terça-feira, 20 de novembro de 2012

Vereadores grátis




 Comentários do Blogueiro: Obvio que o projeto não irá resolver todos os problemas do Brasil na seara política, mas pode ser bastante interessante para mitigar os candidatos "especializados em vencer eleições". Na esteira de melhorias institucionais, políticas e de governança esse projeto pode servir como instrumento de mudanças importantes na esfera municipal, por vezes a mais difícil de ser atingida por mudanças significativas. Deve vingar, com o perdão do trocadilho infame, se não como projeto, mas ao menos dando um gostinho de revanche ao povo.



Aloysio Nunes Ferrira: relator

Ao que tudo indica, o cargo de vereador caberá mesmo aos altruístas apenas. Aquela Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que prevê o fim da remuneração a legisladores de municípios com até 50 000 habitantes (Mais detalhes em: O fim do salário de vereador) já tem relator e parecer quase pronto.
Cyro Miranda, autor da PEC, está vendendo otimismo. Diz que o relator do projeto na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado, Aloysio Nunes Ferreira, deve entregar seu parecer até o fim do mês, e com poucas alterações no texto original.
Segundo Cyro, Aloysio planeja incluir somente a previsão de uma ajuda de custo de um ou dois salários mínimos para cobrir custos, como transporte e alimentação. E Eunício de Oliveira já avisou: assim que receber o relatório, põe o projeto em votação na CCJ, o que pretende fazer antes do recesso.
Os vereadores que passem a economizar desde já.
Por Lauro Jardim, Veja.com

Radar on-line

segunda-feira, 19 de novembro de 2012

Por que demoramos tanto para perceber que as finanças saíram do controle?

Especialistas explicam mecanismos da mente que nos fazem "ignorar" sinais de problemas financeiros e dão dicas para que dificuldades sejam identificadas mais facilmente


Por Tabata Pitol 


SÃO PAULO - A pedagoga Cristina Queirós levou um susto quando se deu conta de que estava devendo mais de R$ 70 mil. Sem saber ao certo como as finanças chegaram a esse estágio – uma vez que não havia comprado bem de grande valor –, ela só percebeu o tamanho do problema ao pedir R$ 10 mil ao marido para pagar contas em atraso.
“Eu não sabia que estava devendo tanto. Sabia que tinha cartões de crédito e empréstimos em atraso, mas não sabia o real valor das minhas dívidas. Achei que R$ 10 mil seriam suficientes. Mas meu marido quis que eu mostrasse tudo o que estava devendo antes de me emprestar o dinheiro, e só quando coloquei tudo no papel percebi que estava muito mais endividada do que imaginava”.
previdência - orçamento - dívidas
O ideal é, mês a mês, parar para avaliar o orçamento e se questionar se os gastos são maiores ou menores que os ganhos
Cristina não é um caso raro entre os brasileiros. Muitas pessoas só percebem que as finanças saíram do controle quando já estão muito endividadas. “Infelizmente a própria biologia do ser humano explica por que ele demora tanto para perceber que está em problemas financeiros. Preferimos fingir que não estamos vendo. Acreditamos nas contas de cabeça que nunca são exatas. Nomeamos de dissonância cognitiva o processo que nos leva a duvidar do óbvio, a negar todos os sinais de que algo não está indo bem”, conta o economista pela PUC-SP e especialista em investimentos e métodos quantitativos pela FGV, Richard Rytenband.
O planejador financeiro Valter Police completa: “Não é uma coisa que se faz de propósito, mas a pessoa vai deixando passar. Parece impossível engordar 100 kg sem se dar conta, não é? Mas a televisão está cheia de programas com pessoas que chegaram à obesidade mórbida sem procurar um médico, fazer uma dieta ou começar um programa de exercícios. O mesmo acontece quando o assunto é dinheiro”.
Buscando soluções
No entanto, o fato de ser algo recorrente não significa que devemos considerar como normal. “Temos que assumir nossas responsabilidades e nossos atos. Nos endividamos excessivamente porque descuidamos das finanças. A culpa é nossa e só nós podemos impedir que a situação se agrave cada vez mais”, afirma Police. Para ele, nada é mais eficaz do que colocar, na ponta do lápis, os gastos e ganhos para evitar o endividamento.
O consultor afirma que o ideal é, mês a mês, parar para avaliar o orçamento e se questionar se os gastos são maiores ou menores que os ganhos, e se está se pagando muitos juros. “Avaliando todos os meses a pessoa vai perceber se a situação está saindo do controle e aí é hora de parar e cortar os gastos supérfluos. Não é uma coisa gostosa de fazer, ninguém gosta de constatar que tem um problema, que não está dando conta. Mas quanto mais se deixa passar, pior vai ficar. Então, embora seja dolorido, quanto antes identificar o problema, melhor. Os juros no Brasil são altíssimos e podem elevar uma dívida rapidamente”, revela Police.
Patrícia Santos é um exemplo. Não imaginava que os meses que ficou sem pagar o cartão de crédito, o cheque especial e o financiamento do carro popular, após ficar desempregada, resultariam em uma dívida de quase R$ 50 mil. “É muito difícil você descobrir que deve R$ 50 mil e não ter um patrimônio nesse valor. Não tinha ideia de que devia tanto até os avisos de cobrança começarem a chegar. Minha dívida era de roupas, passeios e o carro, que não custava mais do que R$ 20 mil, mas ainda não estava quitado. Não sei como cheguei a esse ponto sem perceber, mas sei que os juros ajudaram bastante. Precisei pegar empréstimos de familiares, vender o carro, e paguei primeiro o que cobrava mais juros”, conta a publicitária.
Hábitos perigososAlém de observar e avaliar atentamente os gastos, os especialistas afirmam que há vários sinais de que uma pessoa vai enfrentar um problema financeiro. “Tem gente que se engana. Já ouvi clientes dizendo que gastaram muito em determinado mês porque tiveram um acidente de carro. Isso acontece, claro. Mas é por isso que é fundamental ter seguro e plano de saúde. Também já ouvi a justificativa: tive um imprevisto, o IPVA (Imposto de Propriedade de Veículos Automotores). Ora, todos sabemos que IPVA não é imprevisto. Então, o primeiro passo é parar de se enganar e assumir que você está descontrolado”, garante Police.
Rytenband completa: “é preciso saber identificar problemas e comportamentos de risco. Uma pessoa estourada no cheque especial, pagando 10% de juros ao mês, e que tem dinheiro na poupança - mas não o usa para quitar essa dívida - tem dificuldades para identificar comportamentos de risco. É comum a pessoa alegar que não quer mexer na poupança, “pois aquele é o único dinheiro que ela tem”, mas manter um investimento que rende 0,5% ao mês e continuar pagando 10% de juros certamente vai levá-la à falência”.
Mas, para o planejador financeiro da Police Consultoria, o sinal mais claro de um provável problema é o aumento no nível de endividamento. “É fácil perceber. Uma pessoa que não pegava dinheiro no banco e que, de repente, começa a entrar no cheque especial, passa a considerar o limite do cheque parte do salário. Quem vez ou outra pega um empréstimo no caixa eletrônico e depois começa a pegar um empréstimo para pagar outro vai enfrentar sérios problemas. A mesma coisa com o cartão de crédito: primeiro a pessoa compra no cartão e paga a fatura. Depois começa a parcelar as compras no cartão, aí para de pagar o total da fatura, em seguida começa a parcelar itens como supermercado no cartão e, por fim, pega empréstimo para pagar o cartão. É um caminho longo com sinais que podem ser percebidos se a pessoa estiver atenta às mudanças no seu comportamento”.
De fato, Cristina admite que faltou atenção aos seus gastos e comportamentos. “Foi preciso levar um grande choque para perceber que eu estava descontrolada. Percebi que gastava muito dinheiro com mimos para os meus filhos, sempre usando a desculpa de que eles mereciam tudo de melhor. Realmente merecem, mas já entendi que tenho que dar a eles o que meu orçamento permite. Mesmo tendo essa consciência é difícil controlar. Meu marido está me ajudando para que eu não cometa os mesmos erros. Felizmente, eu pude contar com o dinheiro que ele poupava para pagar as dívidas, senão eu ainda estaria pegando empréstimos, fazendo novas dívidas, tanto para tentar quitar o que estava devendo, quanto para consumir ainda mais”.
Valter elogia a atitude de Cristina. “A família precisa estar perto nesse momento. Aliás, eu defendo que o orçamento deve ser feito e avaliado por todos da família. Não adianta um se controlar e os outros gastarem demais. Manter os gastos dentro de um limite deve ser um compromisso de toda a família”.
O motivo que levou Cristina a se endividar é o mesmo que leva muitas pessoas aos problemas financeiros: comprar por achar que merece.
“Todo mundo, quando vai comprar algo mais caro, usa essa afirmação: eu mereço, trabalho tanto. Provavelmente mereça mesmo, mas esses agrados podem trazer uma grande dor de cabeça. A verdade é que quem não atingiu a independência financeira não deveria se dar ao luxo de ter algumas coisas. Carrão e casa de praia não são sinônimo de uma boa situação financeira. Ao contrário, são bens que trazem despesas e podem comprometer muito o orçamento de uma pessoa. É preciso ter cuidado ao proferir a frase ‘eu mereço’”, alerta Richard Rytenband.
Independência financeiraO economista explica que, para evitar definitivamente os problemas, o caminho é óbvio: atingir a independência financeira (conseguir que os lucros - gerados por bens e investimentos - paguem todas as despesas mensais), para que a pessoa não precise de fontes externas de renda, nem mesmo do salário.
“Sei que isso não é fácil, mas é possível. O problema é que a mentalidade das pessoas está errada. Por exemplo, as pessoas não têm que poupar com o objetivo de ter uma reserva para a aposentadoria, o ideal é adotar hábitos que levem a conquistar a independência financeira antes, para ter rendimentos durante a aposentadoria. Mas, para conseguir isso, é preciso ter investimentos e uma sobra constante. É fato: só vai se dar bem quem gasta menos do que ganha”, afirma o professor, que completa: “e também é importante saber que não é possível conquistar esse patamar apenas poupando. Para conseguir isso é preciso investir, já que a poupança apenas evita que o dinheiro perca seu poder de compra”, aconselha Rytenband.
Teste rápidoRichard Rytenband elaborou um teste para você identificar se é candidato a problemas financeiros. Se você identificar, em seu comportamento, pelo menos três atitudes das cinco descritas a seguir, pode enfrentar dificuldades se não alterar rapidamente sua forma de agir. 
1 - Gasta tudo que tem ou mais do que tem.
2 – Tem qualquer forma de dívida, principalmente cartão de crédito e cheque especial.
3 - Não tem o hábito de investir.
4 - Não é “útil” para a sociedade: sem utilidade social, se a pessoa ficar desempregada, não consegue se reposicionar. Sem ganhos, não há como atingir a independência financeira. É fundamental investir em si próprio para se tornar útil.
5 – Não tem consciência de que o dinheiro perde valor ao longo dos anos – sem essa consciência, a pessoa deixa o dinheiro em investimentos muito conservadores, que não trazem lucro.

quarta-feira, 14 de novembro de 2012

Autoridades cancelam obras urbanas da Copa em Manaus e anunciam feriado em dias de jogos

Vinícius Segalla. 14/11/2012
Do UOL, em São PauloProjeto do monotrilho de Manaus
  • Projeto do monotrilho de Manaus
O Ministério do Esporte ainda não sabe, ou ainda não informou a população, mas as autoridades do governo do Estado do Amazonas e da Prefeitura de Manaus já desistiram de construir, em tempo para a Copa do Mundo de 2014, as duas obras de mobilidade urbana que se comprometeram a executar para o Mundial.
Em janeiro de 2010, o governo estadual comprometeu-se a construir uma linha de monotrilho, atualmente orçada em R$ 1,3 bilhão (sendo R$ 600 milhões de verbas federais). Já o município de Manaus assumiu a obrigação de fazer um sistema de corredores de ônibus integrado (BRT, ou Bus Rapid Transit), no valor de R$ 290 milhões (sendo R$ 200 milhões dos cofres da União).

MANAUS NÃO ESTÁ SOZINHA

  • Divulgação Das cinco cidades-sede da Copa do Mundo de 2014 que incluíram em seu planejamento oficial para o evento a construção de linhas de trem de superfície, quatro não deverão entregar as obras antes do início do Mundial de futebol, em junho de 2014. São elas: Brasília, Cuiabá (foto), Manaus e São Paulo.
O plano de construir os modais foi aprovado pelo Ministério das Cidades, e assim passou a constar na chamada Matriz de Responsabilidades da Copa, por serem consideradas intervenções essenciais para que a capital amazonense pudesse ser uma das sedes da Copa de 2014. A tal matriz, que sofre atualizações trimestrais, via de regra corrigindo para cima o custo dos empreendimentos e empurrando para frente a data de entrega das obras, ainda prevê as duas obras de mobilidade de Manaus.
No dia 1º deste mês, porém, o governador do Amazonas, Omar Aziz (PDT), e o prefeito eleito de Manaus, Artur Neto (PSDB), informaram a população que já não pensam mais em construir os sistemas de transporte a tempo para a Copa.
“Não teremos tempo para concluir esses projetos até 2014. Tanto o monotrilho, quanto o BRT, dificilmente teriam condições de serem concluídos até a Copa", afirmou o governador, no que foi endossado pelo prefeito eleito de Manaus: "Dialogamos sobre a implantação ao longo de quatro anos de um sistema de transporte de massa moderno".
E, para que o trânsito na cidade não fique caótico em dia de jogos, o governador tem a solução: "A capacidade da Arena da Amazônia é de 42 mil pessoas, isso cabe facilmente no Sambódromo (onde acontecem eventos todos os anos na cidade). As pessoas vão, estacionam e ninguém reclama da mobilidade. No dia da Copa, se decreta feriado municipal e não vai ter problema na mobilidade".
As autoridades só não comentaram o motivo de não terem tempo hábil para construir o que prometeram. Em novembro de 2011, o UOL Esporte já anunciava o cenário que agora é oficial
É em virtude da falta de planejamento conjunto entre as duas esferas administrativas e de uma série de erros e irregularidades apontados reiteradamente desde 2010 por Controladoria Geral da União, Procuradoria Federal e Ministério Público Estadual que a cidade chegará a 2014 sem nenhuma das duas obras.
Na segunda quinzena de novembro do ano passado, o MPF (Ministério Público Federal) afirmou ter disposição e embasamento técnico para anular a concorrência pública aberta pelo governo do Estado para a construção do monotrilho, cuja planta prevê a ligação do centro com a região norte da cidade. A manifestação também foi assinada por promotores estaduais.
À época, os procuradores federais vinham alertando há mais de um ano o governo estadual de que a concorrência pública em curso para a construção da obra estava "eivada de irregularidades".
"Diante da insistência dos gestores públicos em descumprir a recomendação e seguir com o processo de licitação para o monotrilho, o MPF/AM destaca que o projeto básico da obra não atende a vários requisitos da Lei de Licitações (Lei 8.666/93), o que implica na nulidade da concorrência pública, ainda que o processo seja concluído", informou nota da Procuradoria.

OS ESTÁDIOS VÃO ESTAR PRONTOS, MAS A QUE PREÇO?

  • Divulgação Dos R$ 6,7 bilhões aplicados até agora nas obras dos 12 estádios para a Copa do Mundo de 2014, R$ 4 bilhões foram investimentos do governo federal, e apenas R$ 612 milhões vieram da iniciativa privada, ou 10.94% do total.

Mas o governo prosseguiu. Por irregularidades, o processo levou mais de um ano. Quando saiu, não conseguiu obter a excelência técnica para convencer a Caixa Econômica Federal a liberar os recursos. Paralelamente, o governo percebia que não tinha dinheiro para pagar todas as desapropriações necessárias. E assim seguiu a vida, até a desistência oficial de honrar o que se assinou.
Já em relação ao BRT, a Controladoria Geral da União detectou problemas no projeto em fevereiro de 2011. O órgão de controle federal apontou que a obra do BRT da prefeitura e a do monotrilho estadual passavam, em muitos pontos, pelas mesmas localidades, chegando até a ter pontos de parada previstos exatamente no mesmo local, o que seria impossível de operacionalizar, visto que as obras não estavam sendo construídas ou pensadas integradamente. Assim, a Caixa também não liberou o empréstimo para a obra municipal.
O governo amazonenense, até por pressão do prazo para a construção, reduziu seu plano inicial do monotrilho a ser entregue até a Copa dos originais 39 quilômetros para menos da metade, ou 15,5 quilômetros. Os valores envolvidos na empreitada, porém, não tiveram semelhante queda.
mas agora isso tudo não é mais prioridade. Estado e município irão sentar e pensar juntos em um plano de mobilidade urbana moderno e eficiente para Manaus. Não para a Copa, claro. Para a Copa, é só decretar feriado.

terça-feira, 13 de novembro de 2012

A crítica impertinente

Antonio Delfim Netto
Valor Econômico - 13/11/2012
 

Todos os leitores do Valor são "ipso facto", bem informados. Sabem que o mandato de Mervyn King, o atual Governador do "The Bank of England" está terminando e que o banco e o Tesouro de Sua Majestade estão à procura, com anúncios públicos no mundo, de um substituto.
No dia 9 de outubro na London School of Economics, para comemorar o 20º aniversário da introdução do sistema de "metas inflacionárias" na Inglaterra, King deu uma aula interessante sobre a história do sistema, seus fundamentos intelectuais, suas vantagens e seus problemas. Refletiu sobre o período da "grande moderação" (1997-2007) e a valorização da libra de 25% contra outras moedas, "não inteiramente explicável", para revelar numa espécie de lamento: a tardia descoberta que a estabilidade dos preços não é condição suficiente para a estabilidade do sistema financeiro. Na última frase da humilde e extraordinária confissão, King engole em seco a prepotência que costuma dominar alguns pseudos cientistas monetários e entrega a sua mensagem: "Entendemos menos do que gostaríamos sobre como funciona a economia." E completou: "O desafio para melhorar nosso entendimento e desenvolver novas ideias é para vocês - a próxima geração de estudantes e acadêmicos na London School of Economics e noutros lugares. Vão em frente."
A leitura das reflexões de um competente economista, suportado pelo "crème de la crème" dos profissionais do departamento de pesquisa econômica do Banco da Inglaterra, é um antídoto às proposições apodíticas de analistas mais afoitos, que costumam afirmar o que deveriam demonstrar. Outro dia um deles discorreu com toda a segurança a respeito "dos efeitos sobre o consumo privado das despesas do governo" usando implicitamente um modelo muito conhecido. Ignorou, sob os olhos embevecidos do entrevistador que outro modelo, também respeitável sugere conclusão oposta. Trata-se, obviamente, de um problema empírico, mas o pior é que não há método econométrico que decida definitivamente a questão. Ao contrário do que se poderia pensar, a afirmação não é falta de conhecimento, mas produto do domínio da "antipatia" à política governamental.
É o caso, por exemplo, da pergunta intrigante se o Brasil está abandonando o famoso "tripé" da política econômica adotada em 1999, depois de termos nos socorrido às pressas do Fundo Monetário Internacional, e que não nos poupou de voltar a ele em 2002: 1º) política fiscal responsável que mantenha relativo equilíbrio e produza um superávit primário que reduza a relação dívida líquida/PIB a alguma coisa parecida com 30% do PIB; 2º) meta inflacionária de 4,5% (+ ou - 2%) e ainda; 3º) um sistema de câmbio flutuante. No período de 1999-2011 isso produziu: taxa de crescimento médio do PIB 3,4%; taxa de inflação média anual de 6,8%; déficit em conta corrente acumulado US$ 188 bilhões. Esses números estão longe de razoáveis quando comparados com outros países emergentes. Onde nossa diferença é significativa, é no esforço de "inclusão" social visto no gráfico 1 e na convergência da relação dívida líquida/PIB vista no gráfico 2, que têm tudo a ver com a política social feita sob o controle da política fiscal. O último mostra, aliás, a importância exagerada que se dá aos pequenos "desvios" entre o superávit primário programado e o efetivamente realizado, diante da tendência clara de queda da relação dívida líquida/PIB. O pecado do governo é tentar mistificá-los com a contabilidade "criativa" que lança dúvida sobre sua credibilidade. Mesmo usando o conceito de dívida bruta/PIB (59%), a situação é confortável. A aritmética preocupante é que o custo da dívida líquida é pouco sensível às variações da taxa Selic, uma vez que as reservas e os imensos créditos ao BNDES já somam um quarto da dívida bruta/PIB e rendem muito menos.
A crítica à política econômica do governo é bem-vinda
Os fatos não parecem indicar nenhum desvio mais importante na política econômica canônica que vimos usando com o necessário pragmatismo imposto pelas mudanças da realidade nacional e mundial. Um magnífico artigo de dois sofisticados economistas do nosso Banco Central (Sales, A.S. - Barroso, J.B.R. - "Coping with a Complex Global Enviroment", W.P. 292, Oct. 2012) é leitura obrigatória sobre esse assunto.
A crítica à política econômica do governo é bem-vinda. É mesmo uma necessidade. Não é razoável supor que o simples fato de alguém estar eventualmente numa situação de "poder" lhe transfere o benefício da infalibilidade. Nem que, para o poder incumbente, a eleição por uma maioria eventual lhe confira a "onisciência" que exija a sua "onipresença". Mas a crítica há de ser objetiva e honesta sobre a qualidade e eficiência dos instrumentos utilizados para atingir os fins que levaram os eleitores a escolhê-lo. A crítica "aos fins" termina na campanha eleitoral. A minoria há de conformar-se, por exemplo, quando a sociedade exagera na escolha de mais "inclusão" do que "crescimento" ou "estabilidade monetária", o que - os economistas sabem - pode levar, no prazo médio, à perdição dos três! Nesse caso resta ao poder incumbente trocar o pneumático com o carro andando, ou ser dispensado na próxima eleição...
Antonio Delfim Netto é professor emérito da FEA-USP, ex-ministro da Fazenda, Agricultura e Planejamento. Escreve às terças-feiras

segunda-feira, 12 de novembro de 2012

Problema tecnológico básico

Autor(es): David Kupfer
Valor Econômico - 12/11/2012
 

A política tecnológica é peça essencial de uma política industrial contemporânea. Isso todos sabem. Mas qual política tecnológica? Essa é uma pergunta de difícil resposta, ainda mais em países como o Brasil, que estão a meio caminho do processo de desenvolvimento.
Existe uma linha de entendimento da questão que coloca ênfase na geração de conhecimento. São os que defendem uma estratégia "science-push", na qual universidades e centros de pesquisa devem exercer a função de âncoras do sistema de ciência, tecnologia e inovação. Se é certo que permita vencer algumas batalhas, é duvidoso que essa estratégia possibilite "ganhar a guerra". Primeiro, devido à grande distância da fronteira que atualmente caracteriza a maioria dos campos de conhecimento no Brasil, trata-se de uma estratégia excessivamente custosa quando contraposta as condições concretas de mobilização de recursos para a sua consecução. Segundo e mais importante, na ausência desses recursos, a massa crítica incipiente torna muito lento o avanço em vista das dificuldades típicas das fases iniciais de aprendizado tecnológico. Devido à óbvia retroalimentação negativa entre custo e prazo, quando avaliada intertemporalmente a estratégia tende a se tornar ainda mais custosa. E mais lenta. À industria caberia tão somente ter paciência para colher os frutos do necessariamente longo processo de acumulação de conhecimentos.
Uma segunda linha centra o enfoque nas necessidades. Nessa estratégia "demand pull" dá-se o oposto. O foco é colocado na indústria, devendo o sistema de C&T ser direcionado exclusivamente para atender as necessidades mais prementes das empresas industriais. Essa estratégia é, certamente, menos custosa. Porém, dado o atraso relativo da indústria brasileira, causa e consequência de seu padrão de especialização, o "velho novo" ofusca o "novo novo", condenando-a a graus muito baixos de efetividade. O fato relevante aqui é que a fronteira tecnológica se move e, para complicar, em direções nem sempre corretamente antecipadas. Por isso, o direcionamento do esforço de inovação exclusivamente para as necessidades do sistema produtivo pode significar um enorme dispêndio de energia para atingir capacitações em vias de se tornarem obsoletas. Ao invés do "catching-up", o risco real é de se pavimentar o caminho para o "falling behind".
No estágio intermediário de desenvolvimento industrial e tecnológico a virtude está igualmente no meio
No estágio intermediário de desenvolvimento industrial e tecnológico a virtude está igualmente no meio. É preciso promover as necessárias ligações entre o sistema de C&T e o sistema produtivo, mas não apenas como uma iniciativa genérica de aproximação entre universidades e empresas. A essência do problema não parece ser a existência de conhecimento nas universidades que, por estar lá represado, não fica acessível para a utilização industrial. O cerne do problema está na ausência de massa crítica, para cuja formação se requer uma maior seletividade e uma menor dispersão de recursos voltados para a construção das capacitações requeridas.
Por isso, o fomento à inovação deve pautar-se por grande dose de seletividade, mirando alvos muito claros e bem definidos, expressos em objetivos específicos que deem margem à construção de indicadores de acompanhamento e possam ser revistos periodicamente. Nesse sentido, é preciso identificar "sistemas setoriais de inovação" (agronegócios, pré-sal, saúde, etc.), o que, por sua vez, impõe um grande desafio associado à institucionalidade da política tecnológica: além de fazer as escolhas, é necessário legitimá-las.
Se não bastasse a complexidade que cerca a definição da estratégia da política tecnológica, é também necessário um avanço compatível na superação dos problemas concretos que dificultam a sua implementação. O Brasil avançou com a segunda geração de políticas de inovação que, hoje, vai muito além do apoio à instalação de infraestrutura física de P&D. Não há dúvida de que a última década presenciou um aumento significativo do volume de recursos destinado a essas atividades. Há pouco mais de dez anos, esses recursos limitavam-se aos programas de crédito reembolsável e não reembolsável operados pelo MCT e aos incentivos fiscais muito limitados dos programas PDTI e PDTA ou muito específicos da Lei de Informática.
Desde então, foi colocado à disposição das empresas brasileiras um verdadeiro arsenal de estímulos para realizar atividades inovativas, sejam incentivos fiscais à P&D automáticos, semelhantes aos principais países do mundo; subvenção a projetos pré-selecionados; apoio a fixação de pesquisadores nas empresas, variados programas de financiamento ao empreendedorismo tecnológico, etc. Cabe destacar ainda a construção de um arcabouço legal muito mais propício com a Lei da Inovação de 2005, ou mais recentemente, margens de preferência nas compras públicas, regimes tributários especiais, requisitos de conteúdo local, dentre outras políticas de demanda.
Então, onde está o problema? O problema tecnológico básico é simples de identificar, embora, reconheça-se, bastante difícil de resolver: o governo constrói políticas de inovação voltadas para uma clientela com um determinado perfil e os clientes, por sua vez, esperam do governo políticas de perfil diferente. Cabe aqui uma analogia, possivelmente tola mas, quem sabe, justificável em nome da economia de espaço. O governo está oferecendo um supermercado (prateleiras repletas de ingredientes). As empresas querem um restaurante (cardápio com pratos já montados).
David Kupfer é professor e pesquisador licenciado do Grupo de Indústria e Competitividade do Instituto de Economia da UFRJ (GIC-IE/UFRJ) e assessor da presidência do BNDES. Escreve mensalmente às segundas-feiras. E-mail: gic@ie.ufrj.br/ www.ie.ufrj.br/gic. As opiniões expressas são do autor e não necessariamente refletem posições do BNDES.