Comentários do Blogueiro: Obvio que o projeto não irá resolver todos os problemas do Brasil na seara política, mas pode ser bastante interessante para mitigar os candidatos "especializados em vencer eleições". Na esteira de melhorias institucionais, políticas e de governança esse projeto pode servir como instrumento de mudanças importantes na esfera municipal, por vezes a mais difícil de ser atingida por mudanças significativas. Deve vingar, com o perdão do trocadilho infame, se não como projeto, mas ao menos dando um gostinho de revanche ao povo.
Aloysio Nunes Ferrira: relator
Ao que tudo indica, o cargo de vereador caberá mesmo aos altruístas
apenas. Aquela Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que prevê o fim
da remuneração a legisladores de municípios com até 50 000 habitantes
(Mais detalhes em: O fim do salário de vereador) já tem relator e parecer quase pronto.
Cyro Miranda, autor da PEC, está vendendo otimismo. Diz que o relator
do projeto na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado, Aloysio Nunes Ferreira, deve entregar seu parecer até o fim do mês, e com poucas alterações no texto original.
Segundo Cyro, Aloysio planeja incluir somente a previsão de uma ajuda
de custo de um ou dois salários mínimos para cobrir custos, como
transporte e alimentação. E Eunício de Oliveira já avisou: assim que
receber o relatório, põe o projeto em votação na CCJ, o que pretende
fazer antes do recesso.
Os vereadores que passem a economizar desde já.
Especialistas explicam mecanismos da mente que nos fazem "ignorar"
sinais de problemas financeiros e dão dicas para que dificuldades sejam
identificadas mais facilmente
Por Tabata Pitol
SÃO PAULO - A pedagoga Cristina Queirós levou um susto quando
se deu conta de que estava devendo mais de R$ 70 mil. Sem saber ao
certo como as finanças chegaram a esse estágio – uma vez que não havia
comprado bem de grande valor –, ela só percebeu o tamanho do problema ao
pedir R$ 10 mil ao marido para pagar contas em atraso.
“Eu não sabia que estava devendo tanto. Sabia que tinha cartões de
crédito e empréstimos em atraso, mas não sabia o real valor das minhas
dívidas. Achei que R$ 10 mil seriam suficientes. Mas meu marido quis que
eu mostrasse tudo o que estava devendo antes de me emprestar o
dinheiro, e só quando coloquei tudo no papel percebi que estava muito
mais endividada do que imaginava”.
Cristina não é um caso raro entre os brasileiros. Muitas pessoas só
percebem que as finanças saíram do controle quando já estão muito
endividadas. “Infelizmente a própria biologia do ser humano explica por
que ele demora tanto para perceber que está em problemas financeiros.
Preferimos fingir que não estamos vendo. Acreditamos nas contas de
cabeça que nunca são exatas. Nomeamos de dissonância cognitiva o
processo que nos leva a duvidar do óbvio, a negar todos os sinais de que
algo não está indo bem”, conta o economista pela PUC-SP e especialista
em investimentos e métodos quantitativos pela FGV, Richard Rytenband.
O planejador financeiro Valter Police completa: “Não é uma coisa que
se faz de propósito, mas a pessoa vai deixando passar. Parece impossível
engordar 100 kg sem se dar conta, não é? Mas a televisão está cheia de
programas com pessoas que chegaram à obesidade mórbida sem procurar um
médico, fazer uma dieta ou começar um programa de exercícios. O mesmo
acontece quando o assunto é dinheiro”. Buscando soluções No entanto, o fato de ser algo
recorrente não significa que devemos considerar como normal. “Temos que
assumir nossas responsabilidades e nossos atos. Nos endividamos
excessivamente porque descuidamos das finanças. A culpa é nossa e só nós
podemos impedir que a situação se agrave cada vez mais”, afirma Police.
Para ele, nada é mais eficaz do que colocar, na ponta do lápis, os
gastos e ganhos para evitar o endividamento.
O consultor afirma que o ideal é, mês a mês, parar para avaliar o
orçamento e se questionar se os gastos são maiores ou menores que os
ganhos, e se está se pagando muitos juros. “Avaliando todos os meses a
pessoa vai perceber se a situação está saindo do controle e aí é hora de
parar e cortar os gastos supérfluos. Não é uma coisa gostosa de fazer,
ninguém gosta de constatar que tem um problema, que não está dando
conta. Mas quanto mais se deixa passar, pior vai ficar. Então, embora
seja dolorido, quanto antes identificar o problema, melhor. Os juros no
Brasil são altíssimos e podem elevar uma dívida rapidamente”, revela
Police.
Patrícia Santos é um exemplo. Não imaginava que os meses que ficou
sem pagar o cartão de crédito, o cheque especial e o financiamento do
carro popular, após ficar desempregada, resultariam em uma dívida de
quase R$ 50 mil. “É muito difícil você descobrir que deve R$ 50 mil e
não ter um patrimônio nesse valor. Não tinha ideia de que devia tanto
até os avisos de cobrança começarem a chegar. Minha dívida era de
roupas, passeios e o carro, que não custava mais do que R$ 20 mil, mas
ainda não estava quitado. Não sei como cheguei a esse ponto sem
perceber, mas sei que os juros ajudaram bastante. Precisei pegar
empréstimos de familiares, vender o carro, e paguei primeiro o que
cobrava mais juros”, conta a publicitária. Hábitos perigososAlém de observar e avaliar
atentamente os gastos, os especialistas afirmam que há vários sinais de
que uma pessoa vai enfrentar um problema financeiro. “Tem gente que se
engana. Já ouvi clientes dizendo que gastaram muito em determinado mês
porque tiveram um acidente de carro. Isso acontece, claro. Mas é por
isso que é fundamental ter seguro e plano de saúde. Também já ouvi a
justificativa: tive um imprevisto, o IPVA (Imposto de Propriedade de
Veículos Automotores). Ora, todos sabemos que IPVA não é imprevisto.
Então, o primeiro passo é parar de se enganar e assumir que você está
descontrolado”, garante Police.
Rytenband completa: “é preciso saber identificar problemas e
comportamentos de risco. Uma pessoa estourada no cheque especial,
pagando 10% de juros ao mês, e que tem dinheiro na poupança - mas não o
usa para quitar essa dívida - tem dificuldades para identificar
comportamentos de risco. É comum a pessoa alegar que não quer mexer na
poupança, “pois aquele é o único dinheiro que ela tem”, mas manter um
investimento que rende 0,5% ao mês e continuar pagando 10% de juros
certamente vai levá-la à falência”.
Mas, para o planejador financeiro da Police Consultoria, o sinal mais
claro de um provável problema é o aumento no nível de endividamento. “É
fácil perceber. Uma pessoa que não pegava dinheiro no banco e que, de
repente, começa a entrar no cheque especial, passa a considerar o limite
do cheque parte do salário. Quem vez ou outra pega um empréstimo no
caixa eletrônico e depois começa a pegar um empréstimo para pagar outro
vai enfrentar sérios problemas. A mesma coisa com o cartão de crédito:
primeiro a pessoa compra no cartão e paga a fatura. Depois começa a
parcelar as compras no cartão, aí para de pagar o total da fatura, em
seguida começa a parcelar itens como supermercado no cartão e, por fim,
pega empréstimo para pagar o cartão. É um caminho longo com sinais que
podem ser percebidos se a pessoa estiver atenta às mudanças no seu
comportamento”.
De fato, Cristina admite que faltou atenção aos seus gastos e
comportamentos. “Foi preciso levar um grande choque para perceber que eu
estava descontrolada. Percebi que gastava muito dinheiro com mimos para
os meus filhos, sempre usando a desculpa de que eles mereciam tudo de
melhor. Realmente merecem, mas já entendi que tenho que dar a eles o que
meu orçamento permite. Mesmo tendo essa consciência é difícil
controlar. Meu marido está me ajudando para que eu não cometa os mesmos
erros. Felizmente, eu pude contar com o dinheiro que ele poupava para
pagar as dívidas, senão eu ainda estaria pegando empréstimos, fazendo
novas dívidas, tanto para tentar quitar o que estava devendo, quanto
para consumir ainda mais”.
Valter elogia a atitude de Cristina. “A família precisa estar perto
nesse momento. Aliás, eu defendo que o orçamento deve ser feito e
avaliado por todos da família. Não adianta um se controlar e os outros
gastarem demais. Manter os gastos dentro de um limite deve ser um
compromisso de toda a família”.
O motivo que levou Cristina a se endividar é o mesmo que leva muitas
pessoas aos problemas financeiros: comprar por achar que merece.
“Todo mundo, quando vai comprar algo mais caro, usa essa afirmação:
eu mereço, trabalho tanto. Provavelmente mereça mesmo, mas esses agrados
podem trazer uma grande dor de cabeça. A verdade é que quem não atingiu
a independência financeira não deveria se dar ao luxo de ter algumas
coisas. Carrão e casa de praia não são sinônimo de uma boa situação
financeira. Ao contrário, são bens que trazem despesas e podem
comprometer muito o orçamento de uma pessoa. É preciso ter cuidado ao
proferir a frase ‘eu mereço’”, alerta Richard Rytenband. Independência financeiraO economista explica
que, para evitar definitivamente os problemas, o caminho é óbvio:
atingir a independência financeira (conseguir que os lucros - gerados
por bens e investimentos - paguem todas as despesas mensais), para que a
pessoa não precise de fontes externas de renda, nem mesmo do salário.
“Sei que isso não é fácil, mas é possível. O problema é que a
mentalidade das pessoas está errada. Por exemplo, as pessoas não têm que
poupar com o objetivo de ter uma reserva para a aposentadoria, o ideal é
adotar hábitos que levem a conquistar a independência financeira antes,
para ter rendimentos durante a aposentadoria. Mas, para conseguir isso,
é preciso ter investimentos e uma sobra constante. É fato: só vai se
dar bem quem gasta menos do que ganha”, afirma o professor, que
completa: “e também é importante saber que não é possível conquistar
esse patamar apenas poupando. Para conseguir isso é preciso investir, já
que a poupança apenas evita que o dinheiro perca seu poder de compra”,
aconselha Rytenband. Teste rápidoRichard Rytenband elaborou um teste
para você identificar se é candidato a problemas financeiros. Se você
identificar, em seu comportamento, pelo menos três atitudes das cinco
descritas a seguir, pode enfrentar dificuldades se não alterar
rapidamente sua forma de agir.
1 - Gasta tudo que tem ou mais do que tem.
2 – Tem qualquer forma de dívida, principalmente cartão de crédito e cheque especial.
3 - Não tem o hábito de investir.
4 - Não é “útil” para a sociedade: sem utilidade social, se a pessoa
ficar desempregada, não consegue se reposicionar. Sem ganhos, não há
como atingir a independência financeira. É fundamental investir em si
próprio para se tornar útil.
5 – Não tem consciência de que o dinheiro perde valor ao longo dos
anos – sem essa consciência, a pessoa deixa o dinheiro em investimentos
muito conservadores, que não trazem lucro.
O Ministério do Esporte ainda não sabe, ou ainda não informou a
população, mas as autoridades do governo do Estado do Amazonas e da
Prefeitura de Manaus já desistiram de construir, em tempo para a Copa do
Mundo de 2014, as duas obras de mobilidade urbana que se comprometeram a
executar para o Mundial.
Em janeiro de 2010, o governo estadual comprometeu-se a construir uma
linha de monotrilho, atualmente orçada em R$ 1,3 bilhão (sendo R$ 600
milhões de verbas federais). Já o município de Manaus assumiu a
obrigação de fazer um sistema de corredores de ônibus integrado (BRT, ou
Bus Rapid Transit), no valor de R$ 290 milhões (sendo R$ 200 milhões
dos cofres da União).
MANAUS NÃO ESTÁ SOZINHA
Das cinco cidades-sede da Copa do Mundo de 2014 que incluíram em
seu planejamento oficial para o evento a construção de linhas de trem de
superfície, quatro não deverão entregar as obras antes do início do
Mundial de futebol, em junho de 2014. São elas: Brasília, Cuiabá (foto),
Manaus e São Paulo.
O plano de construir os modais foi aprovado pelo Ministério das
Cidades, e assim passou a constar na chamada Matriz de Responsabilidades
da Copa, por serem consideradas intervenções essenciais para que a
capital amazonense pudesse ser uma das sedes da Copa de 2014. A tal
matriz, que sofre atualizações trimestrais, via de regra corrigindo para
cima o custo dos empreendimentos e empurrando para frente a data de
entrega das obras, ainda prevê as duas obras de mobilidade de Manaus.
No dia 1º deste mês, porém, o governador do Amazonas, Omar Aziz (PDT), e
o prefeito eleito de Manaus, Artur Neto (PSDB), informaram a população
que já não pensam mais em construir os sistemas de transporte a tempo
para a Copa.
“Não teremos tempo para concluir esses projetos até 2014. Tanto o
monotrilho, quanto o BRT, dificilmente teriam condições de serem
concluídos até a Copa", afirmou o governador, no que foi endossado pelo
prefeito eleito de Manaus: "Dialogamos sobre a implantação ao longo de
quatro anos de um sistema de transporte de massa moderno".
E, para que o trânsito na cidade não fique caótico em dia de jogos, o
governador tem a solução: "A capacidade da Arena da Amazônia é de 42 mil
pessoas, isso cabe facilmente no Sambódromo (onde acontecem eventos
todos os anos na cidade). As pessoas vão, estacionam e ninguém reclama
da mobilidade. No dia da Copa, se decreta feriado municipal e não vai
ter problema na mobilidade".
As autoridades só não comentaram o motivo de não terem tempo hábil para construir o que prometeram. Em novembro de 2011, o UOL Esporte já anunciava o cenário que agora é oficial.
É em virtude da falta de planejamento conjunto entre as duas esferas
administrativas e de uma série de erros e irregularidades apontados
reiteradamente desde 2010 por Controladoria Geral da União, Procuradoria
Federal e Ministério Público Estadual que a cidade chegará a 2014 sem
nenhuma das duas obras.
Na segunda quinzena de novembro do ano passado, o MPF (Ministério
Público Federal) afirmou ter disposição e embasamento técnico para
anular a concorrência pública aberta pelo governo do Estado para a
construção do monotrilho, cuja planta prevê a ligação do centro com a
região norte da cidade. A manifestação também foi assinada por
promotores estaduais.
À época, os procuradores federais vinham alertando há mais de um ano o
governo estadual de que a concorrência pública em curso para a
construção da obra estava "eivada de irregularidades".
"Diante da insistência dos gestores públicos em descumprir a
recomendação e seguir com o processo de licitação para o monotrilho, o
MPF/AM destaca que o projeto básico da obra não atende a vários
requisitos da Lei de Licitações (Lei 8.666/93), o que implica na
nulidade da concorrência pública, ainda que o processo seja concluído",
informou nota da Procuradoria.
OS ESTÁDIOS VÃO ESTAR PRONTOS, MAS A QUE PREÇO?
Dos R$ 6,7 bilhões aplicados até agora nas obras dos 12 estádios
para a Copa do Mundo de 2014, R$ 4 bilhões foram investimentos do
governo federal, e apenas R$ 612 milhões vieram da iniciativa privada,
ou 10.94% do total.
Mas o governo prosseguiu. Por irregularidades, o processo levou mais de
um ano. Quando saiu, não conseguiu obter a excelência técnica para
convencer a Caixa Econômica Federal a liberar os recursos.
Paralelamente, o governo percebia que não tinha dinheiro para pagar
todas as desapropriações necessárias. E assim seguiu a vida, até a
desistência oficial de honrar o que se assinou.
Já em relação ao BRT, a Controladoria Geral da União detectou problemas
no projeto em fevereiro de 2011. O órgão de controle federal apontou
que a obra do BRT da prefeitura e a do monotrilho estadual passavam, em
muitos pontos, pelas mesmas localidades, chegando até a ter pontos de
parada previstos exatamente no mesmo local, o que seria impossível de
operacionalizar, visto que as obras não estavam sendo construídas ou
pensadas integradamente. Assim, a Caixa também não liberou o empréstimo
para a obra municipal.
O governo amazonenense, até por pressão do prazo para a construção,
reduziu seu plano inicial do monotrilho a ser entregue até a Copa dos
originais 39 quilômetros para menos da metade, ou 15,5 quilômetros. Os
valores envolvidos na empreitada, porém, não tiveram semelhante queda.
mas agora isso tudo não é mais prioridade. Estado e município irão
sentar e pensar juntos em um plano de mobilidade urbana moderno e
eficiente para Manaus. Não para a Copa, claro. Para a Copa, é só
decretar feriado.
Todos os leitores do Valor são "ipso facto", bem informados. Sabem
que o mandato de Mervyn King, o atual Governador do "The Bank of
England" está terminando e que o banco e o Tesouro de Sua Majestade
estão à procura, com anúncios públicos no mundo, de um substituto.
No dia 9 de outubro na London School of Economics, para comemorar o
20º aniversário da introdução do sistema de "metas inflacionárias" na
Inglaterra, King deu uma aula interessante sobre a história do sistema,
seus fundamentos intelectuais, suas vantagens e seus problemas.
Refletiu sobre o período da "grande moderação" (1997-2007) e a
valorização da libra de 25% contra outras moedas, "não inteiramente
explicável", para revelar numa espécie de lamento: a tardia descoberta
que a estabilidade dos preços não é condição suficiente para a
estabilidade do sistema financeiro. Na última frase da humilde e
extraordinária confissão, King engole em seco a prepotência que costuma
dominar alguns pseudos cientistas monetários e entrega a sua mensagem:
"Entendemos menos do que gostaríamos sobre como funciona a economia." E
completou: "O desafio para melhorar nosso entendimento e desenvolver
novas ideias é para vocês - a próxima geração de estudantes e
acadêmicos na London School of Economics e noutros lugares. Vão em
frente."
A leitura das reflexões de um competente economista, suportado pelo
"crème de la crème" dos profissionais do departamento de pesquisa
econômica do Banco da Inglaterra, é um antídoto às proposições
apodíticas de analistas mais afoitos, que costumam afirmar o que
deveriam demonstrar. Outro dia um deles discorreu com toda a segurança a
respeito "dos efeitos sobre o consumo privado das despesas do governo"
usando implicitamente um modelo muito conhecido. Ignorou, sob os olhos
embevecidos do entrevistador que outro modelo, também respeitável
sugere conclusão oposta. Trata-se, obviamente, de um problema empírico,
mas o pior é que não há método econométrico que decida definitivamente
a questão. Ao contrário do que se poderia pensar, a afirmação não é
falta de conhecimento, mas produto do domínio da "antipatia" à política
governamental.
É o caso, por exemplo, da pergunta intrigante se o Brasil está
abandonando o famoso "tripé" da política econômica adotada em 1999,
depois de termos nos socorrido às pressas do Fundo Monetário
Internacional, e que não nos poupou de voltar a ele em 2002: 1º)
política fiscal responsável que mantenha relativo equilíbrio e produza
um superávit primário que reduza a relação dívida líquida/PIB a alguma
coisa parecida com 30% do PIB; 2º) meta inflacionária de 4,5% (+ ou -
2%) e ainda; 3º) um sistema de câmbio flutuante. No período de
1999-2011 isso produziu: taxa de crescimento médio do PIB 3,4%; taxa de
inflação média anual de 6,8%; déficit em conta corrente acumulado US$
188 bilhões. Esses números estão longe de razoáveis quando comparados
com outros países emergentes. Onde nossa diferença é significativa, é
no esforço de "inclusão" social visto no gráfico 1 e na convergência da
relação dívida líquida/PIB vista no gráfico 2, que têm tudo a ver com a
política social feita sob o controle da política fiscal. O último
mostra, aliás, a importância exagerada que se dá aos pequenos "desvios"
entre o superávit primário programado e o efetivamente realizado,
diante da tendência clara de queda da relação dívida líquida/PIB. O
pecado do governo é tentar mistificá-los com a contabilidade "criativa"
que lança dúvida sobre sua credibilidade. Mesmo usando o conceito de
dívida bruta/PIB (59%), a situação é confortável. A aritmética
preocupante é que o custo da dívida líquida é pouco sensível às
variações da taxa Selic, uma vez que as reservas e os imensos créditos
ao BNDES já somam um quarto da dívida bruta/PIB e rendem muito menos.
A crítica à política econômica do governo é bem-vinda
Os fatos não parecem indicar nenhum desvio mais importante na
política econômica canônica que vimos usando com o necessário
pragmatismo imposto pelas mudanças da realidade nacional e mundial. Um
magnífico artigo de dois sofisticados economistas do nosso Banco
Central (Sales, A.S. - Barroso, J.B.R. - "Coping with a Complex Global
Enviroment", W.P. 292, Oct. 2012) é leitura obrigatória sobre esse
assunto.
A crítica à política econômica do governo é bem-vinda. É mesmo uma
necessidade. Não é razoável supor que o simples fato de alguém estar
eventualmente numa situação de "poder" lhe transfere o benefício da
infalibilidade. Nem que, para o poder incumbente, a eleição por uma
maioria eventual lhe confira a "onisciência" que exija a sua
"onipresença". Mas a crítica há de ser objetiva e honesta sobre a
qualidade e eficiência dos instrumentos utilizados para atingir os fins
que levaram os eleitores a escolhê-lo. A crítica "aos fins" termina na
campanha eleitoral. A minoria há de conformar-se, por exemplo, quando a
sociedade exagera na escolha de mais "inclusão" do que "crescimento"
ou "estabilidade monetária", o que - os economistas sabem - pode levar,
no prazo médio, à perdição dos três! Nesse caso resta ao poder
incumbente trocar o pneumático com o carro andando, ou ser dispensado
na próxima eleição...
Antonio Delfim Netto é professor emérito da FEA-USP, ex-ministro da
Fazenda, Agricultura e Planejamento. Escreve às terças-feiras
A política tecnológica é peça essencial de uma política industrial
contemporânea. Isso todos sabem. Mas qual política tecnológica? Essa é
uma pergunta de difícil resposta, ainda mais em países como o Brasil,
que estão a meio caminho do processo de desenvolvimento.
Existe uma linha de entendimento da questão que coloca ênfase na
geração de conhecimento. São os que defendem uma estratégia
"science-push", na qual universidades e centros de pesquisa devem
exercer a função de âncoras do sistema de ciência, tecnologia e
inovação. Se é certo que permita vencer algumas batalhas, é duvidoso
que essa estratégia possibilite "ganhar a guerra". Primeiro, devido à
grande distância da fronteira que atualmente caracteriza a maioria dos
campos de conhecimento no Brasil, trata-se de uma estratégia
excessivamente custosa quando contraposta as condições concretas de
mobilização de recursos para a sua consecução. Segundo e mais
importante, na ausência desses recursos, a massa crítica incipiente
torna muito lento o avanço em vista das dificuldades típicas das fases
iniciais de aprendizado tecnológico. Devido à óbvia retroalimentação
negativa entre custo e prazo, quando avaliada intertemporalmente a
estratégia tende a se tornar ainda mais custosa. E mais lenta. À
industria caberia tão somente ter paciência para colher os frutos do
necessariamente longo processo de acumulação de conhecimentos.
Uma segunda linha centra o enfoque nas necessidades. Nessa
estratégia "demand pull" dá-se o oposto. O foco é colocado na
indústria, devendo o sistema de C&T ser direcionado exclusivamente
para atender as necessidades mais prementes das empresas industriais.
Essa estratégia é, certamente, menos custosa. Porém, dado o atraso
relativo da indústria brasileira, causa e consequência de seu padrão de
especialização, o "velho novo" ofusca o "novo novo", condenando-a a
graus muito baixos de efetividade. O fato relevante aqui é que a
fronteira tecnológica se move e, para complicar, em direções nem sempre
corretamente antecipadas. Por isso, o direcionamento do esforço de
inovação exclusivamente para as necessidades do sistema produtivo pode
significar um enorme dispêndio de energia para atingir capacitações em
vias de se tornarem obsoletas. Ao invés do "catching-up", o risco real é
de se pavimentar o caminho para o "falling behind". No estágio intermediário de desenvolvimento industrial e tecnológico a virtude está igualmente no meio
No estágio intermediário de desenvolvimento industrial e tecnológico
a virtude está igualmente no meio. É preciso promover as necessárias
ligações entre o sistema de C&T e o sistema produtivo, mas não
apenas como uma iniciativa genérica de aproximação entre universidades e
empresas. A essência do problema não parece ser a existência de
conhecimento nas universidades que, por estar lá represado, não fica
acessível para a utilização industrial. O cerne do problema está na
ausência de massa crítica, para cuja formação se requer uma maior
seletividade e uma menor dispersão de recursos voltados para a
construção das capacitações requeridas.
Por isso, o fomento à inovação deve pautar-se por grande dose de
seletividade, mirando alvos muito claros e bem definidos, expressos em
objetivos específicos que deem margem à construção de indicadores de
acompanhamento e possam ser revistos periodicamente. Nesse sentido, é
preciso identificar "sistemas setoriais de inovação" (agronegócios,
pré-sal, saúde, etc.), o que, por sua vez, impõe um grande desafio
associado à institucionalidade da política tecnológica: além de fazer
as escolhas, é necessário legitimá-las.
Se não bastasse a complexidade que cerca a definição da estratégia
da política tecnológica, é também necessário um avanço compatível na
superação dos problemas concretos que dificultam a sua implementação. O
Brasil avançou com a segunda geração de políticas de inovação que,
hoje, vai muito além do apoio à instalação de infraestrutura física de
P&D. Não há dúvida de que a última década presenciou um aumento
significativo do volume de recursos destinado a essas atividades. Há
pouco mais de dez anos, esses recursos limitavam-se aos programas de
crédito reembolsável e não reembolsável operados pelo MCT e aos
incentivos fiscais muito limitados dos programas PDTI e PDTA ou muito
específicos da Lei de Informática.
Desde então, foi colocado à disposição das empresas brasileiras um
verdadeiro arsenal de estímulos para realizar atividades inovativas,
sejam incentivos fiscais à P&D automáticos, semelhantes aos
principais países do mundo; subvenção a projetos pré-selecionados;
apoio a fixação de pesquisadores nas empresas, variados programas de
financiamento ao empreendedorismo tecnológico, etc. Cabe destacar ainda
a construção de um arcabouço legal muito mais propício com a Lei da
Inovação de 2005, ou mais recentemente, margens de preferência nas
compras públicas, regimes tributários especiais, requisitos de conteúdo
local, dentre outras políticas de demanda.
Então, onde está o problema? O problema tecnológico básico é simples
de identificar, embora, reconheça-se, bastante difícil de resolver: o
governo constrói políticas de inovação voltadas para uma clientela com
um determinado perfil e os clientes, por sua vez, esperam do governo
políticas de perfil diferente. Cabe aqui uma analogia, possivelmente
tola mas, quem sabe, justificável em nome da economia de espaço. O
governo está oferecendo um supermercado (prateleiras repletas de
ingredientes). As empresas querem um restaurante (cardápio com pratos
já montados). David Kupfer é professor e pesquisador licenciado do Grupo
de Indústria e Competitividade do Instituto de Economia da UFRJ
(GIC-IE/UFRJ) e assessor da presidência do BNDES. Escreve mensalmente
às segundas-feiras. E-mail: gic@ie.ufrj.br/ www.ie.ufrj.br/gic.As opiniões expressas são do autor e não necessariamente refletem posições do BNDES.