da atual conjuntura econômica.
A opinião de Folchini sobre o efeito limitador da poupança também é compartilhada por outros agentes de mercado.
E o assunto ganha relevância conforme os bancos assumem uma postura coletiva e mais incisiva sobre o tema.
Estudo da Febraban divulgado ontem aponta que uma Selic em 8,75% (mínima histórica) já poderia esvaziar os fundos de renda fixa. "Certamente um desequilíbrio que precisa ser corrigido para viabilizar a continuidade da queda dos juros. E quanto antes melhor", apontou a instituição.
De acordo com a Febraban, com menores riscos para o cumprimento da meta em 2012, a dúvida fica, mesmo, para 2013, especialmente se o governo for bem sucedido na tentativa de acelerar a economia.
Ainda na visão da federação, no caso de um recrudescimento das pressões inflacionárias, é provável que o BC recorra ao todo ou em parte à utilização das medidas macroprudenciais para promover os ajustes necessários, reduzindo ao mínimo necessário um eventual ajuste de alta da Selic. "Nesse contexto, cresce a importância de se promover uma alteração nas regras das cadernetas de poupança", diz o estudo.
A questão ganha complexidade, pois alterar a regra da poupança em ano eleitoral seria aceitar um risco político muito grande.
Para parte do mercado, o governo não vai dar esse tipo de munição para a oposição, por isso, o cenário de maior probabilidade, levando em conta os fatores econômicos e políticos, seria reduzir a Selic a 9%, colocar o ciclo de corte em pausa até o fim das eleições e até que essa questão da poupança fosse resolvida. Superadas essas etapas, aí sim, o BC poderia reduzir ainda mais a taxa básica.
Essa é a visão racional de parte do mercado, mas sempre vale ponderar que as razões eleitorais, muitas vezes, falam mais alto no campo da política.
Mudando o foco para o câmbio, o real voltou a mostrar alguma correlação com o sinal externo. Dados ruins sobre a criação de empregos nos EUA tiraram força da moeda americana e abriram espaço para uma recuperação do euro e de outras moedas emergentes, como o dólar australiano.
Por aqui, o dólar comercial encerrou o dia com baixa de 0,33%, a R$ 1,819, menor cotação em duas semanas. O giro estimado para o interbancário ficou ao redor de US$ 1 bilhão.
No mercado futuro, o dólar para maio perdia 0,49%, a R$ 1,8255, antes do ajuste final.
O vendedor começa a ficar um pouco mais à vontade conforme cai a preocupação com novas medidas cambiais.
As ameaças e o tom das falas de membros do governou se abrandaram e, além disso, está sendo reforçada a ideia de que taxa de câmbio a R$ 1,80 é "razoável". Em função disso e das novas emissões de dívida e ofertas de ações não se descarta a possibilidade de o dólar ir testar, novamente, a linha de R$ 1,80.

segunda-feira, 9 de abril de 2012

Inadimplência de estudantes ameaça recuperação dos EUA

Mais uma bomba chiando na economia americana. E os desdobramentos são sérios...


Autor(es): Por Tom Raum | Associated Press
Valor Econômico - 09/04/2012
 

O programa de crédito estudantil do governo dos EUA parecia ser uma grande ideia em 1965: tome dinheiro emprestado para fazer a faculdade agora e pague depois, quando você tiver um emprego.
Mas muitos participantes do programa agora estão perto de serem expulsos da faculdade, vítimas das dolorosas lições da vida real em matemática e economia.
Acima do US$ 1 trilhão, as dívidas pendentes do crédito estudantil superaram as dívidas dos americanos com o cartão de crédito e com os financiamentos automobilísticos. A explosão dessa dívida ameaça a frágil recuperação da economia, aumenta a carga para os contribuintes e possivelmente prepara o caminho para uma nova crise econômica. Com o mercado de trabalho ainda vacilante, aumentam cada vez mais as dificuldades de pagamento desses empréstimos. Incapazes de conseguir emprego, muitos estudantes voltaram para a escola, aumentando ainda mais suas dívidas.
A dívida média dos estudantes com o crédito estudantil superou recentemente os US$ 25 mil, um crescimento de 25% em dez anos. E essa dívida crescente tem implicações diretas para os contribuintes, uma vez que oito em cada dez desses empréstimos são emitidos ou garantidos pelo governo.
Contribuindo para a escalada do endividamento está o aumento das mensalidades, que sobem num ritmo bem mais acelerado que a inflação. E as matrículas vêm crescendo há anos, uma tendência que ganhou força na última recessão, alimentando ainda mais a tomada de empréstimos.
Mark Zandi, economista-chefe da Moody"s Analytics, afirma que os empréstimos e subsídios concedidos pelo governo não são particularmente bons para os contribuintes, do ponto de vista dos benefícios proporcionados, porque as "universidades e as faculdades simplesmente aumentam suas mensalidades. Isso não melhora a acessibilidade e também não facilita a entrada em uma faculdade".
"É claro que é muito difícil para os jovens que estão passando por isso, porque eles estão numa situação difícil", acrescenta Zandi. "E eles não conseguirão sair dela."
E não são apenas os adultos jovens que estão sobrecarregados. "Os pais e o governo federal arcam com uma parcela substancial da conta de ensino após o nível secundário", diz um novo relatório do Federal Reserve Bank de Nova York. E alguns dos tomadores dos empréstimos estão se aproximando da idade de aposentadoria.
O estudo do Fed constatou que os americanos com 60 anos ou mais ainda devem cerca de US$ 36 bilhões em empréstimos estudantis. No total, quase três em cada dez empréstimos estudantis estão com os pagamentos atrasados em 30 dias ou mais, afirma o estudo.
Uma outra coisa complica ainda mais o quadro: assim como as pensões alimentícias e o imposto de renda, o crédito estudantil normalmente não pode ser descartado ou reduzido em procedimentos falimentares, como acontece com a maioria das outras dívidas atrasadas. Essa restrição foi ampliada em 2005 para incluir também os empréstimos estudantis concedidos por bancos e outras instituições financeiras privadas.
"Essa poderá muito bem ser a próxima bomba para a economia dos EUA", diz William Brewer, presidente da NACBA, associação nacional dos advogados especializados em falência do consumidor. "Como advogados especializados em falências, somos os primeiros a ver as rachaduras nas fundações", afirma Brewer. "Alertamos para os problemas com os financiamentos imobiliários em 2006 e 2007. O setor dizia que tudo estava bem. Ninguém tinha nada sobre controle. Agora, estamos vendo os mesmos sinais de perigo. Estamos vendo grandes calotes nos empréstimos estudantis e pessoas entrando em dificuldades financeiras por causa deles."
Um estudo de seu grupo aponta que deixar de saldar apenas um empréstimo estudantil coloca o tomador na condição de mau pagador. Após nove meses, o tomador está em default. Uma vez que o default ocorre, o volume total do empréstimo vence imediatamente. Para aqueles com crédito estudantil federal, o governo tem amplos poderes de cobrança, que incluem a capacidade de executar os salários de um tomador e confiscar reembolsos tributários e a Previdência Social.
Nigel Gault, principal economista da IHS Global Insight, diz que a crise do crédito estudantil poderá não ser uma bomba para o setor financeiro, como foi o colapso do mercado hipotecário em 2008, mas poderá ser um golpe para os contribuintes e o problemático setor imobiliário residencial.
"Quando os empréstimos estudantis não são pagos, as dívidas são transferidas para o contribuinte", aumentando ainda mais os déficits federais, acrescenta ele. E os tomadores de empréstimos estudantis que estão sobrecarregados podem ser impedidos de se qualificar para financiamentos imobiliários e assim "ficar muito mais tempo na casa dos pais", diz Gault. Os adultos jovens em processo de formação de família historicamente sempre representaram a maior parte dos compradores de moradias de primeira viagem - e a escassez desses adultos jovens poderá prejudicar qualquer recuperação do setor imobiliário.
O presidente Barack Obama pediu ao Congresso a extensão de um corte temporário nas taxas de juros dos empréstimos estudantis. A taxa federal reduzida está agora em 3,4%. Se a redução não for ampliada, o juro subirá para 6,8%.

quinta-feira, 5 de abril de 2012

As duas cabeças da corrupção

Autor(es): Eugênio Bucci
O Estado de S. Paulo - 05/04/2012
 

As metáforas são perigosas, especialmente nessa matéria. Mesmo assim, vale uma figura. Uma só.
A corrupção é uma hidra de muitas cabeças, como muita gente diz, mas duas são as cabeças dominantes: uma é de esquerda e a outra, de direita. Ambas se estranham, encaram-se com ares de ódio espelhado, agridem-se às dentadas, mas acabam por aceitar a convivência. Elas supõem que comandam o corpanzil desse gigante de proporções indefiníveis em que estão plantadas pelo pescoço, mas a verdade é que vão a reboque. As duas seguem juntas a trilha tortuosa que a hidra escolhe sozinha, sem consultá-las. Lá vão elas, sacolejando no dorso de uma razão sem razão, com a pose de quem tenta passar a ilusão de controlar o destino. Lá vão elas, às vezes falantes, outras vezes rabugentas, fingindo dominar o diabo que as carrega.
Ponto. Fim da metáfora - ou quase.
Quando um infeliz que se pensa de esquerda é interceptado com maços de dólares na cueca, seu gesto é imediatamente protegido por um cordão de isolamento imaginário, uma blindagem ideológica. Uma parte considerável dos seus correligionários logo faz circular uma explicação de ordem tática. O começo dessa explicação consiste em pôr a responsabilidade no sistema - palavra que, como bem sabemos, é um curinga nos panfletos de todo gênero. Segundo esse discurso, não há pessoas corruptas na esquerda, só o que existe é um sistema corrupto "que precisamos administrar se quisermos tomar o poder, companheiro". Ou seja, sem lançar mão das armas obscuras não se vence o inimigo de classe. Logo, o militante de esquerda que negocia dia e noite com a corrupção pode até ter as mãos sujas, mas mantém o coração e a consciência limpíssimos, imaculados. Vai roubar ou, pelo menos, vai deixar roubar, mas depois ganhará honras de herói. Eis a justificativa moral que habita a cabeça canhestra da hidra.
Agora olhemos para a direita. No caso brasileiro, é ela a mãe do patrimonialismo - que, por sua vez, é o pai dos corruptos e dos corruptores. Se recuarmos no tempo, e nem é preciso recuar tanto, veremos que nas hostes do conservadorismo pátrio a política não tem sido outra coisa senão a atividade profissional de se apropriar do que é público para fins privados. Como o Estado precedeu a sociedade na formação nacional, foi do primeiro que se pilhou a matéria-prima para vertebrar a segunda, que veio sendo gerada e ordenada à imagem dos sonhos (e pesadelos) mais regressivos. Nesse percurso, tomar para si o que deveria ser de todos se foi tornando o pressuposto da própria sustentabilidade da ação política. Privilégios hereditários, benesses, sinecuras e monopólios inexplicáveis decorrem, todos, daí. Dentro do crânio direitista da hidra metafórica, o poder só se deixa domar por aquele que tem a ousadia de tomar posse pessoal (e familiar) do poder: manda (no Estado) quem é dono ou quem faz as vezes de dono (do Estado). O poder é como o dinheiro: não aceita desaforo. Para exercê-lo é preciso usufruir o erário. Pessoalmente. Fisicamente. Diretamente. Sem cerimônia. A justificativa moral para a corrupção no imaginário da direita está aí: ela é a indispensável fonte extraoficial para sustentar a dispendiosa fachada oficial da vida pública - e para compensar patrimonialmente o agente e seus apoiadores. É pegar ou largar.
A coisa não para aí. Ela é mais complicada.
Quando vista em retrospectiva, a nossa hidra pode ser entendida e explicada, embora repugne. Agora, quando posta em perspectiva, na direção do futuro, prenuncia um quadro bem pior, que aponta para o colapso. À esquerda, a corrupção principia como um atalho pragmático, aparentemente eficaz. Mas logo ela se converte num fim e, tornada fim, nega e aniquila qualquer projeto de justiça social. À direita, ela principia nos hábitos ancestrais e depois, hipertrofiada, se converte na tal esperteza que devora o dono: tende a matar o hospedeiro, exaurir o ambiente e calcinar a terra.
Daí a sensação, que muitos vêm manifestando nestes dias, com notas de moralismo ou de realismo, de que hoje é imperioso conter a corrupção, fazê-la regredir. Mas como?
Uma parte, óbvia, caberia ao próprio aparelho de Estado, desde que ele saiba proteger-se minimamente das quadrilhas. Ao Estado, então, caberiam a repressão policial e o devido julgamento legal. Essa parte vem sendo feita, mas vagarosamente. Agora mesmo, por exemplo, foi uma investigação da Polícia Federal que começou a desbaratar conexões múltiplas entre o senador Demóstenes Torres, Carlinhos Cachoeira e mais uma penca de autoridades. A outra barreira é a impunidade. A propósito, o julgamento do mensalão ficou para quando mesmo?
Mas é preciso mais. É necessário desmontar, no plano do discurso, as justificativas morais silenciosas que validam os negócios ocultos à direita e à esquerda. Trata-se, com o perdão da reincidência na metáfora, de cortar as duas cabeças da hidra. Só isso poderá renovar a cultura política.
Isso, porém, não vem sendo feito. No fundo, muitos dos agentes políticos, no Brasil, ainda acreditam que a corrupção, no curto prazo, funcione. À boca pequena, chamam-na de mal necessário. Ignoram que, uma vez acionada, ela passa a governar o processo, o que significa, hoje, sufocar a normalidade institucional e a própria política. O corruptor e o corrupto se acreditam despachantes um do outro, algo como "facilitadores". Na verdade, são sequestradores da agenda pública.
Se formos capazes de olhar a hidra por esse prisma, veremos que as duas cabeças que nela despontam, a de esquerda e a de direita, são sócias. Xifópagas. Alimentam-se uma à outra. Vivem disso e para isso. Perderam-se de seus programas públicos.
A corrupção é o capital sem lei. Todos os que a invocam, ainda que marginalmente, viram seus servidores. Sem exceção. Sem uma única exceção.